quarta-feira, 7 de setembro de 2022

Real estate, fictitious capital


NY Times 28-08-2022, por Farah Stockman 

Texto: Farah Stockman/NYT
Imagem: Álvaro Bernis/NYT
Que os imóveis ditos de alto padrão são um meio privilegiado de lavar grandes somas de dinheiro ilegal não é de estranhar. Nas localizações privilegiadas do mundo inteiro, hoje ao alcance da demanda planetária, o preço de transação dos produtos imobiliários não tem qualquer relação com o preço de produção: vale o que o demandante estiver apto e disposto a pagar pelo direito de ocupar o solo que os ancora. Quando muito o fisco poderá alegar que o preço é um outlier da própria espiral de valorização.

Por essa mesma razão eu considero a hipótese, menos respulsiva mas muito mais instigante, de que o mercado imobiliário de médio e alto padrão também lava dinheiro "limpo": por exceder em muito o valor que o trabalho é capaz de criar considerando os meios colocados à sua disposição, parte considerável, se não a maior, do lucro gerado na indústria da incorporação é pura renda fundiária de localização; em vez de produto real, mera transferência patrimonial. 
Sem falar da faculdade que têm os bens imobiliários de gerar rendas de localização até muito depois de cumprida a sua missão como mercadoria. 

Não por acaso, em uma época de concentração imparável dos rendimentos, redução relativa da massa salarial, precarização generalizada do trabalho e altas taxas de desemprego, o crescimento econômico vem sendo sustentado em boa parte do mundo pela alavancagem financeira lastreada na expectativa de valorização acelerada dos imóveis urbanos bem localizados.

Não foi o dinheiro sujo investido em imóveis que derrubou a economia planetária em 2008 (e hoje atormenta a economia chinesa e todos os que dela dependem): foi o dinheiro limpo.

A propriedade imobiliária e o capital fictício parecem fazer um casamento perfeito. Ou não?

2022-09-07