Publicado em 28 | Outubro | 2013
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Em 2009, por proposta do então e ainda atual prefeito do Rio foi aprovada a lei para realizar uma operação urbana na Região Portuária do Rio, sem qualquer previsão para destinação de percentual para para habitação social (faixa de zero a seis salários mínimos).
Dois anos após, a Caixa Econômica Federal criou um fundo imobiliário especial, com recursos do Fundo de Garantia dos trabalhadores para adquirir de uma vez só, em lote único, a totalidade dos títulos de potencial construtivo (Cepacs) do Porto, por R$ 3 bilhões à vista e sem qualquer reserva ou vinculação para edificação residencial e, muito menos, para habitação social.
Como era de se esperar, segundo publicação feita no jornal JB Online, o projeto inicial de “revitalização” que deveria incluir, além das alterações em mobilidade urbana e na infraestrutura, a revitalização das moradias já existentes na região e a criação de novos complexos habitacionais, com o repovoamento da região, moradores afirmam que o local está sendo utilizado para a construção massiva de complexos empresariais, por seu caráter econômico mais vantajoso.
Em suma, o governo municipal privilegia complexos empresarias à construção de residências, tornando a Região Portuária uma extensão do Centro do Rio. E a derrubada da Perimetral, marco principal desse processo da propagada “revitalização”, mas que, segundo informa a publicação, “não livra a região do seu futuro iminente: abandono e esvaziamento”.
O presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (CREA-RJ), Agostinho Guerreiro, criticou a postura da Prefeitura e não acredita em uma revitalização que desconsidera a construção de moradias.
“Não é o ideal porque quando se falou em revitalização, a ideia é revitalizar o porto e com isso, incluir a população. Qual o conceito de revitalização? É não ter uma cidade morta em nenhum momento do dia. E o que acontece com a cidade do Rio na parte da noite é que uma grande parte da cidade é morta, exatamente pela prioridade que foi se dando à parte de edificações institucionais, voltadas para serviços e comércio. São atividades que transcorrem fundamentalmente durante o dia”, explica.
A presidente da Associação dos Moradores do Morro da Conceição, Márcia Regina, afirmou que nenhum tipo de investimento foi realizado na localidade e que a chegada de empreendimentos comerciais tem sido intensa. “Aqui no Morro da Conceição nada foi feito, a Prefeitura deixou muito a desejar aqui. Fizeram uma obra ‘para gringo ver’, abriram a rua toda porque iam fazer fiação subterrânea e a obra não foi finalizada. Tem uns postes aqui no meio da calçada, e as pessoas são obrigadas a andar no meio da rua. Tem dez dias que uma criança foi atropelada”, reclama.
Em berço esplêndido -
Durante o meu mandato como vereadora, propus um projeto de lei destinando, obrigatoriamente, um percentual mínimo de 10% dos recursos públicos do potencial construtivo vendidos e a destinação de um mínimo também de 10% da área para serem aplicados em habitação social.
Após tramitar pelas várias comissões da Casa Legislativa, o projeto foi incluído na pauta de votação, mas prestes a ser votado, o líder do governo Paes e atual vice-prefeito do Rio, apresentou uma emenda ao projeto (apoiada por outros 16 vereadores) que suprimia a destinação dos 10% dos recursos do Cepacs à habitação social.
Com isso, também tirou o projeto da pauta de votação que acabou sendo arquivado. Lá dormita sem que nenhum vereador tenha pedido até o momento o seu desarquivamento.
O “medo” tardio…
Ainda este ano, por determinação judicial, ocorre um novo complemento do Estudo de Impacto de Vizinhança do Projeto do Porto “Maravilha”. A questão da moradia é levantada com veemência em Audiência Pública realizada na sede do Ministério Público. A mídia se alvoroça através de críticas em relação à falta de previsão de moradias para o projeto do Porto, como se a questão fosse descoberta agora….
O prefeito, por sua vez, disse, então, estar preocupado (?) com a questão residencial na área portuária, afirmando que não determinou um percentual de títulos reservados à habitação para não “desvalorizar” as Cepacs.
“Como eu queria vender aquele negócio, segurei, mas agora chegou o momento dessa discussão. Precisamos ter gente morando, para não virar o que virou o Centro. Este é o meu medo”. Não diga!
E a sociedade, atônita, não acredita no que vê ou no que ouve. Será preciso esperar o fim desse enredo para se lamentar, como sempre ?
Sonia Rabello é professora de direito administrativo e urbanístico