O retiro espiritual do blogueiro vem de ser bruscamente perturbado pelo conhecimento da matéria da urbanista Raquel Rolnik sobre o artigo 49 do projeto de conversão da MP 619/2013, portador de uma solerte alteração do artigo 4º do Decreto-Lei 3365, de 1941, que trata de desapropriações por utilidade pública. Na matéria de Rolnik, de 08 de outubro de 2013, intitulada “Contrabando no Congresso Nacional”, pode-se ler a seguinte passagem:
“Hoje a lei que rege as desapropriações permite ao concessionário privado de um serviço público desapropriar com o objetivo de implementar o serviço: por exemplo, a concessionária contratada para a construção de novas linhas de metrô, ou de novas redes de energia elétrica, pode realizar as desapropriações necessárias para implementar as obras.
Hoje a lei permite também que o poder público – e apenas ele – desaproprie uma área maior do que a estritamente necessária para a realização da obra, possibilitando uma posterior revenda dessa área lindeira valorizada para assim custear o próprio investimento público.
O artigo contrabandeado na MP transfere esta prerrogativa para o privado, que poderá realizar desapropriações como se fosse o poder público e posteriormente desenvolver projetos imobiliários privados sobre as áreas desapropriadas.”
Leia o leitor a íntegra da matéria em
Quanto a mim, a pulga que já é posseira de uma vaga de estacionamento atrás da minha orelha, e se agita sempre que escuta a expressão “concessionária de serviços públicos”, cantou-me o título desta postagem.
PS: Sabrina Duran nos informa, em 25/10/2013, na página Arquitetura da Gentrificação,
http://reporterbrasil.org.br/gentrificacao/blog/dilma-sanciona-lei-que-garante-ao-setor-privado-o-poder-de-desapropriar-e-lucrar-em-obras-de-urbanizacao/
que “a presidente Dilma Rousseff sancionou ontem, 24/10, a lei 12873, que trata 'de obras e serviços de engenharia relacionados à modernização, construção, ampliação ou reforma de armazéns destinados às atividades de guarda e conservação de produtos agropecuários'".
Sabrina esclarece, também, que, “em São Paulo, Gilberto Kassab abriu o precedente para esse tipo de operação com o Projeto Nova Luz. O projeto utilizava o controverso instrumento chamado “concessão urbanística”, no qual o poder público concede ao privado o poder de desapropriar e lucrar sobre a área desapropriada. O Nova Luz foi 'engavetado' pelo prefeito Fernando Haddad, mas reapareceu ampliado – e agora turbinado – com a PPP de Habitação do Centro, um projeto de R$ 4,6 bilhões para a construção de 20 mil moradias na região central da cidade e que já teve decreto de desapropriação publicado pelo governador Geraldo Alckmin com o endereço de mais de 900 imóveis que serão desapropriados. Em mapeamento feito por moradores, a maioria dos imóveis são residências, comércios e indústrias ocupados e consolidados há décadas, ao contrário do que dizem os gestores da PPP, de que seriam imóveis vazios ou sub-utilizados.”