Os jornais
deste domingo 1º de junho noticiam, com um compreensível misto de
júbilo e desconfiança, a inauguração do Transcarioca, uma das novas linhas de
"metrô de superfície" (dito BRT*) em construção no
Rio de Janeiro.
(A desconfiança, neste caso, provém não da crítica do BRT, mas da certeza de que a sua inauguração no penúltimo domingo anterior à abertura da Copa do Mundo de futebol é mais uma fanfarronada oportunista de nossos governantes: o Transcarioca parece estar ainda longe de pronto e acabado para uma operação adequada).
Visto em perspectiva histórica, o Transcarioca é a fusão do conceito
do “Corredor T5”, postulado e difundido, ainda na década de 1970, por uma equipe de
urbanistas da extinta Fundação para o Desenvolvimento da Região Metropolitana
do Rio de Janeiro liderada pelo arquiteto Milton Bastos como peça chave da
macroestrutura físico-urbanística da RMRJ, com o conceito de “metrô de superfície”
desenvolvido pelos urbanistas e engenheiros de transporte de Curitiba, mais ou
menos a partir dessa mesma década, sob a liderança do também urbanista Jaime
Lerner, como alternativa de baixo custo ao Metrô como meio de transporte
“vertebrador” de média-alta capacidade.
A boa notícia, neste caso, é que o sistema de transportes da cidade e da região
metropolitana do Rio de Janeiro passa a ter a sua primeira ligação transversal,
vale dizer que já pode, ao menos nos planos conceitual e físico, ser
definido como uma “rede”. Para qualquer política séria de transporte municipal
e metropolitano, a existência de um sistema estrutural em “rede” é um
ponto de partida indispensável. Estranha, ou sintomaticamente, não se encontra na Internet nem no site Cidade Olímpica um único grafismo mostrando a inter- relação espacial do Transcarioca com os trens de subúrbio e a linha 2 do Metrô. (O esquema acima foi improvisado pelo blogueiro). E assim chegamos à má notícia.
A má notícia é que, atrasado 40 anos e parido, finalmente, como "legado olímpico", do ventre de uma
cultura de gestão privada dos transportes públicos que privilegia a eficiência
comercial de cada linha em particular sobre a eficácia e eficiência relativa do
sistema como um todo, o BRT é até hoje, o dia da sua inauguração, uma grande
incógnita – em termos tanto da integração operacional e tarifária com o
restante do sistema (se é que isso existe, no sentido moderno do termo, em nossa cidade) quanto de seus efeitos sobre
a estrutura urbana do Rio de Janeiro e seus impactos urbanístico-ambientais nas
regiões servidas.
Eu não estranharia se me dissessem que as únicas coisas de que se tem certeza é
que ele poderá ser usado por turistas e representantes comerciais pouco abonados
chegados ao Aeroporto Internacional e pelos trabalhadores da Zona Norte e periferia metropolitana que
prestam serviços em Jacarepaguá e Barra da Tijuca – em especial nos novíssimos condomínios comerciais e residenciais da Avenida Abelardo Bueno, imediatamente servidos,
cujos incorporadores não pagaram, como sempre no governo Paes e em quase todos os outros, um único centavo pela vantagem obtida.
Reconhecendo não estar suficientemente informado sobre o Transcarioca para ir além dessas brevíssimas observações, o que de melhor posso oferecer nesta oportunidade é a republicação da postagem “O Planejamento Olímpico e a Revolução dos Transportes”. O leitor pode acessá-la clicando no link abaixo.
Ressalvado
o fato de que ter razão pode ser, às vezes, perversamente gratificante
no plano pessoal, eu declaro, para todos os efeitos relativos à imagem pública deste blog, que gostaria
de ver desmentidas pelos fatos as análises e augúrios contidos nesse artigo, escrito em abril de 2012. http://abeiradourbanismo.blogspot.com.br/2012/04/o-laboratorio-de-planejamento-urbano-do.html
Boa leitura.
2014-06-01