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quarta-feira, 16 de outubro de 2024

Obsolescência sui generis


Diário do Rio 28-09-2024
https://diariodorio.com/nem-os-mais-novos-escapam-construtora-derruba-predio-moderno-para-erguer-espigao-de-luxo-em-ipanema

Este exemplo mostra como a hipervalorização de certas localizações pode 'explodir' o efeito característico dos ciclos de obsolescência e renovação urbana dos bairros mais valorizados das cidades, que me ocorre chamar de obsolescência não-catastrófica’, ou relativa, de uma edificação por oposição às situações em que as receitas de aluguel das antigas moradias e comércios não cobrem o custos de manutenção do conjunto.

Em Icaraí, Niterói, como em Botafogo e Tijuca e tantos outros  bairros do Rio de Janeiro, inúmeras esquinas que já foram os lugares mais movimentados e valorizados do bairro, tornando-se por isso núcleos de comércio e serviços locais, conservam antigas edificações de 3 ou 4 pavimentos e uso misto encravadas entre novos condomínios residenciais de 10-15 pavimentos pelo simples fato de não ser economicamente viável demoli-los para renovação. A imagem abaixo é o edifício na esquina das Ruas 5 de Julho e Santa Rosa, no bairro Jardim Icaraí, Niterói.


Curioso é a matéria dizer que os preços dos terrenos em Ipanema são "exorbitantes", mas não os principescos 4o mil reais por metro quadrado de área privativa que os demandantes estariam dispostos a pagar na aquisição dos novos apartamentos. 

Como se 'uma coisa fosse uma coisa e outra coisa outra coisa'.

A propósito, vale citar uma passagem do livro Economía Urbana y Plusvalía del Suelo, do economista e avaliador colombiano Oscar Borrero:

(..) el precio del suelo urbano es un residuo del negocio de la construcción. El suelo no tiene un valor autónomo. Es un VALOR RESIDUAL del negocio. Los avaluadores aplican un método que denominam TÉCNICA RESIDUAL para obtener el posible valor de un lote urbano a partir de lo que allí se permite desarrollar, su precio de venta y los costes de construcción incluyendo la utilidad del promotor.* (Destaques do autor)

2024-10-26
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* BORRERO OCHOA Oscar, Economía Urbana y Plusvalía del Suelo. Bogotá, Bhandar Editores Ltda., 2018, p. 98 

domingo, 12 de novembro de 2023

Os dois lados da moeda


The Guardian 01-11-2023
https://www.theguardian.com/uk-news/2023/nov/01/london-financial-district-to-receive-11-extra-towers-by-2030


Cara
"(..) A concentração do crescimento urbano nas grandes metrópoles nacionais não é uma opção cultural, mas uma imposição da competição econômica global - que continuará tão ou mais encarniçada do que antes. (..) Os grandes proprietários de escritórios e terrenos em localizações centrais hipervalorizadas (CBDs) não se renderão, portanto, tão facilmente. E eles podem esperar. Se a recuperação econômica acontecer, ainda que lentamente, os escritórios acabarão sendo ocupados mesmo que parte dos trabalhadores permaneçam em home-office – que, aliás, tende a ser apenas parcial. Pode haver um período relativamente longo de altas taxas de vacância e alguma baixa de preços e alugueis. Mas a conversão desses edifícios para habitação pela via do mercado é muito cara para tornar-se lucrativa e a opção de produzir moradia nova nessas localizações só atende a uma parcela bastante específica e relativamente restrita da demanda. (..) O que me parece provável (..) é que toda essa crise, que traz consigo o aumento da pobreza e da insegurança laboral, esteja acelerando processos de deterioração e abandono progressivo de edifícios comerciais situados em localizações "sub-prime" dos grandes centros. E nesse caso, como sabemos, ou as prefeituras intervêm a tempo para transformá-los em habitação decente necessariamente subsidiada ou eles acabarão sendo ocupados como habitação precária." *


Coroa
Pelo andar da carruagem**, são 11 torres comerciais adicionais a serem retrofitadas, digamos em 2040, para o uso residencial ou misto a preços de mercado, com generosos subsídios públicos.

2023-11-12

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* “15 minutos de prudência”, À beira do urbanismo 18-05-2021

** “Biden administration pushing cities to convert empty offices into housing”, Business Report (Associated Press) 27-10-2023
https://www.businessreport.com/realestate/biden-administration-pushing-cities-to-convert-empty-offices-into-housing

quarta-feira, 9 de agosto de 2023

Trabalho de Sísifo

The “Big Dig” was the largest, and most expensive, highway project of its kind in the United States. It included 7.8 miles of highway (161 lane-miles in all), about half of which tunnel under the city and its harbor. (..) The project was the result of more than 30 years of planning and 12 years of construction. (..) Its initial estimated cost was $2.56 billion. Estimates increased to $7.74 billion in 1992, to $10.4 billion in 1994, and, finally, $14.8 billion in 2007—more than five times the original estimate. The reported reasons for the cost escalation included inflation, the failure to assess unknown subsurface conditions, environmental and mitigation costs, and expanded scope. (..)

O maior feito do urbanismo dos anos 1990/2000 foi desconstruir o suporte material da expansão urbana dos 50 anos anteriores - para revalorizar as áreas centrais! 

Pois não se passaram nem 25 e já tememos que as novas áreas centrais estejam entrando em um novo ciclo de declínio causado pela mudança dos paradigmas da economia urbana.

A exemplo de Nova York, poderemos ver imobiliárias de Boston, que gastou 22 bilhões de dólares (atualizados) para construir o Big Dig e revitalizar o Centro, sugerindo subsídios públicos para converter endereços comerciais em edifícios residenciais. 

Talvez nem precisemos ir tão longe: o Rio de Janeiro já está subsidiando a construção e o retrofit habitacionais no Centro da cidade em troca de m2 de construção adicional na Zona Sul - um método mais de acordo com as nossas tradições.

As grandes metrópoles, asseguram-nos as agências internacionais de desenvolvimento, respondem pela criação da imensa maior parte da riqueza planetária. O problema é que essa riqueza, que se concentra a níveis nunca vistos, cresce junto com deseconomias megalopolitanas nunca contabilizadas, mas invariavelmente alocadas na rubrica dos custos públicos.

Mais do que um novo paradigma, precisamos é de mudar de fase.

2023-08-09

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Síndrome de Detroit


Bloomberg 12-02-2023
https://www.bloomberg.com/graphics/2023-manhattan-work-from-home

Montagem: Àbeiradourbanismo
No auge da epidemia de Covid-19, uma enxurrada de artigos vaticinou, para bem e para mal, uma inflexão no processo de crescimento e adensamento das grandes metrópoles. De minha parte, achei precipitada tal previsão, com base em juízos regularmente emitidos pelas agências de desenvolvimento econômico sobre o papel insubstituível das grandes concentrações urbanas na criação da riqueza planetária.

Este é o segundo artigo com que me deparo em poucos dias [1] anunciando o retorno dos trabalhadores aos escritórios centrais – sem falar do fenômeno, também regularmente registrado neste blog, da persistente proliferação de microapartamentos nos grandes centros urbanos e suas imediações.

É fato, no entanto, que o aumento significativo do trabalho “híbrido” gerado, ou talvez mais exatamente, acelerado pela pandemia se soma ao processo, já em curso há algum tempo, de obsolescência econômico-tecnológica de uma parte considerável do estoque de imóveis comerciais urbanos, pondo em movimento uma cadeia de distúrbios urbanísticos a que costumamos nos referir como perda de “vitalidade” urbana, mas que são também distúrbios econômicos, com sérias implicações para as cadeias de negócios centrais e as finanças e serviços públicos municipais. “A cidade está num momento muito difícil, e pode levar a uma decadência da vida urbana”, alertou Nabil Bonduki numa entrevista concedida à Veja S Paulo em junho do ano passado.[2]

O exemplo mais emblemático de crise urbana legada pelas mudanças de paradigma nas grandes cadeias produtivas é, quero crer, o de Detroit, oportunamente citado por Bonduki em sua entrevista. Não ouso sugerir que as grandes metrópoles do século XXI passarão por crises semelhantes, mas penso que o caso merece ser estudado... com lupa! Salta aos olhos a contradição entre a durabilidade e a rigidez do capital cristalizado em edificações e infraestruturas urbanas e a fugacidade das relações espaciais envolvidas nos processos informatizados de produção, distribuição e consumo de bens e serviços. Significa que, mantidas as bases atuais do desenvolvimento econômico, uma parcela crescente do parque edificado comercial das grandes cidades se tornará, cada vez mais rapidamente, obsoleta.

Retornando à pandemia, ela é uma conveniente cortina de fumaça usada, muitas vezes, para obscurecer o papel da competição econômica “normal” na geração das vastas deseconomias urbanas de nosso tempo.

Matérias como esta não falam de uma catástrofe iminente, mas refletem as preocupações dos urbanistas com a vitalidade dos centros urbanos e, com toda certeza, as apreensões dos proprietários de imóveis comerciais com a saúde de seu capital. Não surpreende que, num artigo aqui compartilhado há poucos dias, o construtor entrevistado tenha respondido à pergunta do título - "O que é preciso para transformar mais escritórios em habitação?" - com uma sugestão que lhe soa perfeitamente natural: subsídio público. Simples não?

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[1] "Junto com a reabertura da economia, a valorização das áreas mais centrais das cidades também volta a acontecer. Se durante a pandemia a busca era por espaços maiores, saindo das capitais, em 2022 o movimento é inverso. Muitas pessoas voltam a querer morar em regiões que têm acessibilidade maior a serviços, polos de emprego, centros de ensino, e com isso, há a valorização do aluguel", explica Oike. (..)”. “O que explica alta do aluguel residencial acima da inflação e o que esperar em 2023”.BBC News Brasil 04-02-2023, por Giulia Granchi. https://www.bbc.com/portuguese/brasil-64455893

[2] “Corremos um sério risco de esvaziar a vida urbana”, avalia Nabil Bonduki”. Veja São Paulo 23-06-2022, por Clayton Freitas. https://vejasp.abril.com.br/cidades/corremos-um-serio-risco-de-esvaziar-a-vida-urbana-avalia-nabil-bonduki/

[3] “What would it take to turn more offices into housing”? NY Times 27-12-2022, por Emma Goldberg. https://www.nytimes.com/2022/12/27/business/what-would-it-take-to-turn-more-offices-into-housing.html

2023-02-15