sábado, 15 de agosto de 2020

Apontamentos: Engels 1845 - as grandes cidades britânicas

ENGELS F [1845], “As Grandes Cidades”, em A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra. Boitempo, São Paulo 2010, pp. 67-116
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Friedrich Engels dedicou um capítulo inteiro de sua obra A Situação da Classe Operária na Inglaterra, publicada em 1845, às condições da habitação proletária nas grandes cidades britânicas. Seus termos são duros, suas imagens dolorosas e suas descrições até enfadonhas de tão repetitivas - porque a miséria era a mesma em toda parte.

Passados quase dois séculos e a despeito do próprio Engels ter declarado, no prefácio à edição alemã de 1892, que “o estado de coisas descrito neste livro – pelo menos no que se refere à Inglaterra – pertence hoje, em grande parte, ao passado”, cumpre dizer que o problema habitacional, quando não as condições sanitárias dos bairros proletários, jamais sequer equacionados nos países pobres e intermediários, voltam neste início de século XXI a assombrar as grandes cidades do mundo desenvolvido, povoadas de trabalhadores precarizados oriundos, em sua maior parte, como por um efeito-bumerangue, de suas periferias semicoloniais. A estagnação econômica mundial aberta pela debacle financeira de 2007 e agravada pela pandemia de coronavírus não augura dias melhores.

Deixando, porém, de lado por um momento esses fatos sumamente perturbadores, quero dizer que o capítulo “As Grandes Cidades”, além de libelo político e investigação sociológica, é também um pioneiro dos estudos de organização espacial urbana. Nele, o jovem Engels legou aos urbanólogos do século XXI uma boa coleção de observações sobre o atualíssimo tema da segregação socioespacial nas principais cidades da Grã-Bretanha de sua época e, no caso de Manchester, um esquema completo daquilo que hoje chamamos “estrutura urbana”, com indicações mais ou menos explícitas da disposição radial do conjunto, da relação entre centro, bairros e acessibilidade, dos gradientes de valores do solo, dos arranjos socioespaciais, da tipologia e mercado da habitação proletária e, ao final, um comentário bastante esclarecedor sobre a relação entre o regime inglês de propriedade da terra, a indústria e a qualidade da construção.

Esmiuçar o texto de Engels sob a ótica das estruturas espaciais pode ser uma experiência bastante enriquecedora para o estudioso da cidade.

(O mapa acima é uma versão tecnologicamente atualizada do mapa original da Engels à pg. 88, que ajuda a esclarecer algumas descrições do original, sobretudo a configuração do Centro comercial)

2020-08-13