O direito de construir não é gratuito.
Essa afirmação talvez surpreenda os meus leitores não iniciados em matéria urbanística. A eles eu dedico esta postagem, a primeira de uma série sobre o tema. A promulgação da Lei Federal 10.257 de 10/07/2001 (Estatuto da Cidade) sacramentou a prerrogativa das prefeituras brasileiras de cobrar uma contrapartida no licenciamento de construções que intensifiquem o uso do solo além de certo limiar, sobrecarregando as infra-estruturas e promovendo a sobrevalorização da terra. Nisto consiste, essencialmente, a Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC).
Essa afirmação talvez surpreenda os meus leitores não iniciados em matéria urbanística. A eles eu dedico esta postagem, a primeira de uma série sobre o tema. A promulgação da Lei Federal 10.257 de 10/07/2001 (Estatuto da Cidade) sacramentou a prerrogativa das prefeituras brasileiras de cobrar uma contrapartida no licenciamento de construções que intensifiquem o uso do solo além de certo limiar, sobrecarregando as infra-estruturas e promovendo a sobrevalorização da terra. Nisto consiste, essencialmente, a Outorga Onerosa do Direito de Construir (OODC).
Vários municípios brasileiros já aplicam a OODC, capturando valores relevantes para aplicação (obrigatória) em obras de urbanização e habitação popular. Muitos, porém – talvez a maioria – ainda não o fazem, mesmo quando o instituto está previsto em seus Planos Diretores, ao passo que outros o aplicam com valores irrisórios. Em parte isto se deve à resistência ativa dos incorporadores-proprietários de solo, sobre os quais recai o ônus da contrapartida, e passiva de governantes e legisladores interessados em não desagradá-los. Penso, porém, que em parte isto se deve também às insuficiências do próprio Estatuto da Cidade, um tanto vago na especificação das obrigações municipais e, sobretudo, omisso em relação às sanções pelo seu não cumprimento.
Uma das mais brilhantes e tenazes defensoras do instituto em todo o Brasil, a jurista Sônia Rabelo, hoje vereadora pelo PV, observou recentemente em sua página na Internet (http://soniarabello.blogspot.com/2010/08/recursos-publicos-da-outorga-onerosa.html) que, enquanto o município de São Paulo arrecadou, entre 2005 e 2009, mais de R$ 400 milhões com a OODC para aplicação em melhorias urbanas, o Rio de Janeiro se limita, até hoje, a uma “previsão de aplicação [de alcance meramente] marginal”.
A prefeitura do Rio tem anunciado que o custo das obras de infra-estrutura e urbanização da zona portuária será coberto pela venda de Certificados de Potencial Construtivo Adicional – CEPACs, uma modalidade de OODC em que os recursos são antecipados e obrigatoriamente gastos no mesmo perímetro de sua captura. Abordaremos o tema oportunamente.
Nada justifica, porém, o atraso histórico na implantação da OODC no Rio de Janeiro, aprovada pelo Plano Diretor Decenal de 1992 para aplicação à totalidade do solo municipal sujeito a intensificação de uso residencial e comercial.
Com base em dados ADEMI de lançamentos imobiliários e preços de venda médios por m2 no período 2003-2008 e em parâmetros - bastante conservadores - de contrapartida por m2 privativo vendido (3,75%)[1], eu estimo que o município deixou de arrecadar, nesse período, um mínimo de R$ 691,2 milhões, o equivalente ao preço total (construção + terreno) de 13.554 unidades habitacionais do programa Minha Casa Minha Vida em dezembro de 2010. (Quadro)
Uma das mais brilhantes e tenazes defensoras do instituto em todo o Brasil, a jurista Sônia Rabelo, hoje vereadora pelo PV, observou recentemente em sua página na Internet (http://soniarabello.blogspot.com/2010/08/recursos-publicos-da-outorga-onerosa.html) que, enquanto o município de São Paulo arrecadou, entre 2005 e 2009, mais de R$ 400 milhões com a OODC para aplicação em melhorias urbanas, o Rio de Janeiro se limita, até hoje, a uma “previsão de aplicação [de alcance meramente] marginal”.
A prefeitura do Rio tem anunciado que o custo das obras de infra-estrutura e urbanização da zona portuária será coberto pela venda de Certificados de Potencial Construtivo Adicional – CEPACs, uma modalidade de OODC em que os recursos são antecipados e obrigatoriamente gastos no mesmo perímetro de sua captura. Abordaremos o tema oportunamente.
Nada justifica, porém, o atraso histórico na implantação da OODC no Rio de Janeiro, aprovada pelo Plano Diretor Decenal de 1992 para aplicação à totalidade do solo municipal sujeito a intensificação de uso residencial e comercial.
Com base em dados ADEMI de lançamentos imobiliários e preços de venda médios por m2 no período 2003-2008 e em parâmetros - bastante conservadores - de contrapartida por m2 privativo vendido (3,75%)[1], eu estimo que o município deixou de arrecadar, nesse período, um mínimo de R$ 691,2 milhões, o equivalente ao preço total (construção + terreno) de 13.554 unidades habitacionais do programa Minha Casa Minha Vida em dezembro de 2010. (Quadro)
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Se aplicados parâmetros de rentabilidade por empreendimento mais próximos da realidade e preços de Outorga Onerosa condizentes com a prática padrão de repartição por igual da renda fundiária excedente ao coeficiente básico = 1, o valor da contrapartida poderia mais do que duplicar.
Estamos falando, portanto, de uma forma implícita de renúncia fiscal em benefício da propriedade fundiária, de inteira responsabilidade dos poderes executivo e legislativo municipais.
O interesse desta página pela OODC ultrapassa, porém, em muito, o potencial fiscal desse instituto. O seu manejo teórico e prático envolve um sem-número de problemas de gestão urbanística, mercado imobiliário e economia urbana. A OODC é, por isso, um excelente veiculo para o debate sobre a formação e repartição da renda do solo urbano, um dos principais temas de interesse deste escriba e desta página.
Em postagens futuras procurarei abordar algumas dessas dimensões, de um modo que seja ao mesmo tempo esclarecedor para o leigo interessado, útil para o estudante e estimulante para o debate entre urbanistas e pesquisadores.
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[1] (Para os iniciados) Supondo que toda a construção do período tivesse CA=2, CA básico=1, valor da Outorga Onerosa igual à metade da renda acrescida pelo CA excedente e todos os empreendimentos iguais ao modelo menos rentável que o mercado sanciona (custo total=70%PGV, TMA=15%PGV, Renda da terra=15%PGV). O seja, OODC=0,25*0,15*PGV.
[1] (Para os iniciados) Supondo que toda a construção do período tivesse CA=2, CA básico=1, valor da Outorga Onerosa igual à metade da renda acrescida pelo CA excedente e todos os empreendimentos iguais ao modelo menos rentável que o mercado sanciona (custo total=70%PGV, TMA=15%PGV, Renda da terra=15%PGV). O seja, OODC=0,25*0,15*PGV.