quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Redenção

Deu no Estado de S Paulo
17-12-2020, por Editorial 

Montagem: Àbeiradourbanismo
Venda de imóveis impulsiona a economia

O papel que o mercado imobiliário vem desempenhando em boa parte do mundo para a superação da atual crise é completamente diferente do que teve em 2008, quando provocou um desastre de proporções até então desconhecidas no sistema financeiro. 

Há pouco mais de uma década, a rápida valorização estimulou negócios com imóveis e sua utilização como garantia para empréstimos bancários, o que acelerava a alta dos preços. Até que o aumento da inadimplência fez a bolha estourar, levando à garra grandes instituições financeiras e gerando instabilidade na economia mundial. Hoje, ao contrário, é o setor que puxa a recuperação da atividade econômica em muitos países (..) [sobre] bases mais sólidas do que a valorização observada nos anos que antecederam a crise de 2008. (..)

2020-12-30

sábado, 26 de dezembro de 2020

Burgess 1929: “O arruamento ortogonal”

BURGESS E W, "Urban Areas", em SMITH e WHITE, Chicago, an Experiment in Social Sciences Research, Chicago: University of Chicago Press 1929, pp 113-38
https://babel.hathitrust.org/cgi/pt?id=mdp.39015005490290&view=1up&seq=17


Ilustração da mancha urbana em
"cruz de malta" sobre mapas 
antigos das cidades de Ft. Worth,
Texas e Columbus, Ohio.

Montagem: Àbeiradourbanismo 
Nesta seção por mim traduzida de seu artigo "Urban Areas", de 1929, o sociólogo Ernest Burgess esboça, a partir de seus estudos sobre Chicago mas abarcando outras cidades “de planície” do Meio-Oeste dos EUA, uma questão basilar da moderna organização espacial urbana: o “efeito combinado da expansão radial-concêntrica e do sistema de vias arteriais ortogonais”, a primeira tida por ele como uma espécie de lei geral da estruturação urbana, o segundo herdado do reticulado parcelário (grid) criado pelo governo dos Estados Unidos em 1785 para facilitar a venda, a colonos e urbanizadores, dos novos territórios conquistados a oeste do continente.

A dedução mais interessante desse esboço, que repousa, sem dizê-lo, sobre o princípio do custo da distância formulado por Von
Thünen em 1826 e postulado como fundamento econômico da organização espacial urbana por Haig exatos cem anos depois, é a tendência à desvalorização relativa, em Chicago, dos lotes urbanos situados nas direções diagonais de expansão a partir do centro de negócios, e a formação de manchas urbanas com aspecto de “cruz de malta” em cidades de planície do Meio-Oeste estadunidense.

Tal efeito pode ser visto como a manifestação mais acabada de uma contradição espacial inerente à urbanização de mercado, e que subjaz à estrutura do espaço por ela construído, entre a “economia da localização” e a 
“economia da ocupação do solo”. A primeira, sujeita à primazia do fator acessibilidade, tende à disposição radial-concêntrica desigualmente distribuída do conjunto; a segunda, governada pelo aproveitamento das parcelas, impõe a preferência dos urbanizadores privados pelo arranjo ortogonal. 

Leia também neste blog: "Burgess 1925: urbanista acidental"
https://abeiradourbanismo.blogspot.com/2020/10/burgess-1925-urbanista-acidental.html

*


III. O arruamento ortogonal
Chicago, como a maioria das cidades dos Estados Unidos, tem quase todas as vantagens e desvantagens do arruamento ortogonal. Fosse este fator o único relevante, o crescimento urbano não seria radial, mas em ângulos retos a partir do centro da cidade. O arruamento nas direções cardeais torna mais acessíveis ao centro urbano, portanto mais desejáveis para uso residencial, os distritos urbanos situados a norte, sul, leste e oeste e, inversamente, indesejáveis os setores ao longo das direções diagonais. Uma tendência natural sob o sistema reticulado tem sido a instalação do sistema local de ferrovias urbanas e transporte rápido nas arteriais norte-sul e leste-oeste. ou próximo a elas.

Acelera-se, assim, a força da expansão radial nas arteriais perpendiculares ao CBD e retarda-se, obstaculiza-se até, a tendência à expansão radial nas direções diagonais que cortam o reticulado. O efeito geral da superposição do padrão ortogonal dos arruamentos com o padrão circular das zonas urbanas é a configuração em cruz de malta que assumem cidades norte-americanas típicas como Columbus, em Ohio, e Fort Worth, no Texas (isto é, cidades de planície desprovidas de extensas frentes lacustres e fluviais).

Em Chicago, o rio tornou os setores diagonais ainda mais inacessíveis e desfavoráveis para uso residencial, acarretando a ocupação de suas margens pela indústria pesada e por bairros de população pobre e moradias de baixo padrão. As poucas vias diagonais da cidade, quase todas ao longo de estradas construídas sobre antigos caminhos indígenas, ainda que mitiguem as tendências inerentes ao arruamento reticulado pouca influência exercem, no conjunto, porque apenas uma delas, a Milwaukee Avenue, é uma autêntica arterial a serviço de uma grande área. E mesmo esta padece da desvantagem de todas as demais diagonais de Chicago, a saber, o fato de não partir do CDB como é o caso das ortogonais North Clark Street, West Madison Street e South State Street.

O efeito combinado da expansão radial-concêntrica com o sistema de vias arteriais ortogonais é concentrar o deslocamento centro-periferia nas direções cardeais. Na lacustre Chicago, os troncos principais de movimento populacional - para usar a sugestiva expressão do Professor A. E. Holt - foram o Norte ao longo da orla, o Sul ao longo da ferrovia Illinois Central e o Oeste ao longo da West Madison Street e Washington Boulevard. Esses três movimentos principais de população originária do país geraram o desenvolvimento de uma sucessão de subúrbios residenciais de alto padrão.

Nos interstícios das três direções de rápido crescimento permanecem dois setores de crescimento mais lento, o Noroeste e o Sudoeste, ocupados por colônias de imigrantes europeus, negros oriundos do sul do país e latino-americanos em geral. O mapa da próxima página mostra o movimento de todos esses grupos ao longo das vias mais importantes.


2020-12-26

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

Fodidos de verde e amarelo

Deu n’O Globo online
20-12-2020, por Cássia Almeida 
Casa Verde e Amarela: país fica sem política habitacional para pelo menos 42% das famílias sem moradia

Novo programa, que substitui o Minha Casa Minha Vida, exclui faixa que garantia subsídio a pessoas de mais baixa renda

Montagem: Àbeiradourbanismo
Imagens originais: Insternet

2020-12- 20


sábado, 19 de dezembro de 2020

terça-feira, 15 de dezembro de 2020

Só pra quem pode... muito!

Deu no Monitor Mercantil 
15-12-2020, por João Carlos S Cardoso 

Financiamento imobiliário: brasileiro compromete em média 17% da renda
 
Estrutura do 
financiamento imobiliário
no Brasil

Montagem: Àbeiradourbanismo
Os brasileiros comprometem em média 17% da renda com financiamento imobiliário, segundo mostra estudo da Serasa Experian realizado em setembro deste ano. As informações, que têm como base dados do Cadastro Positivo, revelam que a faixa etária que menos destina parte dos rendimentos a esta modalidade financeira é daqueles entre 51 e 60 anos (15,9%), seguida por de 36 a 50 anos (16,2%). Os jovens de até 35 anos, apesar de comprometerem 20,1% da renda, possuem um nível de pontualidade de 85,9%, resultado acima da média dos pagamentos em dia de cartão de crédito e empréstimos pessoais. No geral, a pontualidade de pagamento do financiamento imobiliário é de 86,5%. (Continua)


2020-12-15




sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Epidemia inteligente e sustentável

Deu na Época Negócios
09-12-2020, por Época Negócios 
Como a covid-19 impulsiona o mercado imobiliário para o futuro

Montagem: àbeiradourbanismo
Foto: Charles Ommanney/Getty Images/The Guardian 03-04-2014
 2020-12-11

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Óleo de cobra

Deu n'O Globo
06-12-2020, por Luiz Ernesto Magalhães
https://oglobo.globo.com/rio/nova-prefeitura-fara-plano-para-revitalizar-centro-atrair-investidores-1-24783675


Nova prefeitura fará plano para revitalizar o Centro e atrair investidores



O reprefeito eleito Eduardo Paes anuncia 
novos grandes planos para o Centro do 
Rio com o dinheiro de “investidores”.


Mas não era este o objetivo do Porto Maravilha? O que deu errado? Sem tal balanço, não há como levar a sério o novo plano do velho prefeito. Se a recessão já havia detonado a ilusão de uma Operação Urbana Consorciada exclusivamente voltada para os negócios, o turismo e suas populações flutuantes, que dirá agora que a demanda de escritórios e hotéis foi devastada pela pandemia! 

Nunca entendi a pretensão de criar-se uma expansão comercial de 500 hectares num setor distinto daquele (1) em que o Município investiu, já no início deste século, um monte de tempo e dinheiro ("Teleporto” / Cidade Nova); (2) para onde a principal âncora econômica do Centro do Rio, a Petrobrás, vinha direcionando todos os seus investimentos (o corredor Castelo / Cruz Vermelha / Cidade Nova); (3) em que o Metrô, há muito previsto (Estácio-Praça XV), já contava com três estações plenamente operacionais (Estácio, Cidade Nova e Carioca).

Não bastasse, o Porto Maravilha já se anunciava como o canto de cisne de uma geração de Grandes Projetos Urbanos de "revitalização de áreas centrais" nutrida pela ciranda financeira global: os efeitos devastadores da debacle de 2008 despontavam no horizonte quando ele foi deslanchado pelo próprio prefeito Paes ao som das fanfarras da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016.

Até mesmo a oportunidade de se construir habitação de mercado no Porto, quando a demanda olímpica em dólar empurrou a alta de preços imobiliários na direção do Centro, foi perdida.

Não há como pensar seriamente na recuperação econômica e urbanística do Centro do Rio sem que se inclua, num mesmo plano estratégico, o Centro propriamente dito, a Cidade Nova, a Cruz Vermelha e a Portuária; o comércio, os escritórios, a hotelaria, os serviços e a habitação; o VLT, os ônibus e o Metrô.

Para começar, considero fundamental que se resgatem os CEPACs do Porto Maravilha alienados à Caixa Econômica Federal e que a OUC seja totalmente reformulada sob o comando de urbanistas de reconhecida experiência no assunto - com 100% de transparência, expressa determinação de dar prioridade à mescla de usos, muita habitação para todas as faixas de renda e, é claro, um projeto urbanístico digno deste nome.

Eduardo Paes tem essa dívida com a população da cidade do Rio de Janeiro. Pretender quitá-la com um novo aceno aos "investidores", panaceia que traz sempre na algibeira, não é um bom augúrio. 

2020-12-08

sábado, 5 de dezembro de 2020

CEPACs, ainda uma vez

Imagem: à beiradourbanismo
CEPACs são títulos de direito de construir m2s de edificação, logo de produto imobiliário, adicionais ao Coeficiente de Aproveitamento Básico (CAB) em quaisquer terrenos privados localizados dentro do perímetro de uma Operação Urbana Consorciada (OUC), no prazo estabelecido pela OUC. 

Sua finalidade é financiar as obras de infraestrutura e urbanização que elevarão o perímetro da Operação a um novo patamar de demanda, consequentemente de preços imobiliários.

Essa definição, formalmente correta, é no entanto insuficiente para explicá-los, pois omite o essencial. 

Além de acrescentar m2s de produto imobiliário (m2s privativos) aos seus empreendimentos, com o respectivo ganho industrial de escala, os CEPACs permitem aos incorporadores criar e vender as frações de terreno que lhes correspondem, ganhando em pura renda da terra. 

O CEPAC certifica, pois, 
no âmbito espacial e temporal de uma OUC, o direito de construir e vender 1m2 de produto imobiliário adicional ao coeficiente básico de aproveitamento do terreno e de criar e vender a fração de terreno que lhe corresponde, subsumida à fração ideal da unidade. Seu preço é, muito simplesmente, uma dada porção do preço estimado de venda dessa fração de terreno (solo-localização) ao adquirente do imóvel - razão pela qual figura, ao lado da Outorga Onerosa do Direito de Construir, no rol dos instrumentos urbanísticos de recuperação da renda da terra*

O fato de os CEPACs poderem ser transacionados na bolsa de valores lhes confere certa flexibilidade como ativos, mas não os transforma em ações, ou títulos de dívida pública de longo prazo, que podem valorizar-se e circular indefinidamente no mercado financeiro; não modifica a sua natureza essencial de certificados de direito sobre a renda da terra a ser extraída de empreendimentos imobiliários apenas possíveis no espaço e no tempo da Operação Urbana Consorciada que os emitiu para financiar-se. Nem o ímpeto da economia em geral nem a saúde de tal ou qual empresa: o preço dos CEPACs no mercado de títulos reflete, pura e simplesmente, a expectativa de valorização dos produtos imobiliários que poderão ser construídos no perímetro da OUC.

Em outras palavras, o CEPAC é servo da terra, condenado a transformar-se em empreendimento imobiliário nos termos e prazos estipulados pela OUC. Além deles, perde todo o seu valor. 

Por essa razão, investidores não compram direitos de edificabilidade (CEPACs) sem ter previamente adquirido terrenos onde eles poderão ser utilizados, por preços que levem em conta que parte da renda fundiária total a ser gerada nas incorporações deverá ser adiantada à municipalidade, pelo incorporador ou por seu financista, na compra de tais direitos.

Conclusão (1): o valor adiantado na compra de CEPACs é parte do preço da terra onde ele será utilizado.

Conclusão (2): adquirir CEPACs sem dispor de terrenos equivale a decolar em um avião sem ter contratado o pouso em nenhum dos aeroportos ao alcance de seus tanques de combustível.

Imagem: àbeiradourbanismo


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CEPACs são uma modalidade de Outorga Onerosa do Direito de Construir apropriada à consecução dos objetivos de uma Operação Urbana Consorciada (OUC). O fato de o m2 adicional nas OUCs (CEPAC) ser muito mais caro que o m2 de Outorga Onerosa nos bairros mais valorizados da cidade não é difícil de entender.

Nas OUCs, a municipalidade precisa maximizar a receita para cobrir os custos das obras, sem as quais não existirá a nova fronteira imobiliária. O CEPAC aparece, pois, aos incorporadores, como investimento, pelo qual estão dispostos a pagar o mesmo que pagariam a um proprietário pelo terreno a incorporar: até 50% do resíduo. Ou seja, tendem a oferecer por 1 CEPAC até a metade do preço pelo qual estimam vender ao adquirente do imóvel a fração de terreno que ancora o m2 de produto imobiliário adicional. 

A Outorga Onerosa, aplicada pela municipalidade em áreas de renovação edilícia já providas de infraestrutura, serviços e amenidades e tradicionalmente exploradas sem nenhum ônus - uma espécie de território livre disponível à extração da máxima renda da terra por "direito natural" -, aparece ao incorporador como um imposto. Daí provém a sua tenaz resistência contra esse instituto, de que resulta a redução do preço do m2 adicional de construção, logo de produto imobiliário, a uma proporção muitas vezes irrisória do preço de venda da fração de terreno que o ancora.

2020-12-05


quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

CEPACs da dúvida

SANTOS O A Jr, “Propriedade pública e função social: a destinação das terras da União na Operação Urbana Porto Maravilha”. Rev. Bras. Gestão Urbana vol.12, Epub Curitiba Ago 2020
HTTP://DX.DOI.ORG/10.1590/2175-3369.012.E20200062

*
Duas coisas me intrigam nos procedimentos e transações governamentais discutidos neste texto.
Primeiro, não vejo o menor sentido, numa OUC, em aplicaram-se CEPACs a terrenos públicos. Alguém já se perguntou por que motivo não se emitiram CEPACs em Puerto Madero? Que espécie de gestor público, podendo vender terrenos aos investidores por 100% do seu valor de mercado, opta por um mecanismo de captura parcial das mais-valias?  Sim, numa OUC com terrenos públicos e privados a venda de terrenos públicos pode ser feita por seu valor de mercado com CEPACs, a “moeda” da OUC. Mas por que ceder aos incorporadores a mais-valia correspondente ao Coeficiente Básico de aproveitamento do terreno? CEPACs para terrenos públicos só com CB = zero!    
Segundo, nas transferências onerosas de terrenos federais à SEDURP não há menção ao fato de que a Caixa Econômica Federal, ao arrematar o estoque total de CEPACs colocados à venda pela Prefeitura do Rio, adiantou-lhe uma parte substancial do preço de quaisquer terrenos, privados e públicos, edificáveis no perímetro da operação. Um terreno com valor de mercado atualizado igual a 100, cujos direitos de edificabilidade já foram alienados por 60, só vale, em tese, mais 40. É por isso que nenhum incorporador compra CEPACs sem já ter negociado com os proprietários os terrenos onde seus CEPACs irão “pousar”. Do contrário, corre o sério risco de ter de pagar duas vezes pelo mesmo direito de construir: a primeira à municipalidade, para adquirir CEPACs, a segunda aos titulares dos terrenos, para poder utilizá-los. 

2020-12-02