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terça-feira, 16 de abril de 2019

New Brazil Realty


Deu no UOL Notícias
15-04-2019, por Marcio Dolzan /Estadão Conteúdo
Apartamentos irregulares na Muzema custam entre R$ 60 mil e R$ 200 mil
Foto: Marcos Serra Lima/G1 
Prédios erguidos em tempo recorde junto a encostas, imóveis ocupados ainda em obras e precária infraestrutura são a regra no condomínio Figueiras do Itanhangá, na Muzema, zona oeste do Rio, onde na sexta-feira dois edifícios ruíram, matando pelo menos 11 pessoas. O baixo custo dos imóveis em comparação à média no mercado imobiliário e a falsa segurança prometida por milicianos que dominam a região acabam levando pessoas de baixa renda a adquirirem apartamentos no condomínio, que não tem autorização da Prefeitura do Rio.
Os moradores mais antigos dizem que, há menos de 20 anos, apenas casas com até dois andares eram permitidas no local. Hoje, elas são poucas em meio a dezenas de prédios erguidos em poucos meses, a maioria com o mesmo padrão - entre seis e sete andares, com quatro apartamentos por andar. Os apartamentos de dois quartos, com cerca de 50 metros quadrados, são vendidos em média por R$ 60 mil. As condições de compra são convidativas: entrada de R$ 15 mil e o restante financiado em parcelas mensais de R$ 1.000, sem juros.
Foto: Renee Rocha / Agência O Globo
Os imóveis maiores, na cobertura dos edifícios, chegam a custar R$ 200 mil - e, também podem ser financiados sem juros. Os prédios são construídos em questão de meses, a maioria sem nenhum tipo de laudo técnico. O novo morador recebe o imóvel pronto apenas do lado de fora. "Cada um é responsável por fazer a parte elétrica e hidráulica dentro de casa", contou à reportagem um comprador, que pediu para não ser identificado. (Continua)

2019-04-16

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Precariápolis em foco

Deu n’O Globo online
11-02-2017, por Luiz Fernando Janot 


O crescimento vertical das favelas
Foto: Custódio Coimbra /
O Globo 06-11-2016
(..) Agora, um novo desafio se apresenta para os governos municipais. Uma medida provisória editada recentemente pelo governo federal, facilitando a emissão de títulos de propriedade em habitações de interesse social construídas em terrenos informalmente ocupados ou — pasmem — em lajes nos pavimentos superiores das moradias existentes, representará, sem dúvida, um estímulo a mais para verticalização edilícia nessas comunidades. Certamente, a especulação imobiliária informal agradecerá penhorada essa iniciativa.
Tal decreto não faz qualquer referência às condições de estabilidade das edificações e aos aspectos geomorfológicos do terreno. Muito menos às precárias condições ambientais nas comunidades onde o esgoto circula in natura em valas negras ou em canais que deságuam nos rios, nas lagoas, nas baías e no mar. Não basta legalizar a habitação. É preciso que a cidade chegue a essas populações.
Ao que parece, o legislador tem o seu olhar voltado exclusivamente para as soluções de curto prazo, pouco se importando com os interesses futuros da sociedade e da própria cidade.”
Luiz Fernando Janot, arquiteto e urbanista



Acesse a íntegra do artigo pelo link


Foto: Custódio Coimbra / O Globo/06-11-201

2017-03-30


quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Indenizações e aquisições de benfeitorias por necessidade de obras públicas em áreas informais do Rio de Janeiro: análise das metodologias de cálculo

por Antônio Augusto Veríssimo
Arquiteto Urbanista, Mestre em Planejamento Urbano e Regional

Foto Fabio Costa
Uma das tarefas mais delicadas para quem lida com projeto e gestão de intervenção urbana em áreas informais é a de tomar decisões com relação à relocação de moradores e comerciantes em função da necessidade da desocupação de áreas para a execução de obras públicas. 
A prefeitura do Rio de Janeiro, desde o ano de 2001, vem editando decretos para disciplinar a atividade de avaliação de imóveis para a determinação dos valores pertinentes à indenização das edificações a serem demolidas ou à aquisição, no mercado, de unidades prontas para a sua substituição. 
O objetivo deste texto foi examinar as diretrizes e os métodos de cálculo estabelecidos por cada um dos decretos para verificar se conduziam a valores que efetivamente atendessem as expectativas e necessidades dos moradores atingidos. 
Ao final do trabalho concluímos que, em 2013, houve uma autêntica mudança de paradigma no método de cálculo. Pela primeira vez, a Administração municipal admitiu a incorporação do valor do solo ao cálculo das indenizações e aquisições de unidades.

Acesse o artigo pelo link 
https://drive.google.com/file/d/0B2g7hqWHFxtsbHprSTE3TWtMVUE/view?usp=sharing


2017-01-26


quinta-feira, 19 de março de 2015

O impacto da intervenção de urbanização e regularização do PAC no mercado imobiliário do Morro do Preventório - Niterói (extrato)

Por Antônio Augusto Veríssimo, Pedro Jorgensen Jr, Luís Fernando Valverde Salandia e Rubens Alves Dantas

Relatório de Pesquisa financiada pelo Lincoln Institute of Land Policy – LILP, 2009

Acesse pelo link
https://drive.google.com/file/d/0B2g7hqWHFxtsMlN6NmV3cjV5NEk/edit?usp=sharing

 (…)
7.1 - Análise de preços 

Como explicar (1) que os preços unitários dos bens imobiliários do Cavalão sejam historicamente mais baixos que os do Preventório e (2) que experimentem uma alta mais importante no período abrangido pela base de dados?
A consolidação da comunidade do Cavalão está associada ao boom de ocupação/verticalização de Icaraí nos anos 1950-1980. Assim como nas áreas formais, a ocupação das favelas se dá em ciclos de expansão, consolidação e decadência. O processo de levantamento dos dados já havia sugerido que o mercado do Cavalão é muito menos dinâmico que o do Preventório: menos transações, menos aluguéis, menos construções, menos verticalização.
O Cavalão tem um estigma de criminalidade solidamente arraigado junto à classe média que habita o seu entorno. Tome-se como exemplo a variação dos preços do mercado formal vizinho em função da distância a um ponto central da comunidade, medida durante a pesquisa. A regressão dos preços coletados de imóveis nesses bairros demonstrou que o preço por m² do imóvel formal cai 0.55% para cada metro linear que se aproxima do ponto de referência da comunidade (praça central), percentual bem superior, como se verá a adiante, ao do morro do Preventório.
Além disso, a oferta de novas moradias no Cavalão encontra-se restringida por um Termo de Ajuste e Conduta – TAC iniciado em 2006 e assinado em 2007, envolvendo o executivo municipal e a Associação de Moradores, resultado de um inquérito instaurado contra a Prefeitura Municipal por não coibir a expansão da comunidade e não dota-la de infraestrura. A instalação de um GEPAE28 na comunidade a partir de 2000, foi um fator importante na implementação do TAC.
O Preventório é uma comunidade de origem quase tão antiga quanto o Cavalão, mas de consolidação muito mais recente, associada ao boom de verticalização do bairro de Charitas (Lei 1967 de 2002); ao início de operação dos aerobarcos para o Rio de Janeiro (2004); à consolidação do conjunto São Francisco-Charitas como pólo de entretenimento (praia, calçadão, bares, restaurantes); e, finalmente, à perspectiva de construção do túnel Piratininga-Charitas, que tende a reforçar os mercados de serviços na região. 
O Preventório não tem estigma de criminalidade. Ao contrário, sua fama é de comunidade sem tráfico de drogas29,ainda muito marcada por sua relação original com a colônia de pescadores local. A visão mais positiva dos bairros vizinhos em relação ao Preventório se reflete na variação dos preços do mercado formal do entorno em função da distância a um ponto central da mesma, medido durante a pesquisa. A regressão dos preços dos bairros formais no entorno do Preventório registrou que o preço por m² do imóvel formal cai 0.05% para cada metro linear que se aproxima do ponto de referência da comunidade (ponto de ônibus junto ao acesso principal da favela), bem inferior aos 0,55% verificados no Cavalão. No Preventório, inexistem restrições e controles à expansão horizontal e vertical: é um mercado informal inteiramente “livre” até, pelo menos, o início das obras do PAC e, aparentemente, mesmo após o início das obras.
O exame da variação dos preços nas comunidades estudadas em função da distância do imóvel a pontos de amenidades e serviços mostra que, no  morro do Preventório, o preço/m² aumenta 0,01% para cada metro linear que se aproxima do ponto 01 (ponto de ônibus próximo à rua Dr. Leitão) e 0.06% para cada metro linear que se aproxima do ponto 02 (ponto de ônibus próximo à rua 14 de Abril), sendo portanto um fator positivo estar localizado mais próximo aos pontos de ônibus que atendem à comunidade. No morro do Cavalão, o preço/m² cai 0,06 para cada metro linear que se aproxima da praça central da comunidade e sobe 0,02% pra cada metro linear que se aproxima do ponto de ônibus. Constata-se, portanto, que estar próximo ao ponto de ônibus é considerado uma vantagem locacional e que o mesmo não vale para a proximidade da praça central da comunidade (onde está localizado o GEPAE).
Transações pesquisadas
É razoável supor que os preços mais elevados por m2 construído encontrados no Cavalão resultem da “escassez normativa” de moradias imposta pelo TAC e reforçada pela presença do GEPAE, impelindo a demanda residual (descendentes e agregados das famílias residentes) a aumentar a oferta de renda pelas localizações das poucas unidades disponíveis. Parece também razoável supor que o boom de oferta de serviços no entorno do Preventório, combinado à “liberdade urbanística” vigente na comunidade e ao início efetivo das obras do PAC, tenha contribuído para o aumento da oferta de novas unidades, sobretudo de aluguel, responsável pela relativa estabilização (a partir de um patamar mais elevado) dos preços do m2 construído.
7.2 Aluguéis: rentabilidade e verticalização 
7.2.1 Rentabilidade 

O  tratamento estatístico realizado constatou maior rentabilidade dos aluguéis na comunidade do Cavalão (2,75%) em comparação ao Preventório (1,75%). Os valores encontrados nas áreas informais representam percentuais bem superiores aos do mercado formal. Pesquisa de preços de compra e venda e de alugueis nos bairros limítrofes às comunidades em estudo demonstraram que o valor dos alugueis residenciais nesses locais varia de 0,5% a 0,7% do preço de venda dos imóveis, podendo-se concluir que, em termos relativos, é bem mais caro morar de aluguel nas áreas informais do que nas áreas formais. A maior rentabilidade do aluguel informal explica-se pela incorporação ao preço de custos típicos do mercado formal que não incidem no informal, como condomínio, IPTU, tarifas de serviços, etc.
A maior rentabilidade dos aluguéis no Cavalão em relação ao Preventório poderia ser explicada pelo mesmo fator “escassez normativa” que sugerimos para a diferença de preços de compra-venda do m2 construído.
7.2.2 Verticalização
A verticalização acelerada sobre a base dos bens de uso previamente existentes é uma característica marcante do desenvolvimento atual das favelas no Rio de Janeiro e sua Região Metropolitana. Uma série de reportagens recentemente publicadas em O Globo registra a existência de construções irregulares de 4, 7 e até 10 pavimentos em várias favelas da cidade30, que já não respondem meramente às necessidades de aumento de renda da família ou o seu crescimento, por reprodução ou agregação, mas representam a emergência de uma verdadeira indústria de bens imobiliários à margem da regulação estatal.
Na comunidade do Cavalão predominam casas de um pavimento, ao passo que no Preventório esta proporção não chega à metade. O número de edificações com dois pavimentos no Preventório é o dobro do Cavalão; no Preventório ainda encontramos 23% de edificações com três pavimentos, situação inexistente entre os imóveis pesquisados no Cavalão, mostrando claramente a tendência de verticalização do Preventório, o que explica o gráfico abaixo, que mostra que nesta comunidade 37,8% das unidades comercializadas pesquisadas foram apartamentos. 
Gráfico 2 - Ocorrências por número de pavimentos por comunidade

A verticalização do Preventório se reflete também no gráfico abaixo, que mostra que nesta comunidade o número de apartamentos da amostragem é 4 vezes maior do que no Cavalão . Se analisarmos os números absolutos, esta proporção é de 11 vezes, confirmando os dados demográficos que apontam um crescimento maior no bairro de Charitas, em especial na comunidade do Preventório. A pressão pelo adensamento pode aumentar em função dos investimentos do PAC, que colocará a comunidade num estágio de desenvolvimento urbano superior a outras áreas de ocupação informal.
Gráfico 3 – Ocorrências por tipo de unidades por comunidade
  
7.3 Área construída, densidades e preços do solo  

Nas favelas em geral, a terra não tem um “preço de mercado”. Ao contrário do que ocorre nos assentamentos informais periféricos, no mercado imobiliário das favelas não se transacionam terrenos em quantidade suficiente para caracterizar a existência de um mercado de solo.
São duas as razões: primeiro, as favelas se caracterizam como ocupações intensivas, para autoconstrução e uso imediato. Mesmo quando a ocupação de uma área é progressiva no tempo, por se tratar de terra invadida, o mais das vezes pública, não se configura a reserva de solo em mãos privadas; segundo, o caráter precário da posse da terra constitui um sério obstáculo a que o mercado de produtos imobiliários gere um mercado derivado de terras, que tem como um de seus fundamentos a segurança jurídica a longo prazo.
O mercado de solo nas favelas permanece, portanto, latente. As transações com terrenos são excepcionais, assim como a aquisição de construções para fins de demolição e renovação, mesmo em um ambiente de verticalização acelerada.  O preço da terra na favela é um preço implícito, que corresponde ao valor de localização dos bens de uso transacionados.
Teoricamente, seria possível calcular, com base em um estudo meticuloso dos preços e atributos dos bens de uso transacionados, e com recurso ao método residual dedutivo de avaliação, os preços (implícitos) dos respectivos terrenos. Tal procedimento, no entanto, apresenta no caso da favela tantas dificuldades que se pode ser considerado tema para outra investigação, com foco nas técnicas de avaliação; foge, portanto, do propósito desta pesquisa.
Na ausência de um mercado de terras nas favelas pesquisadas que pudesse fornecer dados de preço para este tipo de mercadoria, utilizaremos um recurso indireto – o exame da densidade de ocupação do solo - para abordar o problema das diferenças de preços do solo entre as duas comunidades e sua progressão.
O exame da área construída dos imóveis pesquisados nos mostra, no Morro do Cavalão, uma maior incidência na faixa de 20 a 40m² (27,3%), com uma proporção bastante  equilibrada nas faixas de menos de 20, 40 a 60 e 60 a 80 (as três entre 16,4 e 18,2%). Chama a atenção o alto percentual de imóveis com menos de 20m² (18,2%). No Morro do Preventório, a maior incidência se dá na faixa entre 100 e 200m² (20,99%), com uma distribuição uniforme nas faixas de 20 a 40, 40 a 60, 80 a 100 e mais de 200 (variando entre 14,2% e 16,2%). O percentual de imóveis transacionados com menos de 20m² é pequeno (4,6%), quatro vezes menor do que no  Morro do Cavalão.
Os imóveis com menos de 40m² são 45,5% no Cavalão contra 18,3% no Preventório. No outro extremo, os imóveis com mais de 80m² são 20% no Cavalão contra 55,3% no Preventório. Podemos concluir que os imóveis transacionados, seja para aluguel ou para compra e venda, são maiores no Preventório do que no Cavalão.
Gráfico 4 – Ocorrências por área construída por comunidade

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A densidade construtiva nas duas comunidades foi estudada por meio do Índice de Aproveitamento do Terreno – IAT, definido pela divisão da área total construída pelo tamanho do respectivo terreno.
O gráfico abaixo mostra claramente que IATs acima de 1,0 ocorrem quase que exclusivamente no Preventório.   
Gráfico 5 – Ocorrências por índice de aproveitamento do terreno – IAT – por comunidade

O exame da progressão do IAT no tempo pelo método da regressão simples mostra que o crescimento previsto desse índice no período de estudo é de 2,53% a.a. no Cavalão contra 8,78% a.a. no Preventório, o que demonstra uma forte tendência de adensamento construtivo, consequentemente um mercado mais dinâmico, nesta comunidade. Utilizando-se o método das médias anuais fica mais explicita a intensificação do aumento de densidade no Preventório, especialmente no ano de 2008, o que poderia ser associado ao início efetivo das obras do PAC.
Associado ao preço unitário, o IAT expressa a densidade de valor, ou o rendimento econômico do m² do terreno. Com base na análise desses índices calculados para cada uma das comunidades em estudo pode-se concluir que os terrenos do Preventório têm maior densidade de valor que os do Cavalão. (Continua)
Leia o relatório completo clicando em 


2015-03-19

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Teleférico da Providência: pedagogia de resultados ou armadilha midiática?

Por Antônio Augusto Veríssimo, Arquiteto e Urbanista

Teleférico da Favela de Santo Domingo, Medellín.
Foto do autor
Em outubro de 2009 chegou ao Rio de Janeiro um grupo de professores e estudantes de um curso de pós-graduação da universidade norte americana de Colúmbia [1]. Este grupo [2] era formado por arquitetos de diversas partes do mundo e tinha por objetivo conhecer uma favela típica do Rio e para esta propor soluções arquitetônicas e urbanísticas que pudessem ser aplicadas efetivamente. A favela escolhida foi o Morro da Providência, para onde a Prefeitura do Rio de Janeiro, por meio de sua Secretaria Municipal de Habitação, já desenvolvia um projeto de urbanização a cargo de um escritório de arquitetura contratado. Outro motivo para a escolha foi o fato de a favela estar localizada na área de intervenção do Porto [3],  embora fora da operação consorciada em termos financeiros. Cabe salientar que deste grupo faziam parte também representantes [4] da empresa austríaca Doppelmayer, a maior fabricante de teleféricos do planeta.

Como era de se esperar, a “proposta urbanística” apresentada ao Secretário de Habitação em 20 de outubro de 2009 pelo grupo de professores e estudantes daquela universidade previa a implantação de um teleférico ligando a Central do Brasil à favela e desta a área portuária, junto à Cidade do Samba.

No dia 22 de outubro a proposta elaborada pelos estudantes foi publicada no Jornal O Globo (ver imagem abaixo) [5], que destacou uma simulação gráfica do teleférico planando sobre o Morro da Providência. Por esta ocasião, como já citado, estava em curso um projeto de urbanização que visava à complementação das intervenções já realizadas anteriormente pelo Programa Favela Bairro e por outra ação do município denominada “Museu Aberto da Providência". Cabe ressaltar que, em nenhuma das propostas desenvolvidas ou em desenvolvimento para o local, era aventada a hipótese de construção de um teleférico, embora a ideia de um plano inclinado interligando a Praça Américo Brun ao Largo da Capela, no interior da comunidade, já integrasse os planos da Prefeitura. 

Fonte: Jornal O Globo
A imagem publicada do teleférico ganhou a adesão imediata do Prefeito, que determinou que a implantação do teleférico fosse incorporada ao projeto de urbanização em execução para o local. Imediatamente, sob a consultoria dos representantes locais da empresa Doppelmayr, iniciaram-se os estudos técnicos para a construção do teleférico no Morro da Providência.

Não obstante a inexistência de estudo técnico que comprovasse a necessidade, viabilidade ou sustentabilidade da implantação desse equipamento, foram iniciados de forma acelerada os projetos e outras providências para sua construção, tendo sido definido o prazo limite para sua entrada em operação o mês de setembro de 2012. Para a viabilização dessa empreitada, foram realizadas reuniões com representantes da empresa austríaca que culminaram com a vinda, ao Rio de Janeiro e à Secretaria Municipal de Habitação, do seu presidente, o Sr. Michael Doppelmayr. Representantes daquela empresa passaram a assessorar o escritório responsável pelo projeto de urbanização e a equipe técnica da SMH, especialmente na elaboração dos termos de referência e orçamento para a licitação e aquisição dos equipamentos.

Cumpridas as etapas de projeto e elaboração dos demais documentos, procedeu-se à licitação das obras. Apresentou-se à licitação o Consórcio Rio Faz, formado pelas empresas Odebrecht, OAS e Carioca Engenharia, que são também as detentoras do contrato para urbanização de toda a área portuária, polígono onde está inserido o Morro da Providência. Como este consórcio foi o único concorrente a ser apresentar ao pleito, ganhou a obra pelo maior preço possível. (A obra estava orçada em R$ 119 milhões e o Consórcio a levou por R$ 131 milhões.) 

Logo após ganhar a licitação, em janeiro de 2011, o consórcio anunciou que executaria a implantação do teleférico adquirindo equipamentos fabricados pela empresa francesa POMA, a maior concorrente da austríaca Dopplemayr. O argumento utilizado pelo consórcio para essa decisão era o de que a empresa francesa já possuía uma obra executada na cidade, o teleférico do Morro do Alemão, obra sob a responsabilidade do mesmo consórcio. Outro argumento era o de que, assim como no Morro do Alemão, a empresa concessionária do transporte ferroviário, SUPERVIA, acabaria também assumindo a operação do teleférico do Morro da Providência e não se justificava ter aquela operadora que lidar com duas tecnologias e fornecedores distintos, o que oneraria a operação e manutenção do sistema. Cabe lembrar que, na ocasião, a Odebrecht, uma das integrantes do consórcio construtor das obras de urbanização do Alemão e Providência, havia também assumido o controle acionário da SUPERVIA.

Logo chegaram os consultores da POMA para assumir a orientação da elaboração dos projetos executivos do teleférico. Após já estarem praticamente definidos os projetos e especificações dos equipamentos para início da aquisição, uma nova reviravolta ocorre com a divulgação, em matéria jornalística publicada no Jornal O Dia, em 07/12/2011, da informação de que no mês de janeiro de 2012 deveriam chegar ao porto do Rio os primeiros equipamentos para a montagem do teleférico do Morro da Providência produzido - não se espantem - pela Doppelmayer. Esta notícia tomou de surpresa os técnicos da Secretaria de Habitação, do escritório de projetos e, sobretudo, os engenheiros e funcionários de campo do próprio consórcio construtor.

A construção do teleférico, assim como toda a obra de urbanização do Morro da Providência, foi objeto de muitas polêmicas e conflitos com os moradores e com o próprio consórcio construtor, o que resultou em grande atraso nas obras, tendo sido o teleférico entregue ao público somente no mês de junho de 2014.

Em função de não ter sido possível o ajuste prévio da concessão da operação do teleférico com a Supervia, coube à CEDURP, instituição administradora da Operação Urbana do Porto assumir provisoriamente a operação do equipamento, o que lhe custa, estimativamente,  cerca de R$ 12 milhões anuais. 


Teleférico: equipamento de transporte ou peça publicitária eleitoral?

Não obstante o grande impacto midiático e na paisagem das obras do teleférico, estes não parecem ser a melhor alternativa para o transporte de massa, especialmente para o atendimento de comunidades com as características das favelas do Rio de Janeiro, pois trata-se de equipamento dedicado unicamente ao transporte de pessoas, com evidentes limitações para o cumprimento de outras funções de transporte e mobilidade, tais como o transporte de mercadorias, mudanças, materiais de construção, bicicletas, pessoas com dificuldades de locomoção, lixo, etc. Neste sentido, parecem muito mais adequados equipamentos do tipo plano inclinado, tal como utilizado no morro de Santa Marta. 

Fonte: Fabio Gonçalves / Agência O DIA. 
http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2014/07/teleferico-da-
providencia-sera-interligado-ao-brt-transbrasil-rio.html

Dois estudos recentemente realizados sobre sistemas de teleféricos colocam em dúvida a adequação deste tipo de meio de transporte de massa em favelas. O primeiro, realizado pelo Prof. Werner Kraus da Universidade Federal de Santa Catarina conclui que: 
“O problema da irrelevância do teleférico para a mobilidade dos moradores é verificada na instalação mais conhecida do Brasil, qual seja, o Morro do Alemão na cidade do Rio de Janeiro. Com um volume diário em cerca de 12 mil viagens [6], representa solução de transporte para menos de 10% dos (..) moradores do local”. 
O segundo estudo, desenvolvido pelos Professores Peter Brand e Júlio Dávila, [7] da Escola de Planejamento Urbano-Regional da Faculdade de Arquitetura da Universidade Nacional da Colômbia, Sede Medellin, concluiu que, tendo em vista essas limitações, a maioria dos usuários regulares do teleférico implantado pioneiramente em favela daquela cidade são trabalhadores do mercado formal, que os utilizam basicamente em seu deslocamento de ida e retorno do trabalho (movimento pendular), continuando os demais habitantes a utilizar os meios tradicionais (micro-ônibus, motocicletas, ou caminhar) para seus afazeres diários. Concluem estes pesquisadores que os teleféricos têm mais êxito no sentido simbólico do que no uso prático, tendo em vista seu alto impacto visual e atratividade política. 

O impacto simbólico dos teleféricos, associados os interesses políticos e comerciais envolvidos, todos suportados por eficientes lobbies e intensas ações midiáticas, tem tornado quase hegemônica a ideia de que os teleféricos são uma solução eficiente para a questão do transporte e mobilidade nas favelas. Mas, salvo melhor juízo, no caso carioca ainda faltam estudos consistentes que possam comprovar esta hipótese. Por enquanto, fica a sensação de que a cidade (e por consequência o bolso do contribuinte carioca), foi pego em uma armadilha midiática suportada por uma eficaz ação pedagógica de resultados.

____________
NOTAS

[1]Columbia University
[2]O grupo era liderado pelos Professores Alfredo Brillenbourg integrante. do Urban Think Thank, e pelo austríaco Hubert Klumpner, (Adjunct Professor / Director SLUM-Lab _The Graduate School of
Architecture, Planning and Preservation.
[3]Operação Urbana do Porto Maravilha.
[4] Mag. Andreas Rudolf, Deput Sales Director, International Markets. Doppelmayr Seilbahnne GmbH e Severino Soares da Silva, Diretor da ESSE Engenharia e Consultoria.
[5]http://revista.zap.com.br/imoveis/americanos-propoem-teleferico-na-providencia/
[6] O sistema do Alemão foi projetado para 30.000  passageiros/dia.
[7]To cite this article: Peter Brand & Julio D. Dávila (2011): Mobility innovation at the urban margins, City, 15:6, 647-661; To link to this article: http://dx.doi.org/10.1080/13604813.2011.609007


2015-02-10

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Parque Olímpico e Vila Autódromo: um caso de “acumulação por múltiplos desapossamentos”


Por Antônio Augusto Veríssimo
Arquiteto Urbanista, Mestre e doutorando em Planejamento Urbano e Regional 

 
Os elementos para a produção deste artigo foram extraídos do trabalho final da disciplina “Economia e Território II”, ministrada pelo Prof. Doutor Carlos Brandão no Curso de Doutorado em Planejamento Urbano e Regional do IPPUR/UFRJ, realizado no segundo semestre do ano letivo de 2014.  



O geógrafo inglês David Harvey cunhou a expressão “acumulação por desapossamento” para designar a continuidade e a proliferação de práticas de acumulação que Karl Marx tratara como “primitivas” ou “originais” durante a ascensão do capitalismo. Harvey inclui, dentre estas práticas, a mercadificação e a privatização da terra; a expulsão pela força de populações camponesas; a conversão de várias formas de direitos de propriedade (comuns, coletivas, estatais, etc.) em direitos de propriedade exclusiva; a supressão dos direitos aos bens comuns, etc.[1] Para Harvey, o capitalismo global a partir dos anos 1970 perdeu capacidade de gerar crescimento e, por este motivo, passou a apelar com mais intensidade para formas de “acumulação por desapossamento”, utilizando práticas e mecanismos de um tipo de “redistribuição de riqueza”[2] que “redistribui recursos das pessoas comuns diretamente para as classes capitalistas”, que proliferam em ambientes político-econômicos dominados pela neoliberalização[3]. Para Harvey essas práticas apresentam quatro características principais: a privatização e mercadificação; a financialização; a administração e manipulação de crises[4] e a redistribuição via Estado, todos bem caracterizados no texto citado na Nota 3.

Este conceito apresentado por Harvey no permite desenvolver a análise de uma situação concreta em curso no Rio de Janeiro, onde parecem estar presentes práticas identificadas pelo autor como de “acumulação por desapossamento”. O caso em análise é a implantação do Parque Olímpico da Barra da Tijuca, em fase de construção em área onde anteriormente existia o autódromo da cidade do Rio de Janeiro. Trata-se da área do Parque Olímpico da denominada “Região Olímpica nº 1” (Barra) onde estarão concentrados os mais numerosos e importantes equipamentos esportivos necessários aos Jogos Olímpicos de 2016 (Figura1). 
  
Figura 1
A primeira das práticas elencadas por Harvey que podemos observar no caso em análise tem a ver com a “privatização de ativos até então públicos” que, segundo o autor, “tem sido uma marca registrada do projeto neoliberal”. Como pode ser observado no mapa fundiário exposto na Figura 2, a área onde está sendo implantado o Parque Olímpico é majoritariamente composta por terrenos de propriedade pública, seja do Governo do Estado, seja da Prefeitura do Rio de Janeiro, e consta do contrato de PPP estabelecido para a execução das obras com o Consórcio Rio Mais (Odebrecht, Andrade Gutierrez e Carvalho Hosken) que, ao final dos jogos de 2016, parte dos equipamentos construídos serão desmobilizados para que se possa liberar um total 477.900,00 metros quadrados para a construção de empreendimentos residenciais privados a serem comercializados pelo consórcio citado. Tal privatização de terras públicas se dá a título de ressarcimento pelos investimentos diretos realizados pelo Consórcio Rio Mais na execução das obras de infraestrutura e equipamentos estimados em R$ 1,35 bilhão. Feitos os cálculos, verifica-se que o valor por metro quadrado negociado foi de R$ 2.830,00/m2, muito inferior ao que poderá alcançar no mercado ao final das obras, em função do conjunto de investimentos realizados pela coletividade em função dos Jogos Olímpicos[5]. Verifica-se, portanto, no caso em tela, uma apropriação privada de terra pública em condições desvantajosas para o patrimônio publico, uma vez que as obras do Parque Olímpico poderiam estar sendo realizadas com recursos financeiros resultantes da captura das mais valias fundiárias[6] que estão sendo geradas pelo conjunto de obras de infraestrutura em realização nas regiões da Barra da Tijuca e Jacarepaguá. Tais recursos poderiam ter sido viabilizados por meio da aplicação dos instrumentos urbanísticos já previstos na legislação brasileira tais como a “contribuição de melhoria”, o “solo criado”, as CEPACs etc., sem a necessidade da privatização das citadas terras públicas.

Figura 2

A segunda prática observada está relacionada à “expulsão de população vulnerável”, no caso pescadores e outros moradores do local que se dedicavam à prestação de serviços aos frequentadores do antigo autódromo. Como pode ser observado na figura 2, a Vila Autódromo está localizada em área delimitada e declarada como Área de Especial Interesse Social (AEIS), sendo a maioria de seus moradores detentores de títulos de concessão de uso legalmente concedidos pelo Governo do Estado. Originalmente a Vila Autódromo não estava incluída nos limites do projeto do Parque Olímpico, não tendo sido prevista como área de intervenção pela proposta vencedora no concurso internacional realizado para a escolha do projeto[7]. Não obstante não haver motivos técnicos, ambientais ou de segurança que exijam a retirada dos moradores do local, a Prefeitura vem realizando ações com vistas à sua relocação. Tais medidas, de fato, visam atender à demanda do consórcio construtor, que considera a manutenção dos moradores no local “um risco” para a comercialização dos imóveis residenciais a serem construídos e comercializados após o fim dos Jogos Olímpicos. Para atender a demanda por maximização de ganhos do consórcio construtor, a Prefeitura tem utilizado dois expedientes: 

a) a oferta de imóveis residenciais construídos com recursos do Programa Minha Casa Minha Vida em terreno adquirido (com base em processo desapropriatório e pagamento realizado com recursos da prefeitura) em área relativamente próxima da Vila Autódromo. Para aumentar a atratividade do empreendimento para os moradores, houve, inclusive, o aporte de recursos extras pela Prefeitura para o acréscimo de mais um quarto em parte das unidades, e a construção de um a piscina e um tobogã;[8] 

b) a oferta de indenização pelas “benfeitorias” o que, em tese, permitiria aos moradores indenizados a aquisição de um imóvel em uma outra localidade. Ocorre que, face aos valores irrisórios oferecidos como indenização aos moradores da Vila Autódromo e também aos moradores de outros assentamentos populares da cidade atingidos por obras públicas, houve uma persistente resistência a esta alternativa, o que levou a Prefeitura a aceitar a incorporação, ao valor das indenizações, da parcela relativa ao valor de mercado do metro quadrado do solo. Tal decisão deu ensejo à publicação do Decreto n.º 38.197 de 16/12/13[9], que passou a considerar na fórmula de cálculo da indenização devida não apenas o valor da “benfeitoria”, mas também o da parcela de solo utilizado pelo morador.[10] 

Podemos considerar que se observa, em ambas os expedientes utilizados, práticas de “acumulação por desapossamento”, uma vez que, no primeiro caso, estão sendo utilizados recursos públicos, federais e municipais, para a relocação de população que não se enquadraria nos parâmetros do Programa Minha Casa Minha Vida, “desapossando”, portanto, uma demanda potencialmente enquadrável que seria mesmo superior àquela dos assentados da Vila Autódromo, tendo em vista os recursos adicionais alocados pela Prefeitura no empreendimento. 

No segundo caso, embora possa se considerar muito positivo o fato da Prefeitura passar a reconhecer o direito ao valor da terra nas indenizações, há de se considerar que, pelo menos no caso da Vila Autódromo, o dispêndio desses recursos não se dará efetivamente em benefício dos moradores, já que estes manifestaram reiteradamente o desejo de permanecer no local[11], mas no objetivo da garantia da acumulação maximizada das mais valias produzidas pelo efeito de localização para o consórcio construtor. Aqui também podem ser observados casos de “acumulação por desapossamento”, já que se “desapossa” o morador da Vila Autódromo do direito de permanecer no local de sua moradia e se “desapossam”, consequentemente, outros moradores da cidade que poderiam estar sendo beneficiados por uma melhor aplicação dos recursos públicos utilizados nos processos de indenização da Vila Autódromo. 

Por fim, temos o caso em estudo também como um exemplo claro de situação em que o Estado é empregado pelas frações hegemônicas como operador de um processo de “acumulação por desapossamento” que “desapossa” o próprio Estado e populações vulneráveis (que deveriam estar sob a sua proteção), para ampliar a acumulação e a concentração da riqueza nas mãos de setores (capital imobiliário e financeiro) já amplamente beneficiados por suas políticas e ações.

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NOTAS

[1] Ver a lista completa em HARVEY, David. O Neoliberalismo: histórico e implicações. 


[2] Que eu chamaria de “redistribuição concentradora”. 

[3] HARVEY, David. O Segredo da acumulação Primitiva. In Para entender O Capital. Livro I, Boitempo Editorial. 

[4] Sobre este tema vale conhecer o excelente trabalho realizado por Naomi Klein em “A doutrina do choque: a ascensão do capitalismo de desastre”. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2008. 

[5] Estudos feitos pelo autor deste artigo com base na planta de valores do IPTU e em avaliações periódicas realizadas pela equipe da coordenadoria do ITBI da Secretaria Municipal de Fazenda da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, demonstram que o preço por metro quadrado de terrenos em áreas valorizadas de Jacarepaguá e da Barra da Tijuca podiam alcançar, respectivamente, em 2013 os valores de R$ 13.928,57 e R$ 21.712,68. 

[6] Sobre este tema ver: “Recuperación de Plus Valias en América Latina” Martim Smolka y Fernanda Furtado (Editores). Eurelibros y Lincoln Institute of Land Police, 2001. 

[7] http://www.rio2016.com/noticias/noticias/parque-olimpico-conheca-o-projeto-vencedor-para-o-plano-geral-urbanistico 

[8] http://oglobo.globo.com/rio/o-disputado-parque-carioca-12304472?gclid=CJTMjIDc18ICFQIQ7AodhzQAZg  

[9] http://www.ademi.org.br/article.php3?id_article=56379 

[10] http://odia.ig.com.br/noticia/rio-de-janeiro/2014-12-08/prefeitura-indeniza-donos-de-imoveis-na-vila-autodromo-em-ate-r-23-milhoes.html   
[11] http://www.canalibase.org.br/premio-internacional-para-vila-autodromo-e-mare/