Mostrando postagens com marcador expansão urbana. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador expansão urbana. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 15 de março de 2023

Apontamentos: HURD 1903 - crescimento urbano axial e central

Última edição em 02-05-2023

"Crescimento axial e central: excertos". Extraído de HURD R M, Principles of City Land Values, New York: Record and Guide 1903
https://docs.google.com/document/d/15g10RjkDmqBxl9onF5OPYvHBRrmGiE1A6McoKzBeSeE/edit?usp=sharing


Montagem: Àbeiradourbanismo
O que aqui apresento aos leitores é uma compilação de seções e passagens de Richard Hurd (Principles of City Land Values, 1903) sobre sua concepção de “crescimento urbano axial e central”.

Para além da imensa riqueza de observações históricas, geográficas, urbanísticas e até arquitetônicas que este profundo estudioso do parque imobiliário das grandes cidades estadunidenses de inícios do século XX tem a oferecer, e que justifica por si só a leitura atenta do material aqui reunido, o postulado de que o crescimento das cidades se dá necessariamente sob aquelas duas formas combinadas é, provavelmente, a mais instigante e profícua contribuição de Hurd ao estudo da organização espacial urbana.

Vejo-o como uma promissora pista para avançar no entendimento da relação entre “centro” e “periferia”, ou da estrutura tendencialmente radioconcêntrica da cidade moderna e contemporânea, cronicamente obscurecida pela noção intuitiva e geralmente aceita de que a cidade se expande a partir de um centro axiomaticamente estabelecido. 

Em sua obra magna de 1998 Espaço Intra-Urbano no Brasil [1] (Cap. 10, Os centros principais), Villlaça observou a impossibilidade lógica e histórica de um centro que pré-existe à sua própria periferia, e vice-versa, contradição que se apresenta já em 1925 na descrição feita por Burgess daquele que veio a ser conhecido como “o modelo de estrutura urbana em círculos concêntricos”:

Esta figura é uma representação ideal da tendência que tem toda cidade de se expandir radialmente a partir de seu distrito central de negócios – no esquema, ‘The Loop’ (I). [2] 

O problema reaparece, na década de 1960, no modelo alonso-thuneniano da economia espacial, tal como apontado pelo professor Correia da Silva, da Universidade do Porto, num trabalho de doutoramento do ano de 2004 intitulado “Space in Economics — A Historical Perspective”:

A relevância contemporânea do modelo de Von Thunen reside na sua adaptação à economia urbana, que permitiu o estudo da renda urbana e suburbana e da localização das famílias e atividades econômicas nas cidades. (..) A característica fundamental da economia urbana refletida no modelo é a necessidade que têm as famílias de ir ao centro para trabalhar usando um sistema radial de transportes. (..) Um defeito [fault] dessa abordagem é pressupor [it assumes] algo que está por ser explicado [we want to explain]: a existência do centro comercial urbano [urban central market].[3]

Com uma redundância que talvez não seja casual, Batty assim expressa, em recente artigo aqui divulgado sobre as cidades lineares, a fórmula geral de Burgess nos termos da economia espacial alonso-thuneniana:

“As cidades tendem a crescer ao redor de algum centro, em zonas concêntricas de uso do solo ordenadas de acordo com sua capacidade de pagar aluguel [ofertar renda], ligadas ao núcleo por meio de rotas radiais bem definidas que convergem para o centro”.[4]

Em contraste, e ainda que não se pretenda uma teoria da configuração radial-concêntrica da cidade moderna, o crescimento urbano simultaneamente “axial” e “central” a partir do ponto de origem postulado e descrito por Hurd em 1903 estabelece uma clara relação de reciprocidade e interdependência espacial, não valorada por ele em termos monetários mas inegavelmente econômica, entre o comércio de varejo e os residentes urbanos que dele dependem para se prover de bens e serviços. Trata-se, para os varejistas, antes de mais nada, de se agrupar no “lugar que mais convém aos clientes” para "assegurar-lhes que não deixarão de encontrar aquilo de que precisam".

O ponto de vista das firmas de varejo, neste caso, aponta para o que veio mais tarde a ser batizado na teoria econômica como “economia de aglomeração”, porém com um conteúdo distinto. Não se trata de externalidades positivas da concentração geográfica para as firmas individualmente consideradas, mas de benefícios coletivos diretos para o comércio de varejo agrupado no lugar mais conveniente ao conjunto das famílias do assentamento urbano: "os lojistas não se aglomeram para transacionar uns com os outros, mas para poupar aos seus potenciais fregueses os inconvenientes [custos diretos e indiretos] de buscar o que precisam em lojas dispersas pela cidade. O fato de uma loja atrair o freguês e outra fazer a venda tende a ser compensado, no longo prazo, pelo intercâmbio de fregueses”.

Significa que as famílias precisam residir o mais próximo possível do comércio tanto quanto as firmas precisam se estabelecer à menor distância agregada possível das famílias.

O assentamento dos residentes ao longo dos eixos radiais e suas adjacências, sempre o mais próximo possível do centro da rede, e a aglomeração dos varejistas no assentamento original e segmentos radiais contíguos aparecem, portanto, como manifestações economicamente interrelacionadas do mesmo fenômeno quintessencialmente urbano da aglomeração em geral. Toda a cidade é aglomeração.

Vale recuperar aqui a noção hurdiana de “crescimento urbano simultaneamente axial e central, em todas as direções a partir do ponto de origemnão do centro da cidade, que ainda está por se formar. A formação do centro urbano como desdobramento histórico do assentamento resulta de um processo de “contínua especialização nos negócios e diferenciação nas classes sociais”, que começa com “a separação de comércio e residência”, originalmente unidos em edificações de altos e baixos agrupadas junto aos elementos primordiais: embarcadouros, encruzilhadas, travessias fluviais etc. Ao passo que “mesmo nos menores povoados é vantajoso para as poucas lojas existentes estar aglomeradas”, as novas residências buscam a periferia imediata do assentamento, "onde os preços do solo são mais baixos", porém à menor distância possível dos comércios “para que os lojistas possam se deslocar a pé até o trabalho”. "Com o crescimento da cidade, a tendência é a concentração dos negócios no núcleo comercial e a dispersão periférica das residências ao longo dos eixos radiais. Toda expansão periférica será acompanhada de uma correspondente adaptação do centro de negócios."

Esses fragmentos reunidos compõem uma razoável descrição de como se dá o processo de especialização espacial pelo qual as residências formam a(s) periferia(s) urbanas e os negócios o centro e os subcentros. 

Aqueles dois tipos interrelacionados de economia de aglomeração poderiam, consequentemente, ser ditos primários, de natureza 100% social, explicativos da configuração geral e da dinâmica expansiva das cidades modernas, ao passo que as economias de aglomeração descritas e estudadas no âmbito da economia neoclássica, como os benefícios privados do agrupamento de fábricas em distritos especializados, do varejo em shopping centers e dos bancos no centro financeiro, seriam formas específicas que poderíamos considerar secundárias, ou derivadas. A metrópole capitalista não surgiu da fábrica, do shopping center, nem da Bolsa: tipicamente, ela expandiu e reconstruiu, de acordo com suas necessidades, a própria "cidade moderna", definida por Park como sendo, antes de tudo, um “lugar de trocas, que nasceu e cresceu ao redor do mercado”. [5]

A propósito, cabe registrar aqui a forma como Borrero Ochoa (2018), com base em Camagni, descreve a relação entre o "princípio da aglomeração" e o desenvolvimento das cidades: 

“O princípio da aglomeração nasce nas aldeias rurais e povoados que vivem dos camponeses ou agricultores da região. (..) aos domingos, dia de descanso, o comércio e praças de mercado desses povoados se abrem para que os habitantes rurais venham comprar alimentos, insumos agrícolas e buscar serviços de saúde ou mecânica automotriz. (..) Assim se desenvolve uma cidade a partir de um pequeno povoado dotado de certa dinâmica econômica. [6]

A hipótese de uma relação quantitativa, vale dizer monetária, entre aqueles dois tipos interdependentes de economias de aglomeração teria, naturalmente, de levar em conta a parte dos rendimentos das famílias e do lucro das firmas de varejo que a propriedade da terra reclama como renda de aluguel, aquela tanto maior quanto menor a distância ao núcleo varejista, portanto inversamente proporcional ao custo de deslocamento, e esta tanto maior quanto menor a distância agregada ao conjunto das famílias residentes, vale dizer mais próximo do centro geométrico da rede. Não tenho a pretensão de desenvolvê-la. Basta-me aqui referir que a redução do poder de consumo dos residentes por aumento de distância ao centro comercial, e consequente gasto de transporte, além de imediatamente dedutível dos efeitos de curto prazo das políticas contemporâneas de “tarifa zero” nos transportes urbanos, é uma restrição logicamente inquestionável da teoria dos lugares centrais de Christaller (1933):

"Assim, um consumidor que tenha de se deslocar a um lugar central para adquirir um bem terá menos dinheiro disponível do que um que viva no próprio lugar central, porque tem de pagar o custo do transporte. Ficará, assim, sujeito a comprar menos. Este efeito de fricção da distancia, causado pelo custo do transporte (pressuposto 1) provoca o decréscimo da procura com a distância ao lugar central." [7]

O postulado hurdiano do “crescimento urbano em todas as direções, simultaneamente axial e central”, parece reforçar a hipótese, avançada em artigo já publicado neste blog, [8] de que a estrutura da grande cidade moderna é um arranjo sócio-espacial derivado da disputa incessante entre consumidores e fornecedores por vantagens individuais de localização, sim, de tal maneira, porém, que à economia coletiva do “crescimento residencial axial regulado pelo princípio da [máxima] acessibilidade”, que traduzo como mínimo custo generalizado de deslocamento ao(s) aglomerados(s) comercial(is), corresponde, descontado o montante pago em aluguéis, o benefício coletivo do “crescimento central dos negócios regulado pelo princípio da [máxima] contiguidade [proximity]", que se traduz em menor distância agregada ao conjunto das famílias.

Das vantagens recíprocas, indicadas por Hurd, da localização relativa das famílias e firmas na cidade em expansão, vale dizer do crescimento urbano simultaneamente “axial” e “central”, podemos derivar a hipótese de que a configuração tendencialmente radial-concêntrica das cidades modernas resulta de um princípio de economia de aglomeração generalizado e socialmente construído, algo como o yin-yang da cidade capitalista, em que o “crescimento axial” é a forma de aglomeração própria dos residentes, que minimiza os custos coletivos de deslocamento, e o “crescimento central” a forma de aglomeração própria das firmas, que converte a economia coletiva das famílias em lucros comerciais (e industriais), primeiro sob a forma elementar da maximização das vendas de varejo e, logo, sob a forma complexa da maximização da mão de obra disponível ao mínimo custo de transportes, vale dizer do barateamento relativo da força de trabalho.

fundamento da configuração tendencialmente radio-concêntrica da cidade capitalista madura não é, portanto, a renda do solo, mas o próprio processo de produção-distribuição-consumo de bens e serviços. As famílias se aglomeram o mais próximo possível dos fornecedores e empregadores, e estes o mais próximo possível do conjunto das famílias, para obter o maior benefício, respectivamente, de seu trabalho e de seu capital - sujeitando-se, por conseguinte, a pagar mais aluguel. Espécie de imposto privado sobre o privilégio de ocupar as localizações urbanas mais centrais e proveitosas, a renda, ou preço, da terra urbana opera, como eficazmente demonstrado pelo modelo alonso-thuneniano da distribuição dos distintos usos, como dispositivo de medição 
de sua escassez constitutiva e arbitragem do direito à ocupação

Dado que a produção de riqueza na formação social capitalista supõe, e é tanto maior quanto maior for o consumo de mercadorias, materiais e imateriais, segue-se que a aglomeração radial-periférica dos residentes urbanos ao redor da aglomeração central dos varejistas e prestadores de serviços ou, mais simplesmente, a configuração tendencialmente radioconcêntrica das cidades em expansão, é, em si mesma, um dispositivo espacial facilitador e acelerador do processo de acumulação do capital em geral, uma máquina de economia social a seu serviço, sobre a qual irá se desdobrar, diversificar e expandir - a ponto de produzir o seu contrário, vultosas deseconomias sociais - a organização espacial intrinsecamente desigual da grande metrópole contemporânea. 
____
NOTAS

[1] VILLAÇA Flavio, Espaço Intra-Urbano no Brasil. FAPESP São Paulo 2001

[2] BURGESS E W, “The Growth of the City: An Introduction to a Research Project", em PARK R E, BURGESS E W e MCKENZIE R D, The City: Suggestions for Investigation of Human Behavior in the Urban Environment, The University of Chicago Press, 1984: Chicago e Londres, p. 50.
http://shora.tabriz.ir/Uploads/83/cms/user/File/657/E_Book/Urban%20Studies/park%20burgess%20the%20city.pdf

[3] CORREIA da SILVA J (2004), "Space in Economics — A Historical Perspective".
https://www.fep.up.pt/docentes/joao/material/space.pdf

[4] BATTY M, "The Linear City: illustrating the logic of spatial equilibrium". Comput.Urban Sci. 2, 8 (2022)
https://link.springer.com/article/10.1007/s43762-022-00036-z

[5] PARK R E, “The City: Suggestions for Investigation of Human Behavior in the Urban Environment”, em  PARK R E, BURGESS E W e MCKENZIE R D, The City. The University of Chicago Press, 1984: Chicago e Londres, p.12.
http://shora.tabriz.ir/Uploads/83/cms/user/File/657/E_Book/Urban%20Studies/park%20burgess%20the%20city.pdf

[6] BORRERO OCHOA O, Economía Urbana y Plusvalia del Suelo. Bogotá: Bhandar Editores 2018, p. 65.

[7] [BRADFORD M G e KENT W A, Geografia Humana e Suas Aplicações (Tradução do Departamento de Geografia e Planeamento Regional da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Supervisão de Raquel Soeiro de Brito e Paula Bordalo Lema)

[8] JORGENSEN P, “Distância, aglomeração, centralidade: uma hipótese”. À beira do urbanismo  (blog) 08-03-2021

____
Sobre este mesmo tema, leia também neste blog: “Distância, aglomeração, centralidade: uma hipótese” (08-03-2021)

2023-03-15

quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Transição econômica: o desafio do século XXI


Metrópoles 08-12-2022, por Eduardo Fernandez Silva
https://www.metropoles.com/blog-do-noblat/artigos/a-civilizacao-e-seus-enganosos-mitos-por-eduardo-fernandez-silva

Montagem: Àbeiradourbanismo
Clique na imagem para ampliar
O crescimento incontrolável das grandes aglomerações urbanas, objeto de artigos recém divulgados neste blog, é uma das mais claras e importantes manifestações da cultura do “crescimento [econômico] infinito em um planeta finito” de que fala o autor do artigo acima. 

Estou de acordo com ele em que, para enfrentá-lo com alguma chance de sucesso, precisaremos “redirecionar toda a política econômica” em favor de uma (..) “reorientação, reorganização, redistribuição, com foco não na acumulação mas, sim, na qualidade de vida”. É o grande desafio das gerações atuais e futuras. 

O fato de tal “reorientação e reorganização” ser, de fato, “ainda pouco clara”, mostra que é urgente um esforço teórico e prático coletivo fundamentalmente baseado, por motivo que me parecem óbvios, em organizações e iniciativas não-governamentais como são os congressos nacionais e internacionais de urbanistas, e seriam, por exemplo, a criação da Associação Latinoamericana de Políticas de Solo e da Associação Internacional de Habitação Social, em defesa das quais já me manifestei neste blog e em outros fóruns.

Pela mesma razão, o Fórum Social Mundial é cada vez mais atual e necessário.

2022-12-28

quarta-feira, 20 de abril de 2022

Apontamentos: FARIA et al (orgs) 2022 - Urbanismo e Urbanização em Ribeirão Preto

Estes apontamentos são parte de um processo de estudo compartilhado. À beira do urbanismo está à disposição dos autores cujo trabalho aqui se comenta para suas considerações.

FARIA R, MIRANDA A L e RIZZATTI H (Orgs), Urbanismo e Urbanização em Ribeirão Preto - história e desenvolvimento. Editora FAU-UnB (a ser publicado)


Para além do valor intrínseco de cada contribuição individual, Urbanismo e Urbanização em Ribeirão Preto, cuja publicação está sendo anunciada para breve, há de ser um livro de grande relevância e utilidade para o estudo historicamente orientado da organização espacial urbana no Brasil.

Começo tirando o chapéu para a clarificação do título, “Urbanismo e Urbanização", objetos distintos, embora permanentemente entrelaçados, que a arraigada tradição idealista da história e da crítica urbanística reitera em confundir. Para ser ainda mais didático, eu diria “Urbanização e Urbanismo”. 

Nas palavras de FARIA,

(..) produto de um trabalho coletivo que se iniciou com a realização de um Seminário em fevereiro de 2020 no Centro Cultural Palace de Ribeirão Preto (..), com este livro nos colocamos no debate político sobre Ribeirão Preto a partir de nossos campos disciplinares. (..) Arquitetura, Urbanismo, História, Geografia, Planejamento Urbano-Regional são os lugares profissionais que estão na base estrutural de um conjunto de olhares cujas críticas trazem também um projeto-ideia de transformação dessa mesma realidade.

O livro contém nove artigos de autores diversos, organizados em três partes definidas pelas principais fases do processo urbanizatório - entendido como combinação de crescimento “espontâneo” e ação governamental. São elas:

PARTE A - Ribeirão Preto no Séculos XIX e XX: história, urbanismo e urbanização.

PARTE B - Ribeirão Preto no Séculos XX: planejamento e política urbana A COHAB-RP na produção do espaço urbano em Ribeirão Preto (SP).

PARTE C - Ribeirão Preto no Século XXI: planejamento estratégico, periferização e metropolização.

Imediatamente interessado na transição do núcleo urbano original, reconhecido como vila em 1871, para os primórdios da metrópole contemporânea, digamos até o ano de 1930, pude extrair, de uma rápida pesquisa de autores participantes do projeto, uma pequena coleção de ótimos materiais como a preciosa Tese de Doutorado de Débora ZAMBONI, 
A Territorialidade do Capital: da fazenda ao condomínio, desenhando a cidade (UFABC 2018), [1] e uma série de escritos de Adriana Capretz Borges da SILVA, pesquisadora da história dos bairros oriundos do Núcleo Colonial [Agrícola] Antônio Prado, tema de sua Dissertação de Mestrado (UFSC 2002) e do livro Campos Elíseos e Ipiranga: memórias do antigo Barracão, [2] - além de textos de autores não relacionados à publicação.

Ambas as pesquisas lançam luzes sobre a rápida conversão das pequenas propriedades rurais provenientes da colonização agrícola de fins do século XIX em loteamentos suburbanos proletários e semi-proletários da metrópole nascente, e a consequente diferenciação norte-sul que passa a caracterizar, daí em diante, a sua configuração sócio-espacial

Apesar das significativas diferenças, o processo de incorporação dos lotes do Núcleo Colonial Antônio Prado à malha (sub)urbana de Ribeirão Preto suscita de imediato o caso de Erechim - RS, cidade “planejada” nascida, em 1910, da transformação do 5o Distrito de Passo Fundo em colônia agrícola também destinada a imigrantes europeus. Um estudo comparado da história dessas duas cidades pode ser o passo seguinte à publicação, em breve neste blog, de um artigo sobre a cidade de Erechim - mais exatamente sobre a incorporação do Plano Torres Gonçalves ao processo de expansão urbana impelida pelo mercado de terras, benfeitorias e serviços.

Encerro esta nota com duas passagens de SILVA que, embora aparentemente irrelevantes, tocam num ponto que me parece crucial:

Havia três acessos do núcleo colonial para o núcleo urbano já existente, que era chamado de “cidade” (..). A Sede [área verde da figura abaixo] (..) foi concebida com a finalidade de constituir um prolongamento da “Cidade” e, por este motivo, esses lotes eram denominados “urbanos”. [3]
Embora a autora não mencione a fonte dessas informações, as aspas deixam pouca margem para dúvida: trata-se de um fragmento da nossa história urbana incrustado na linguagem. Permito-me especular que, por ocasião da criação do núcleo Antônio Prado, o “centro”, entidade geográfica distintiva da transformação das cidades mercantis-escravistas brasileiras em metrópoles, grandes e pequenas, ainda não existia para os ribeirão-pretanos; surgiria, nas décadas seguintes, do próprio processo de suburbanização a norte e oeste da "cidade" principalmente, mas também, em alguma media, a sul e leste. Vejamos se o livro nos esclarece.

____
[1] ZAMBONI D P, A territorialidade do capital: da fazenda ao condomínio, desenhando a cidade. Tese de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Planejamento e Gestão do Território da Universidade Federal do ABC. Santo André, 2018.
http://lepur.com.br/wp-content/uploads/2019/01/Debora-Prado-Zamboni_Tese_2018.pdf

[2] SILVA A C B, Campos Elíseos e Ipiranga: memórias do antigo Barracão. Ribeirão Preto SP: Editora COC 2006

[3] MANHAS A C e MANHAS M P, “Traçado urbano e funcionamento do núcleo colonial Antônio Prado em Ribeirão Preto SP 1887. I Simpósio Brasileiro de Cartografia Histórica, Paraty, Maio 2011, p. 6.
https://www.ufmg.br/rededemuseus/crch/simposio/CAPRETZ_ADRIANA_E_MANHAS_MAX_PAULO.pdf

2022-04-20

quinta-feira, 6 de maio de 2021

A expansão de Brasília: 1961-2021

Deu na BBC Brasil
S/data, por equipe de jornalismo visual da BBC News Brasil
https://www.bbc.com/portuguese/resources/idt-143f8aa4-dbeb-4f4d-86a8-eeb3b0ac7191


Brasília 60 anos: como a realidade transformou a cidade idealizada por Lúcio Costa e Niemeyer

No final da década de 50, no meio de seu Planalto Central, o Brasil construiria uma nova capital em apenas três anos. Nas décadas seguintes, Brasília se tornaria o principal símbolo da arquitetura modernista no mundo e a única cidade feita no século 20 a ser declarada Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade pela Unesco.  

Distrito Federal: mancha urbana e cidades satélites de Brasília 
Fonte: 
http://www.codeplan.df.gov.br/wp-content/uploads/2018/03/S%C3%A9rgio-Jatob%C3%A1.pdf


 “(..) "A metrópole Brasília hoje não está mais no Plano Piloto desenhado por Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, está em Taguatinga ou em Ceilândia. O plano hoje é um bairro da metrópole, na minha interpretação. Numa lógica europeia, seria um dos centros históricos da cidade, ou o bairro central", diz Sylvia Ficher.

Assim foi a expansão do Distrito Federal:

1961-2019 O 'avião' cercado

O Plano Piloto, a capital original, tem hoje pouco mais de 220 mil habitantes, cerca de 7,3% do total de Brasília, o Distrito Federal. Os outros 2,78 milhões de habitantes da capital brasileira estão distribuídos em 33 regiões administrativas, entre elas as extensões do Plano e as cidades-satélites.

1956 Os primeiros assentamentos

Os assentamentos de Candangolândia e Núcleo Bandeirante abrigavam os funcionários da construtora, operários e demais responsáveis por erguer Brasília. Mesmo despois da inauguração do Plano Piloto, eles ainda concentravam boa parte do comércio local.

1959 Brasília antes de Brasília

Considerada a primeira cidade-satélite, Taguatinga foi inaugurada antes do previsto, e dois anos antes de Brasília, para abrigar mais trabalhadores migrantes. Cruzeiro, feita logo em seguida, foi desenhada também por Lúcio Costa, para funcionários públicos que foram do Rio de Janeiro para a nova capital.

1960 Cada vez mais ‘satélites’

Com o passar do tempo, mais cidades e bairros residenciais tiveram que ser construídos para atender a demandas previstas – como a produção agrícola que abasteceria a capital, caso de Gama e Sobradinho. Houve também demandas imprevistas, como o reassentamento de moradores de favelas que se formaram em Brasília. Estas novas zonas foram feitas com graus de planejamento variados e, em geral, sem a qualidade e a quantidade de serviços do Plano Piloto.


O Plano Piloto, a capital original, tem hoje pouco mais de 220 mil habitantes, cerca de 7,3% do total de Brasília, o Distrito Federal. Os outros 2,78 milhões de habitantes da capital brasileira estão distribuídos em 33 regiões administrativas, entre elas as extensões do Plano e as cidades-satélites. (..)”

2021-05-06


quarta-feira, 28 de abril de 2021

Urbanismo no Recife: 1922-1926

Dos subúrbios coloridos aos horizontes molhados: a expansão urbana do Recife nos anos 1920

Por MOREIRA Fernando e SARAIVA Kate. URBANA / UNICAMP V.12 p.1-40 (2020)
https://periodicos.sbu.unicamp.br/.../view/8655956/23085


Nas duas últimas décadas nossa historiografia avançou enormemente no conhecimento do urbanismo moderno, os urbanistas, seus planos, suas redes e os efeitos em nossas cidades, particularmente entre 1930 e 1960, período no qual as principais capitais brasileiras sediaram ricos debates urbanísticos. A cidade passou a ser vista como um sistema no qual suas partes eram dependentes umas das outras. Era preciso conhecer os fatos urbanos e introduzir novos instrumentos, como códigos, leis e pesquisas. Uma abordagem supostamente científica começou a dominar o planejamento. Preocupações com eficiência, zoneamento e soluções de tráfego foram introduzidas no urbanismo, a maioria delas do ponto de vista da engenharia. Essas ideias embasaram a transformação das áreas centrais nos anos 1930 e 1940.
Entretanto, pouca atenção tem sido dada aos processos de expansão das cidades das décadas de 1920 e 1930 feitos por profissionais ainda não totalmente identificados como urbanistas, mas influenciados de alguma forma por diretrizes do urbanismo moderno. (..)
O presente texto pretende contribuir para este debate por meio da análise das intervenções urbanas realizadas na cidade de Recife, durante o período 1922-1926. Essas intervenções, quando o Estado de Pernambuco estava sob o governo de Sérgio Loreto foram realizadas com a intenção de dirigir o crescimento para os subúrbios, como a urbanização de Campina do Derby, novo parque e bairro baseado nos princípios das cidades jardins; a construção da avenida Boa Viagem, uma avenida costeira de cerca de cinco quilômetros; além de uma série de intervenções pontuais de modernização, drenagem e esgotamento sanitário, retificação e pavimentação de antigos largos e praças em áreas suburbanas. Esses trabalhos de expansão urbana proporcionaram uma nova estrutura para essas áreas contribuindo para construção do Recife moderno que conhecemos hoje. (Continua)

Acesse o artigo completo pelo link

https://periodicos.sbu.unicamp.br/.../view/8655956/23085

2021-05-24


segunda-feira, 15 de outubro de 2018

Madri 1860: o planejado e o espontâneo

La Urbanización Marginal del Extrarradio de Madrid: Una Respuesta Espontánea al Problema de la Vivienda. El Caso de La Prosperidad (1860-1930)


Por VORMS Charlotte*.  Scripta Nova - Revista Electrónica De Geografía Y Ciencias Sociales, Universidad de Barcelona, Vol. VII, n. 146 (013), 01-08-2003.
http://www.ub.edu/geocrit/sn/sn-146(013).htm
 

Imagem: Internet, editado PJ
“En 1860, conforme con las reflexiones urbanísticas de la época, se decide adecuar la ciudad de Madrid a su población creciente, ensanchándola. Así se adopta el plan de ensanche del ingeniero Carlos María de Castro. Éste prevee la preparación de suelo edificable a cargo del municipio. No obstante, la violenta inflación de precios que provoca el proyecto y las estrictas normas de edificación conllevan un fuerte desajuste entre las características de las viviendas edificables en el ensanche y la solvencia de la demanda. En consecuencia, la edificación del ensanche es lenta y las viviendas populares se construyen fuera de él. Así aparecen las primeras parcelaciones de tierras rurales en el extrarradio, zona comprendida entre el límite exterior del ensanche y el límite del termino municipal de Madrid, el año que sigue a la adopción del plan Castro. A partir de 1860 y hasta mediados del siglo XX, Madrid crece en dos frentes, uno oficial y planificado, el ensanche y el otro, informal y espontáneo, el extrarradio. (..)”

__
*Université d'Aix-Marseille I

2018-10-15