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domingo, 18 de maio de 2025

Péssima notícia, como de costume

Diário do Rio 15-05-25
https://diariodorio.com/construtora-mineira-e-responsavel-pelo-projeto-que-pode-destruir-area-verde-do-centro-do-rio-com-espigao-de-22-andares/

O Centro do Rio segue à beira de perder um dos poucos e mais importantes espaços verdes da região e ganhar um ‘paredão’ que vai ser visto desde o Morro de Santo Antônio. A possível e polêmica construção de um espigão de 22 andares e 720 apartamentos no Buraco do Lume — área localizada na Praça Mário Lago que representa quase 50% de seu tamanho total — tem sido acompanhada de perto pelo DIÁRIO DO RIO. (..) O projeto, orquestrado pela construtora mineira Patrimar, anda gerando uma onda de opiniões contrárias de urbanistas, arquitetos e também do empresariado do Centro. Obtivemos acesso exclusivo à documentação do processo de licenciamento do futuro espigão perante a Prefeitura, revelando falhas e ocultações consideradas suspeitas que envolveriam o projeto. (..)

2025-05-18

quarta-feira, 14 de maio de 2025

Excelente notícia, para variar


Diário do Rio 12-05-2025
https://diariodorio.com/terraco-com-vista-jardins-suspensos-paineis-de-portinari-o-que-encontrar-no-palacio-capanema-que-sera-reaberto-como-centro-cultural/

(..) O projeto de revitalização prevê que 60% do prédio seja dedicado a atividades culturais e os outros 40% à parte administrativa. A Fundação Nacional de Artes (Funarte) anunciou planos de transferir cerca de 300 funcionários para três andares do edifício — eles atuavam na antiga sede do órgão na Cidade Nova. O prédio também passa a abrigar áreas da Biblioteca Nacional, do Iphan, do Ibram e da Cátedra Unesco da Casa Rui Barbosa, entre outros órgãos culturais.

Apesar de não ser inteiramente aberto à visitação, boa parte do edifício está acessível ao público, incluindo salas de exposição, áreas comuns e até o espaço reservado à ministra da Cultura, Margareth Menezes, que defende o prédio como um motor da economia cultural do Rio. A ideia, segundo o Iphan, é que as pessoas se apropriem do Capanema, compreendam sua importância histórica e façam dele um espaço vivo. (..)


2025-05-14

Leia neste blog
‘MEC, marco cívico no.1 do Rio de Janeiro”, 18-05-2022
https://abeiradourbanismo.blogspot.com/2022/05/capanema-joia-da-coroa.html

domingo, 2 de fevereiro de 2025

quarta-feira, 21 de junho de 2023

Retrofit animal


O Globo 15-06-2023

Montagem: Àbeiradourbanismo
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 "Quase dois anos após, enfim, conseguir seu primeiro inquilino, o prédio que é considerado o maior ‘elefante branco’ do Rio ocupa seus andares a passos de tartaruga. A única locatária do Eco Sapucaí, na Cidade Nova, continua sendo a companhia de óleo e gás franco-americana TechnipFMC, que preenche hoje 9,2 mil metros quadrados (..) ainda restam quase 70 mil metros vazios, ou 88% de todo o edifício. (..) Imóvel “triplo A” com projeto de Oscar Niemeyer, o Eco Sapucaí tem vista privilegiada para o Sambódromo, ocupando terreno da antiga fábrica da Brahma. (..)"

A solução é simples: transformar o elefante em camelo, isto é, a converter o edifício em uma torre de super-camarotes do Sambódromo, a serem cedidos por tarifas triliardárias aos xeiques de Doha, Dubai, Abu Dahbi, Manama, Neom e adjacências para quatro noites de esbórnias momescas que valerão por mil e uma. 

2023-06-21

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Óleo de cobra

Deu n'O Globo
06-12-2020, por Luiz Ernesto Magalhães
https://oglobo.globo.com/rio/nova-prefeitura-fara-plano-para-revitalizar-centro-atrair-investidores-1-24783675

Nova prefeitura fará plano para revitalizar o Centro e atrair investidores


O reprefeito eleito Eduardo Paes anuncia 
novos grandes planos para o Centro do 
Rio com o dinheiro de “investidores”.


Mas não era este o objetivo do Porto Maravilha? O que deu errado? Sem tal balanço, não há como levar a sério o novo plano do velho prefeito. Se a recessão já havia detonado a ilusão de uma Operação Urbana Consorciada exclusivamente voltada para os negócios, o turismo e suas populações flutuantes, que dirá agora que a demanda de escritórios e hotéis foi devastada pela pandemia! 

Nunca entendi a pretensão de criar-se uma expansão comercial de 500 hectares num setor distinto daquele (1) em que o Município investiu, já no início deste século, um monte de tempo e dinheiro ("Teleporto” / Cidade Nova); (2) para onde a principal âncora econômica do Centro do Rio, a Petrobrás, vinha direcionando todos os seus investimentos (o corredor Castelo / Cruz Vermelha / Cidade Nova); (3) em que o Metrô, há muito previsto (Estácio-Praça XV), já contava com três estações plenamente operacionais (Estácio, Cidade Nova e Carioca).

Não bastasse, o Porto Maravilha já se anunciava como o canto de cisne de uma geração de Grandes Projetos Urbanos de "revitalização de áreas centrais" nutrida pela ciranda financeira global: os efeitos devastadores da debacle de 2008 despontavam no horizonte quando ele foi deslanchado pelo próprio prefeito Paes ao som das fanfarras da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016.

Até mesmo a oportunidade de se construir habitação de mercado no Porto, quando a demanda olímpica em dólar empurrou a alta de preços imobiliários na direção do Centro, foi perdida.

Não há como pensar seriamente na recuperação econômica e urbanística do Centro do Rio sem que se inclua, num mesmo plano estratégico, o Centro propriamente dito, a Cidade Nova, a Cruz Vermelha e a Portuária; o comércio, os escritórios, a hotelaria, os serviços e a habitação; o VLT, os ônibus e o Metrô.

Para começar, considero fundamental que se resgatem os CEPACs do Porto Maravilha alienados à Caixa Econômica Federal e que a OUC seja totalmente reformulada sob o comando de urbanistas de reconhecida experiência no assunto - com 100% de transparência, expressa determinação de dar prioridade à mescla de usos, muita habitação para todas as faixas de renda e, é claro, um projeto urbanístico digno deste nome.

Eduardo Paes tem essa dívida com a população da cidade do Rio de Janeiro. Pretender quitá-la com um novo aceno aos "investidores", panaceia que traz sempre na algibeira, não é um bom augúrio. 

2020-12-08

quarta-feira, 2 de outubro de 2019

O Buraco do Lume, o Terminal Garagem e o sumiço do solo público no coração do Rio

Praça Mário Lago
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Decidido a não ficar para trás na disputa com seus pares pelo título de governante mais infame do Brasil, o prefeito Crivella, que recém assombrou o mundo com o envio de uma equipe de fiscais à Bienal do Livro para recolher um gibi que trazia na capa um beijo gay, acaba de mandar à Câmara Municipal do Rio de Janeiro um Projeto de Lei Complementar que concede ao pretenso proprietário de um pedaço da Praça Mário Lago, núcleo geográfico e simbólico do Centro da cidade, o direito de lá erguer um arranha-céu comercial.

Que coincidência! O terreno em questão, imortalizado na crônica carioca como Buraco do Lume, acaba de ser arrematado em leilão por um “investidor anônimo”, pela quantia nada módica de 8,4 milhões de reais, [1] a uma empresa associada à Bradesco Seguros, que por sua vez o adquiriu como parte da massa falida do extinto Banco do Estado do Rio de Janeiro - BANERJ.

Como ninguém gasta tanto dinheiro na compra de um terreno sem a expectativa de recuperá-lo com um ótimo retorno, [2] é óbvio que o “investidor anônimo” deve estar seguro de que conseguirá a aprovação do projeto legislativo do prefeito para viabilizar a construção. Ou quem sabe, considerando o péssimo estado da economia e a superoferta de espaço comercial no Centro da cidade, especule com a desapropriação do terreno por interesse público - avaliada não com base na lei vigente desde 1986, que só permite o uso da área para a instalação de equipamentos culturais, mas pela nova lei, que restabelece os generosos parâmetros de edificabilidade e uso vigentes 30 anos atrás! Em tempos de vale-tudo, tudo vale. 

Para um histórico amplamente documentado e ilustrado desse imbróglio jurídico- administrativo, recomendo ao leitor os artigos “Buraco do Lume”, do geógrafo Brasiliano Vito Fico, e a resenha “Mais sobre o buraco do lume – antecedentes importantes”, publicados no blog Urbe Carioca nos dias 11 e 20 de setembro [3]. Eu o resumiria da seguinte maneira:

  • Em junho de 1970 a área pública delimitada pelas ruas São José, Quitanda e Av Nilo Peçanha é desafetada do uso comum e incorporada como bem dominical ao patrimônio do Banco do Estado da Guanabara – BEG.
    Detalhe do "PA 8903",
    de agosto de 1970,
    que prevê a criação
    do Lote 1 da Quadra A
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  • Em agosto de 1970 o parcelamento e a edificabilidade da área são regulados pelo instrumento normativo (incorretamente batizado) “Projeto de Alinhamento 8903” [4]: é previsto um lote de 2.500m2, com 70.000m2 edificáveis e frentes para as ruas São José, Quitanda e Av Nilo Peçanha; e um triângulo remanescente “a ser doado ao Estado para implantação de praça pública”.
  • Em fins de 1970 o terreno correspondente ao Lote 1 da Quadra A do “PA 8903” é vendido pelo BEG ao Grupo Empresarial Lume. Associado ao grupo Halles, o LUME começa a construir aí o seu edifício-sede.
  • Em 1974 a nova praça é urbanizada, com lago e passarelas, com o nome de Melvin Jones, fundador do Lions Club International. 
  • Em 1975 o Halles sofre intervenção federal e é comprado pelo próprio BEG. Em 1976 o Grupo Lume, em situação falimentar, também é alvo de intervenção do Banco Central. Abre-se uma longa e obscura questão judicial. O terreno, escavado para a construção das fundações e garagens do edifício, converte-se numa pocilga batizada pela população como “Buraco do Lume”.
  • Em abril de 1979 o Buraco é aterrado pelo prefeito “biônico” Israel Klabin, sem desapropriação, e passa a ser usado pelo povo como extensão da Praça Melvin Jones. 
  • Em 1986, por decreto do prefeito Saturnino Braga, o uso e edificabilidade do terreno são radicalmente alterados, permitindo-se somente usos culturais (cinema, teatro, biblioteca e livraria) e edificação com altura máxima de 17,00m, sobre pilotis. 
  • Em fins da década de 1990 a praça Melvin Jones é rebatizada Mário Lago, em homenagem ao advogado, poeta, radialista, compositor e ator carioca.
  • Em 2009 a praça Mario Lago é reurbanizada, adquirindo as características atuais.
  • Em 2013, com a compra dos ativos do BANERJ (ex-BEG), o terreno passa ao controle do Bradesco.
  • Em setembro 2019 o terreno é arrematado por R$ 8,4 milhões, em leilão ocorrido na capital paulista.

No entender de Sonia Rabello, especialista em Direito Urbanístico, o registro do “Buraco do Lume” como propriedade privada é um anacronismo cartorial, uma formalidade
“ab-rogada pela usucapião pública da praça lá localizada na integralidade do terreno desde o seu aterramento nos anos 80 pelo prefeito Klabin, em função do abandono e desídia do antigo proprietário; praça esta, desde então, de uso comum do povo, e oficialmente designada como logradouro público”.[5]
Sou da mesma opinião. E peço a atenção do leitor para duas ou três observações sobre este que é, para mim, um capítulo dramático da história do espaço público no Centro do Rio.


Morro do Castelo, início do século. A
linha vermelha indica a posição aproximada 
da área pública legada ao centro 
moderno pelo desmonte.
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O terreno em questão é a penúltima fração ainda disponível para uso comum de uma generosa área pública legada pelo desmonte do Morro do Castelo, em 1922, ali onde a vertente norte confrontava o velho centro comercial, mais exatamente a Rua S. José.

O espaço se estendia do Largo da Carioca à Igreja de S. José, (diríamos hoje entre o Metrô da Carioca e Praça XV), tendo de um lado o velho centro comercial ao norte da rua São José e de outro o novo setor de escritórios ao sul da Erasmo Braga / Nilo Peçanha, nascido do desmonte do Morro e batizado Esplanada do Castelo. Em si mesmo um movimentado corredor de passagem de pedestres, sobretudo devido à Estação das Barcas da Baía de Guanabara, servia como um vazio de transição, ou charneira, entre o entramado colonial/imperial das ruas da Assembléia, Ouvidor, Rosário e Alfandega e a urbe proto-moderna do Castelo, implantada segundo as regras do Plano Agache.

Centro do Rio. As áreas claras mostram o espaço público legado pela demolição do Morro do Castelo. O triângulo corresponde à atual Praça Mário Lago, incluindo o Buraco do Lume, e o retângulo a área atualmente ocupada pelo Terminal Garagem Menezes Cortes - antigo Terminal Erasmo Braga (Praça Presidente Antonio José de Almeida) 
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Vista aérea da área pública ocupada pelo Terminal Erasmo Braga em 1964. O espaço é delimitado lateralmente pelas ruas São José (esq) e Erasmo Braga (dir). Ao fundo, o Edifício Estácio de Sá (1954-6) a Igreja de São José e a Assembléia Legislativa. Mais além, a Estação das Barcas e a Baía de Guanabara.
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Indícios razoavelmente claros da situação fundiária desse "common" estendido estão dados no documento municipal de 1956 intitulado “Projeto de Ampliação da Estação Central de Ônibus (Terminal Erasmo Braga) - PA 6739". Nele, a área já ocupada pelo terminal aparece como logradouro público, não superposto a nenhum lote privado. Cabe mencionar que, numa imagem da década de 1950 disponível na Internet, o terminal aparece referido como "Praça Presidente Antonio José de Almeida". Já o prolongamento do terminal sobre a área da atual Praça Mario Lago, afunilando em direção à Avenida Rio Branco, mostra o atingimento de alguns móveis remanescentes no lado ímpar da Rua São José, a serem, neste caso, desapropriados.


Projeto de Ampliação da Estação Central de Ônibus” ("PA 6739")
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Este dado parece corroborar a opinião de Decourt, expressa no saite Foi um RIO que passou
“Com a demolição do morro e os planos urbanísticos para a Esplanada do Castelo, a pequena área atrás do lado ímpar da Rua de São José entre a Rua da Quitanda e Ajuda, renomeada à época de Rua Chile, foi confusa, principalmente pois os terrenos de alguns sobrados avançavam sobre as fraldas do morro. Essa indecisão provocou uma curiosa situação, enquanto novas avenidas eram abertas como a Erasmo Braga, Graça Aranha, Nilo Peçanha, o trecho da São José permanecia ali, inclusive com grandes pedaços do Morro do Castelo (..) em plenos anos 50.” [6]
Detalhe do PAA 8264, de 08-65, que
"modifica o 7817 quanto ao estacionamento
na confluência da Av Nilo Peçanha
com a Rua São José".

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O status de logradouro público dessa área aparece inalterado no PAA/PAL 7817/23522, de novembro de 1961, referido a lotes no Largo da Carioca. O mesmo vale para o PAA 8264, de agosto de 1965, assinado pelo governador Carlos Lacerda e pelo Secretário de Viação e Obras Marcos Tamoio, que não mais destina o largo definido pelas ruas S José, Quitanda e Av. Nilo Peçanha à "ampliação do terminal de ônibus", mas à implantação de uma "praça ajardinada com estacionamento subterrâneo". Pela primeira vez não figuram lotes remanescentes no lado ímpar da Rua São José, permitindo supor que já haviam sido desapropriados. Na prática, até a sua desafetação do uso comum e incorporação ao patrimônio do BEG, em 1970, o largo foi utilizado para o estacionamento de veículos. 
Imagens aéreas do corredor Carioca-1o. de Março
antes e depois da construção
do Terminal-Garagem Menezes Cortes.

Em fins da década de 1960, porém, num desvario crucial para a história do urbanismo no Centro do Rio, o governo da cidade-estado decide erguer, no lugar do velho terminal urbano, o Edifício Menezes Cortes. Híbrido de terminal metropolitano, galeria comercial e edifício-garagem, o nefando caixote de concreto e alvenaria inaugurado em 1973 deveria absorver os "frescões" com destino ao Centro do Rio e o caótico estacionamento de automóveis incentivado e permitido nas ruas circundantes pelas mesmas autoridades que o mandaram construir. [6]  

Era o auge do rodoviarismo burocrático-militar que legou à cidade o recém-demolido Elevado da Perimetral e seus congêneres das ruas Paulo de Frontin (Rio Comprido) e Bela (São Cristóvão), ainda hoje plenamente operacionais por estarem os respectivos bairros fora da órbita dos Grandes Projetos Urbanos da virada do século XXI.

Não bastasse a agressão urbanística, a gestão do Terminal Garagem seguiu uma estranha trajetória. Segundo o saite Mobilidade Fluminense, a TGMC S.A., criada em 1998,
"deixou de ser propriedade do Estado após um leilão de privatização realizado no mesmo ano. (..) O único ativo da TGMC S.A. é também o prédio onde funciona a empresa, no Centro do Rio de Janeiro. O complexo, distribuído em 16 andares, possui cerca de 100.000 m² e abrange a operação de 235 lojas comerciais, no térreo e na sobreloja, além de cerca de 3.500 vagas de estacionamento. A base do prédio, onde funciona o Terminal Rodoviário, é alugada à CODERTE, estatal vinculada à Secretaria de Transportes do Governo do Rio de Janeiro.” [7]
Foi assim que, salvo alguma ressalva ainda não divulgada nos termos da privatização, uma imensa praça pública situada no coração da cidade, adjudicada ao uso da Companhia de Desenvolvimento Rodoviário e Terminais, se converteu em propriedade privada a cujo titular a própria CODERTE deve pagar aluguel. 

Dando um salto no tempo, não foi fortuita a aprovação pelo prefeito Saturnino Braga, em setembro de 1986, da norma urbanística que até hoje regula o uso do Lote 1 da Quadra A do PAA/PAL  9369/31660 - Buraco do Lume: o Rio voltara a ser município [8] e as liberdades civis recém-conquistadas à ditadura militar, dentre as quais a escolha do prefeito pelo voto direto, abriam amplo espaço ao movimento de preservação do patrimônio histórico, arquitetônico e cultural, que no Rio de Janeiro gerou, dentre os outras iniciativas, o Corredor Cultural e as APACs da Saúde, Gamboa e Santo Cristo (projeto SAGAS) e da Cruz Vermelha, todos na região central da cidade.

Praça Melvin Jones, 1974
Por sua localização estratégica, a Praça Mário Lago ganhou, ao longo dos anos, status de espaço público insubstituível. Tornou-se palco de manifestações políticas e culturais, reconhecido e consolidado pela arquitetura de sua mais recente urbanização: em lugar das passarelas sobre espelho d’água da praça Melvin Jones, onde “seguir circulando” era o uso implicitamente determinado, temos hoje um singelo anfiteatro público, símbolo e cenário das liberdades cidadãs. 
Praça Mário Lago, atualmente

A reincorporação ao uso comum - tráfego intenso de pedestres, feiras de produtos artesanais e comércio ambulante, descanso e contemplação dos trabalhadores do Centro da cidade - da parte da praça que lhe foi tomada pelo governo da Guanabara e vendida a um notório especulador, que a abandonou, acabou, curiosamente, convertendo o epíteto “buraco do Lume” em codinome popular e afetivo de todo o conjunto.

A tentativa governamental de devolução do Buraco do Lume ao uso privado para construção de um arranha-céu pode ser vista como o capítulo mais recente do consistente processo de privatização e edificação do grande espaço central legado pelo desmonte do Morro do Castelo.

Não há de ser casual a apresentação do Projeto de Lei Complementar 128/2019 pelo executivo municipal quase que simultaneamente à compra do terreno em leilão por um “investidor anônimo”, uma combinação de eventos aliás perfeitamente ajustada a um ambiente político conducente, nos planos federal, estadual e municipal, sob a conveniente cobertura da "liberdade econômica", à guerra de rapina por oportunidades de ganho rápido, fácil e de legitimidade duvidosa à custa do patrimônio coletivo.

Diz a Constituição que o uso da propriedade urbana se sujeita à sua função social, conforme estabeleça o Plano Diretor. O Plano Diretor do Rio de Janeiro não dispõe, que eu saiba, sobre o uso do Buraco do Lume. Na dúvida, diz o prefeito Crivella que o terreno cumprirá sua função social se foram restabelecidos os parâmetros vigentes entre 1970 e 1986, não por acaso quando governavam os militares e seus prepostos.

Eu, como a professora Rabello e, com toda certeza, uma legião de urbanistas cariocas, penso que a função social do Buraco do Lume está dada, há mais de 30 anos, pelo uso comum do povo. Resta saber se a Câmara Municipal confirmará tal opinião e se é essa a visão dos magistrados que vierem a julgar o caso se ele for parar na esfera judicial. 

Veremos.

____
NOTAS
[*] “Buraco do Lume, no Centro, por virar novo espigão”. O Globo 10-09-2019, por Luiz Ernesto Magalhães
https://oglobo.globo.com/rio/buraco-do-lume-no-centro-pode-virar-um-novo-espigao-23937138

[2] Segundo O Globo de 11-09/ L E Magalhães, “o mercado imobiliário estima que o terreno tem potencial para gerar cerca de R$ 800 milhões com a venda de lajes comerciais”. Vale dizer, o “anônimo” teria arrematado o Buraco do Lume por valor equivalente a 10% do VGV.

[3] “Buraco do Lume”. Urbe Carioca (blog) 11-09-2019, por Brasiliano Vito Fico

“Mais sobre o buraco do lume – antecedentes importantes”. Urbe Carioca (blog), por Urbe Carioca http://urbecarioca.com.br/2019/09/mais-sobre-o-buraco-do-lume-antecedentes-importantes.html

[4] O documento, na tradição da “legislação desenhada” praticada durante muitos anos no Rio de Janeiro, deveria ser chamado “Projeto de Urbanização” e ter um número específico associado à sigla "PAL" (Projeto Aprovado de Loteamento). Projetos de Alinhamento somente afetam terras privadas ao uso comum do povo (logradouro público), criando “servidões de recuo” não edificáveis, passíveis de desapropriação futura ou permuta pelo potencial construtivo; não podem regular o parcelamento, o uso e a edificabilidade do solo. O erro foi corrigido na edição de seu substituto, o PAA/PAL 9.369/31.660, chamado “Projeto de Urbanização da Quadra Compreendida (..)”. Por outro lado, este mesmo PAA/PAL 9.369/31.660 exibe uma contradição nunca esclarecida com seu antecessor, relativa à área do Lote 1 da Quadra A (o “Buraco do Lume”), agora substancialmente ampliado com a incorporação das áreas de esquina da Rua da Quitanda com a Rua S José e a Av Nilo Peçanha. 

[5] “Buraco do Lume: qual o seu negócio? Para quem?”. Blog Sonia Rabello 13-09-2019, por Sonia Rabello

[8] Em 1975 o governo militar do general Ernesto Geisel promoveu a fusão da cidade-estado da Guanabara com o estado do Rio de Janeiro, que tinha Niterói por capital. A Guanabara tornou-se Município do Rio de Janeiro, capital do novo estado do Rio de Janeiro. Até 1986 os prefeitos da capital foram nomeados pelo governador e por isso chamados popularmente de “biônicos”. Saturnino Braga foi o primeiro prefeito eleito da redemocratização.



2019-10-02


segunda-feira, 14 de janeiro de 2019

Petróleo e estatais no Centro do Rio: uma nota

IBRAFi Notícias / O Globo  07-01-2019, por Ramona Ordoñez e Bruno Rosa

Retomada do petróleo anima mercado imobiliário do Rio

Edifício sede da Petrobrás na Avenida Chile, 

Centro do Rio de Janeiro


“(..) Um levantamento da Regus, empresa especializada no aluguel de salas comerciais, mostra que mais de 450 empresas relacionadas ao setor de petróleo e gás, entre operadores e prestadores de serviços, abriram ou ampliaram escritórios no Estado do Rio, principal zona produtora do Brasil, no ano passado. A previsão da empresa é que este ano haja um aumento de 30% no número de companhias do setor em busca de espaços flexíveis, virtuais, ou em coworking, além de obter endereços fiscais no Rio para iniciar atividades no país.

O mercado carioca ganhou ainda um impulso extra no fim de dezembro, quando a Petrobras abriu uma licitação para alugar espaços de trabalho para até 4.500 posições (pessoas) ao longo de três anos em regime de coworking. Ou seja, a estatal quer investir em um novo modelo que possibilite o trabalho em conjunto com outras empresas perto de sua sede, no Centro do Rio. (..
)

*
O papel da indústria do petróleo na recuperação do dinamismo imobiliário do Centro do Rio na primeira década do século XXI está competentemente analisado, e profusamente documentado, na dissertação da arquiteta e urbanista Alice Belém intitulada Novos Rumos para o Centro do Rio de Janeiro - os significados da prosperidade do petróleo (Especialização em Engenharia Urbana UFRJ 2013), que o leitor pode acessar pelo link [1].

Segundo Belém, “48% das empresas de petróleo e gás do município estão instaladas no Centro do Rio de Janeiro (..) com atividades relacionadas a Serviços, Produtos, Organização e Exploração & Produção”.

Ampliando o escopo da análise, Belém observa que, apesar das privatizações, as empresas estatais remanescentes com sede no Centro do Rio representam "vultosas massas de capital e expressivos contingentes de empregos, diretos e indiretos."

Em 2008, só a Petrobrás contava 31 mil postos de trabalho no Centro, incluindo Praça da Bandeira, sendo 8,9 mil no edifício-sede (Edise) da Avenida Chile e outro tanto distribuído em edificações novas e retrofitadas, próprias e alugadas, no corredor urbano Castelo-Cruz Vermelha-Estácio.


Fonte: Belém, A. Novos Rumos para o Centro do Rio de Janeiro - os significados da prosperidade do petróleo

Tendo em conta os fluxos financeiros associados a essas "massas de capital" e o nível salarial médio desses empregos, pode-se supor a importância decisiva das estatais herdadas dos ciclos desenvolvimentistas do século XX e, mais recentemente, da renovada economia do petróleo, como contraponto aos efeitos negativos (a) da mudança da capital para Brasília em 1960, (b) das crises econômicas recorrentes e (c) da concorrência inexorável dos subcentros sobre a dinâmica imobiliária e a conservação e uso do estoque de bens públicos do Centro do Rio.

Assunto para um livro inteiro ou uma tese doutoral; no meu caso, quem sabe dois ou três artigos para este mesmo blog. Um deles, com certeza, seria dedicado a debater a hipótese de Villaça, enunciada em sua obra magna Espaço Intra-Urbano no Brasil (1998), de que “a única explicação possível para o fato de partes significativas das elites cariocas ainda usarem o centro do Rio”, fazendo dele o menos afetado dentre os centros metropolitanos brasileiros pelo abandono dos grupos sociais afluentes, “é uma só: a força da tradição e das monumentalidades herdadas do passado”. [2]

Não seria o caso - pergunto - de incluir como fator explicativo da resiliência econômica no Centro do Rio, ao lado da indiscutível “força da tradição” materializada em um tesouro de bens legados pela capital da Colônia, do Império e da República, a condição de sede do parque de empresas estatais nacionais e a circunstância de capital da indústria (cada vez menos) brasileira do pré-sal?

Não por acaso considero, faz tempo, a expansão da "indústria da administração petroleira" sobre o vetor Castelo-Cruz Vermelha-Estácio um aspecto ineludível do debate sobre os parcos sucessos e muitos desacertos da Operação Urbana Porto Maravilha, bem como das decisões relativas ao Metrô, portanto de toda a política oficial voltada à "revitalização do Centro" nos últimos 20 anos.

2019-01-14

______
NOTAS
[1] http://abeiradourbanismo.blogspot.com/2013/12/novos-rumos-para-o-centro-do-rio-de.html
[2] VILLAÇA, Flavio. Espaço Intra-Urbano no Brasil (1998), São Paulo: Studio Nobel; FAPESP; Lincoln Institute, 2001, p.292



sexta-feira, 31 de agosto de 2018

O Metrô nosso de cada dia

Boletim ADEMI 30-08-2018
http://www.ademi.org.br/article.php3?id_article=76149&recalcul=oui

Lei autoriza o Governo do Estado a estudar extensão da Linha 4 do Metrô até o Terminal Alvorada

*

A cidade dos últimos governantes do Rio de Janeiro, município ou Estado, só tem um quadrante: o sudoeste, que lhes é insistentemente sinalizado pelos produtores de bens imobiliários de médio e alto padrão. O Porto Maravilha é a exceção que confirma a regra: foi reservado no nascedouro para os negócios, o turismo e a população flutuante que lhes corresponde.

Foi assim que, a pretexto dos Jogos Olímpicos, executou-se no último decênio um gigantesco programa de investimentos em transportes urbanos com foco na Barra da Tijuca. Seu efeito mais conspícuo foi celebrado por Carlos Carvalho, uma dos maiores e mais antigos proprietários de terras da região, com uma frase lapidar: "Um pulo de bilhões!" [1] 

Para não me deixar mentir, três anos depois da chegada do Metrô ao Jardim Oceânico [2] e quatro depois dos Jogos, o governador Pezão anuncia, com apoio do Legislativo estadual ainda insepulto, sua intenção de estendê-lo até o Terminal Alvorada, a vasta rotunda modernista onde hoje assoma a Catedral da Música do ex-prefeito César Maia. 

Nenhuma surpresa. Este mesmo blog registrou, 18 meses atrás [3], que o prefeito Crivella e o governador Pezão urdiam um plano para estendê-lo até o Recreio dos Bandeirantes com recursos da venda de CEPACs. Na ocasião, sugeri que com a ajuda dos paulistas o Metrô do Rio poderia chegar a Paraty.


Montagem: à beira do urbanismo
Imagens originais: Internet


Como, porém, não gosto de estar somente criticando, resolvi dedicar algumas horas a um estimulante passatempo: imaginar cenários de expansão do Metrô da minha cidade. 

O resultado não é necessariamente melhor do que as sugestões que aparecem nos saites de outros urbano-transportistas, profissionais e amadores, mas seguramente não é pior do que as propostas com que os governantes costumam se insinuar aos que estão sempre em busca de oportunidades para valorizar seus capitais. 

No fim das contas, a ideia agradou-me a ponto de achar que valeria a pena compartilhá-la. Aí vai ela - devedora, com certeza, de uma memória ainda em rascunho. Tendo em conta o enorme o risco de não conseguir lhe dar tão cedo uma forma satisfatória, decidi publicar por ora só o desenho e confiar na boa vontade do leitor.

Adianto, aqui, cinco aspectos da proposta: 

(1) Cobertura de todo o Centro Metropolitano Expandido (CME) a Oeste da Baía de Guanabara;

(2) Estrutura em rede radio-circunferencial abrangendo a totalidade do setor efetivamente ocupado; aproveita-se a especial disposição geográfica dos segmentos radiais urbanos Ipanema-Gávea e Tijuca-Méier para formar um arco externo de alta densidade, aqui chamado de Linha X; o fechamento do circuito da Linha 1 por meio da ligação Gávea-São Miguel sugere a hipótese de esquemas operacionais flexíveis.  

(3) Construção prioritária da Linha Y para atendimento ao corredor central de negócios, residências, comércio e serviços Estácio-Castelo e a integração física com os transportes hidroviários da Baía de Guanaraba.

(4) Segmento noroeste da Linha X (S. Miguel-C Universitária) traçado de modo a propiciar o adensamento residencial e a habitação subsidiada próxima ao Centro, bem como a melhoria substancial da acessibilidade a grandes assentamentos de baixa renda como Borel/Formiga, Andaraí, Alemão e Maré/Nova Holanda.

(5) Traçado da Linha X ampliando deliberadamente a oferta de serviço na área do Méier/Cachambi para consolidá-lo como subcentro multifuncional no extremo oeste do CME, o que, junto com a ligação entre a Cidade Universitária / Aeroporto Internacional  e a Zona Sul, nos dois extremos, contribui para o equilíbrio operacional do sistema.

(6) Extensão da Linha 4 até a Gamboa para tornar credível, e viável, a criação de um setor residencial de média/alta densidade na região da Portuária (Porto Maravilha) 


Ideia original e montagem: à beira do urbanismo
Mapa base: Internet
Clique na imagem para ampliar

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[1] “Benesse olímpica” (13-08-2015)

[2] “Papai Noel vai ao Jardim Oceânico” (30-01-2015)

[3] “Governança à bangu” (15-04-2017)

2018-08- 31

terça-feira, 8 de agosto de 2017

Meu Porto Minha Vida

Deu n’O Globo / Noblat 
05-08-2017, por Tarcísio Motta, vereador PSOL
http://noblat.oglobo.globo.com/geral/noticia/2017/08/porto-maravilha-caixa-preta-bilionaria.html

Porto Maravilha, a caixa-preta bilionária
Operação coleciona denúncias de mau uso do dinheiro público, falta de transparência, remoções forçadas, descumprimento da legislação ambiental e esquemas de propina 
Imagem: Dreamstime
Fonte: Internet
Era uma vez um prefeito que fez parceria com empreiteiras para que administrassem um pedaço da cidade. Essas empresas, por sua vez, contrataram uma companhia de coleta de lixo para prestar serviço nesse território. Só que essa companhia era da própria prefeitura. Assim, a tarefa continuou sendo da alçada do prefeito, só que mais cara.
Não se trata de um plano mirabolante de Odorico Paraguaçu, o personagem de Dias Gomes que tinha como bandeira a construção de um cemitério na cidade. Foi a estratégia executada pelo antigo prefeito do Rio para a implantação do Porto Maravilha.
Neste drama real, as empreiteiras são Odebrecht, OAS e Carioca Engenharia, que formam a concessionária Porto Novo; e a empresa pública é a Comlurb. Mas o mau negócio não parou por aí.
A verba usada pela Porto Novo para administrar o território saía de um fundo da Caixa, que, sofrendo as consequências do péssimo investimento, parou de fazer repasse para a concessionária recentemente. (Continua)
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 08-08-2017