Urbanização capitalista no Brasil 1870-1930
Esta página reúne, sob a rubrica "Urbanização capitalista no Brasil - o nascimento das metrópoles", um conjunto de artigos já publicados em À beira do urbanismo.
Porto Alegre cidade radiocêntrica
Publicado neste blog em 09-04-2019
Washington DC Capital Beltway Clique na imagem para ampliar |
Metrô de Pequim Clique na imagem para ampliar |
As perimetrais de Porto Alegre
Construção da I perimetral. Elevado de acesso ao Túnel da Conceição. Circa 1970 Clique na imagem para ampliar |
A I perimetral é o conector dos principais pontos de acesso do centro urbano, de um lado, e, do outro, meio de acesso direto aos bairros do primeiro anel residencial pericêntrico. Seu segmento sul (Av Loureiro da Silva), no entanto, erguido em fins da década de 1970, relança sob a forma da “via-parque” o esforço iniciado ainda na década de 1930, com o prolongamento da avenida Borges de Medeiros, de construção do sistema de acesso privilegiado ao centro da cidade para as expansões urbanas de média-alta renda situadas sobre os aterros do Guaíba (Menino Deus) e seus prolongamentos (Cristal, Tristeza, Ipanema).
II Perimetral - Av Goethe |
III Perimetral - Av Carlos Gomes |
[embora a sua construção] tenha sido considerada um avanço para o trânsito da capital gaúcha, o projeto final (..) foi alvo de críticas da maneira como foi concebido, em razão do excessivo número de semáforos posicionados ao longo da avenida. A distância entre alguns deles chega a aproximadamente 100 metros ou menos, o que alegadamente dificulta o fluxo de veículos em horários de trânsito intenso.[4]
Cidade Radiocêntrica - é a denominação dada à Macrozona 1 do PDDUA e é considerada a área de expansão natural do Centro Histórico. Nela se incentiva uma "mistura" de atividades (miscigenação). Engloba o Centro até a III Perimetral, ou seja, a cidade mais consolidada.[5]
Rede viária e arranjo sócio-espacial
Porto Alegre 1772 |
Porto Alegre 1928 - Transportes públicos |
Primórdios da Porto Alegre radiocêntrica: continuidade ou ruptura?
Porto Alegre 1928 - Linhas de bonde |
Fortemente marcada pelos principais condicionantes geográficos, a organização espacial do núcleo colonial porto-alegrense pode ser simplificadamente descrita em dois setores: a "frente fluvial", ao norte, é o setor dinâmico - portuário, comercial, governamental -, estendido entre o porto e a cumeeira do promontório (Crista da Matriz) onde se seguem a Rua Formosa, a Rua da Igreja e o Caminho da Aldeia dos Anjos; e a "retaguarda urbano-rural", que desce a encosta rumo à margem sul do promontório e às terras baixas da várzea do Dilúvio.
Não se trata de que inexistam tendências radiocêntricas na cidade colonial, isto é, de que sua organização sócio-espacial não manifeste a lei do menor custo-distância, mas de que aqui ela é uma força débil relativamente a outros determinantes [p. ex. a pré-existência de um traçado fundacional, a pequena extensão dos percursos, o aproveitamento das quadras e parcelas], materializando-se via de regra como expansão linear ao longo da via principal do assentamento e, em menor medida, como reprodução mais ou menos regular da quadra padrão no sentido transversal. [5b]No período imperial predomina, ao norte, a expansão por aterros sucessivos visando a ampliação do porto e a instalação de edifícios, praças e equipamentos públicos, prolongando-se também o eixo comercial principal (Rua da Praia) pela 7 de Setembro e Voluntários da Pátria. Ao sul, a expansão e o adensamento são eminentemente residenciais e se dão, respectivamente, por incorporação de glebas limítrofes ao recinto urbanizado e por subdivisões sucessivas da propriedade motivadas por arranjo familiar, necessidade econômica ou herança.
A maior parte da área circunvizinha é ocupada por chácaras, algumas dedicadas ao abastecimento [6], outras ao retiro das famílias afluentes da capital, e por comunidades egressas da escravidão.[7] A combinação, nesse setor, de restos de propriedade senhorial, pequena propriedade agrícola e núcleos de ex-escravos assim aparece descrita na história da Cidade Baixa:
"Em meados do século XIX, “Cidade Baixa” foi a designação utilizada para toda a região situada ao sul da colina da Rua Duque de Caxias. (..) Era denominada Arraial da Baronesa, (..) alusão a uma grande extensão territorial abrangida por uma chácara de propriedade da Baronesa de Gravataí, cuja mansão localizava-se onde hoje é Fundação Pão dos Pobres. Faziam parte da área, também, propriedades semi-rurais, cuja base produtiva era a mão de-obra do escravo. Quando esse fugia de seus senhores, escondia-se nos matos que faziam parte do Arraial, sendo designado de território das “Emboscadas”. Em 1879, depois de um incêndio em sua propriedade, a Baronesa loteou e vendeu suas terras, que passaram a ser habitadas por negros libertos e famílias italianas. (..)" [8]
Outra interessante ilustração da fragmentação sócio-espacial do entorno imediato da cidade imperial, enriquecida porém com um significativo elemento de transição, é a trajetória da família Gonçalves, também conhecida como Mostardeiro. Comerciante rico de origem humilde, Gonçalves, além de chacareiro, tornou-se também um importante proprietário de terras peri-urbanas:
"Antônio José Gonçalves nasceu em Mostardas, interior do Estado, de família humilde, e tornou-se vendedor de mercadorias diversas. Chegando a Porto Alegre em 1867 com sua esposa, Laura, comprou um terreno de 64 hectares que compreendia o Moinhos de Vento e parte do Rio Branco, onde ficava na época a colônia africana. Adquiriu também terrenos semi-rurais nos atuais bairros de Petrópolis e Santa Cecília, mas instalou-se na região do atual Moinhos de Vento, onde tinha horta, criação de gado e um lago com cisnes. O local ficou conhecido como a Chácara dos Mostardeiro. Ali, a família fez fortuna e desenvolveu o comércio, tornando-se uma das mais influentes de Porto Alegre. Antônio Mostardeiro faleceu em 1893." [8a]
No ápice de sua configuração cartesiana, a expansão longitudinal do setor norte se estenderia pelo Caminho Novo (Voluntários da Pátria) na direção de Navegantes, ensejando a ocupação da vertente da colina até o Caminho da Aldeia dos Anjos (Independência), ao passo que a expansão transversal se derramaria pela encosta sul do promontório até a orla e, na direção sudeste, entre o Caminho da Azenha e o prolongamento da Rua do Arvoredo, iniciando a formação do que viria a se tornar a Cidade Baixa.
Planta de Porto Alegre de 1888. Acervo do IHGRGS Fonte: FIALHO D M, “As Plantas de Porto Alegre de 1876 e 1888”. Cartografia.org.br s/d |
"A reforma monetária empreendida nos primeiros anos da República, conhecida como Encilhamento, propiciou o surgimento de inúmeras empresas, fábricas e companhias em todo o país. No Rio Grande do Sul, os efeitos do Encilhamento se estenderam aproximadamente até 1895 (Pesavento, 1990: 76). Essa reforma dinamizou o setor financeiro em virtude das facilidades que concedeu à emissão e concessão de crédito." [10]Além da disponibilidade de mão de obra local e de capitais, de quaisquer origens, ávidos por valorização, o advento de um mercado de bens e serviços inexoravelmente atados ao lugar, isto é, não exportáveis e de retorno a longo prazo, supõe a existência de uma pequena-burguesia de rendimentos razoavelmente estáveis e em contínuo crescimento, formada por lojistas, artesãos, especialistas e agentes públicos civis e militares.
Em 1860, um quarto de século passado do fim da Guerra dos Farrapos - que durara dez anos, freara o crescimento econômico e demográfico e contivera a expansão da cidade -, Porto Alegre contava cerca de 20 mil habitantes [11]; em 1890, 53 mil; em 1920, 180 mil. A década de 1900 registrou a taxa recorde de crescimento anual, 5,9%, só rivalizada pela dos anos 1950, um ciclo expansivo potente, mas totalmente distinto, com 5,0%. [12]
Porto Alegre crescimento demográfico 1860-1920 |
"(..) diferente de outras regiões do país para onde os imigrante foram trabalhar sobretudo como assalariados e artesãos, no Sul as autoridades lhes concedem pequenas propriedades rurais, onde se estabelecem como agricultores. (..) No último quarto do século XIX, graças às chamadas colônias a atividade comercial conhece um notável fortalecimento, favorecendo o desenvolvimento de setores da indústria, cujos produtos começaram a substituir artigos importados." [15]A imigração tem particular importância na formação da nova classe média urbana porto-alegrense. De seu impulso provém um contingente expressivo de pequenos-burgueses, principalmente, mas também de trabalhadores qualificados aptos a converter excedentes de consumo em renda de terrenos periféricos e gastos de transporte.
“(..) a economia da cidade se diversificou, instalando-se restaurantes, pensões, pequenas manufaturas, alambiques e estabelecimentos comerciais diversos, com uma contribuição marcante dos imigrantes alemães, ocupados nos mais variados afazeres”. [17]Em seu estudo sobre a vida cultural das comunidades de imigrantes na Porto Alegre de fins do século XIX, mais exatamente sobre “as muitas e variadas formas de usar o tempo livre na cidade de acordo com a posição do imigrante na estrutura social”, Constantino [18] nos fornece, à margem do retrato principal da “gente pobre, representativa da condição dos estrangeiros que chegavam à cidade”, um sem-número de pistas do nascimento dessa nova classe média, deixadas por depoimentos de origem diversa.
“(..) a configuração urbana de Porto Alegre foi marcada pela dinamização do comércio, praticado pelos descendentes de imigrantes alemães que acumularam ‘um capital dinheiro passível de ser aplicado em grandes estabelecimentos comerciais de importação e exportação assim como indústrias e bancos’. Consequência disso, na virada do século ‘parte significativa da ascendente burguesia urbana local era de origem alemã e dominava inclusive o setor da construção civil, agregando engenharia e arquitetura.” [19]
A indústria dos loteamentos
“A década de 1880 foi caracterizada pelo avanço do processo de conurbação do centro histórico com os arraiais vizinhos. As áreas intermédias começavam a ser valorizadas para loteamentos, surgindo os núcleos dos futuros bairros Floresta, Bom Fim, Independência, Moinhos de Vento e vários outros.” [23]
"A partir da última década do século XIX, a figura isolada do proprietário fundiário começa a desaparecer do cenário da capital cedendo lugar às companhias de loteamento, criadas especificamente para atuar no mercado de terras. [24] [24a]
Em seu estudo sobre o mercado de terras de Porto Alegre, Strohaecker descreve a trajetória e as áreas de atuação das quatro empresas que operaram nessa década, aduzindo preciosos elementos sobre suas práticas de mercado e sobre a íntima relação de seus principais proprietários e acionistas com agências estatais e capitais de investimento em serviços públicos.
Segundo a autora, essas novas tecnologias urbanas “fornecerão os serviços e equipamentos indispensáveis à emergência do capitalismo”; na verdade, elas já são a metrópole capitalista em construção, como atesta a relação dos cargos exercidos pelos três principais acionistas da mais importante empresa loteadora, a Companhia Predial e Agrícola, em instituições financeiras (Banco Comercial Franco-Brasileiro, Banco Nacional do Comércio, Cia. Previdência do Sul) e empresas de serviços públicos urbanos (Hidráulica Porto Alegrense, Força e Luz Porto Alegrense, Telefônica Rio Grandense, Carris Porto Alegrense) [25].
A Companhia Territorial Porto Alegrense, que tinha dentre seus objetivos estatutários “a compra de bens de raiz, especialmente de terrenos e prédios no município de Porto Alegre, a venda de terrenos e lotes, [a] abertura de ruas ou avenidas, a exploração e venda de materiais (,,) [e a] construção de prédios em suas propriedades”, promoveu, entre 1892 e 1902, “loteamentos distintos para grupos de renda diferenciados, conforme o sítio e a localização” [26]:
(..) o loteamento Bela Vista, localizado em área salubre e adjacente aos bairros nobres da Independência e Moinhos de Vento, foi lançado visando o mercado de classe média, constituído basicamente de descendentes de portugueses que exerciam atividades ligadas ao comércio da cidade. Por outro lado, os loteamentos Navegantes, São João e Várzea do Gravataí, localizados em áreas sujeitas a inundações e distantes do centro urbano, foram destinados às classes operárias, principalmente imigrantes (italianos, alemães e poloneses), que procuravam residir nas proximidades das fábricas. Nesse período, a indústria porto-alegrense distribuía-se longitudinalmente às margens do lago Guaíba e à ferrovia. [27]
Com a incorporação das extintas companhias Territorial Porto Alegrense, Territorial Rio Grandense e Cia. Rural e Colonizadora, a Companhia Predial e Agrícola praticamente monopolizou o mercado de terras da capital do Estado até a metade da década de 1920. (..)
De 1908 até o início da Primeira Guerra Mundial, em 1914, ocorre um incremento significativo no volume de negócios do setor imobiliário. Esse aumento da demanda reflete-se no âmbito de toda a cidade com a introdução dos bondes à tração elétrica, a implantação de várias fábricas e melhoramentos urbanos. (..) em média, eram contratados cerca de cinqüenta imóveis por ano. Mas, em 1909, ocorre um aumento no volume de vendas para 184 imóveis, um incremento de 268%. Esse desempenho se deve primordialmente à introdução dos bondes à tração elétrica na cidade, a partir de 1908, o que permitiu o deslocamento dos estratos de renda média para bairros mais distantes do centro com a facilidade e rapidez do novo sistema de transporte coletivo. [29]Segundo as fontes consultadas, loteamentos criados entre os anos de 1870 e 1930 aparecem associados à origem ou desenvolvimento inicial dos seguintes bairros de Porto Alegre:
1870-1889: Partenon, Vila S. José, Teresópolis, Navegantes, Moinhos de Vento, Cidade Baixa
1890-1900: Navegantes, Glória, Rio Branco, Bom Fim, Bela Vista, São João, Medianeira, Higienópolis, Mário Quintana, São Geraldo
1900-1930 Auxiliadora, Bom Jesus, Cristo Redentor, Jardim do Salso, Mont’Serrat, Petrópolis, Rio Branco, São João
A configuração espacial desses elementos está indicada na imagem abaixo, que tomo como representação aproximada - fontes primárias estão fora do alcance deste autor - do que seria um mapa dos loteamentos do período.
Os assentamentos negros e os arraiais
Os loteamentos não são, por certo, os únicos elementos da expansão periférica da Porto Alegre de fins do século XIX: são o componente principal do ciclo expansivo impulsionado pelo mercado de bens e serviços urbanos. Precedem-nos, e com eles convivem enquanto são absorvidos ou deslocados pela nova trama urbana em rápida expansão, dois tipos de núcleos populacionais: os assentamentos negros e os arraiais.
Embora o termo apareça muitas vezes na literatura como genérico para núcleo populacional peri-urbano, inclusive proveniente de loteamentos - o “bairro de antigamente” -, o arraial constitui, na Porto Alegre de meados do século XIX, um tipo específico de assentamento de caráter semi-rural que emerge do processo de fragmentação da propriedade senhorial em chácaras produtivas e propriedades de recreio dos setores afluentes da capital. Em geral ele é descrito como aldeamento satélite relativamente autônomo que mantinha com a cidade certas relações comerciais e administrativas. [30] [31]
A transição periférica
A plotagem das colônias afro-brasileiras, arraiais e loteamentos sobre uma mesma base espacial nos oferece um panorama mais completo da expansão periférica de Porto alegre no período 1870-1930.
Porto Alegre - Loteamentos, arraiais e principais assentamentos negros no período 1870-1930. Base Google Maps. Elaboração Própria. Fontes: STROHAECKER e PROCEMPA. A linha tracejada cinza delimita a Cidade tal como representada na Planta de 1881; a linha tracejada preta é o limite urbano de 1892 cf. FIALHO; as linhas vermelhas representam, aproximadamente, as modernas Perimetrais que contém a Cidade Radiocêntrica |
Observa-se que a distribuição espacial dos loteamentos para os três intervalos temporais considerados não guarda clara relação com a distância à cidade, medida por sua posição relativa às atuais Perimetrais, em cujo âmbito se define a "Cidade Radiocêntrica".
A maioria dos loteamentos do período 1870-1930 situa-se no espaço contido entre a 2a e a 3a Perimetrais, externos portanto ao limite urbano de 1892, sugerindo que o novo mercado de bens e serviços urbanos integra um ciclo expansivo que, desde a década de 1870, transcende largamente o processo, inegavelmente em curso, de "conurbação do Centro Histórico com os arraiais circundantes".
Muito mais do que o preenchimento dos vazios existentes entre a cidade e os aldeamentos legados pela época das chácaras, o que se vê é a proliferação de parcelamentos de terra por toda a "coroa de 180 graus de terra firme disponível ao redor" da cidade imperial, ao alcance de qualquer caminho ou ramificação radial por onde se dá, ou se presume que se dará, a passagem do serviço de transportes que lhes proporcione condições básicas de acesso à “cidade”; um processo inexorável e até certo ponto caótico, guiado pela oportunidade de se dispor de uma gleba, retalhá-la e, com base em seus atributos naturais e nas condições presumíveis de acesso cotidiano à “cidade” onde estão o porto, o comércio, os escritórios, o governo e, portanto, a maioria dos postos de trabalho, venderem-se os lotes pela melhor oferta de renda disponível no mercado. Com a primazia do fator acessibilidade, atributo da localização que inclui o suporte viário, os meios de transporte e o custo do deslocamento e subjaz à crescente movimentação pendular da população economicamente ativa, a urbe adquire, em definitivo, uma dinâmica "radiocêntrica".
O limite de 1892 tem o claro propósito de incorporar ao recinto urbano os arraiais, já arruados conforme a Planta de 1888, mas não os loteamentos, que ainda não são "cidade". Pseudo-subúrbios anteriores à suburbanização, esses núcleos semi-rurais que com a expansão "normal", espacialmente progressiva, da cidade imperial estariam destinados à conurbação acabaram todos "engolidos" pela urbanização de mercado de inícios do século XX, misturando-se aos loteamentos na complexa trama dos novos bairros da cidade radiocêntrica.
Ao incorporar os arraiais, o limite urbano de 1892 incorpora também, voluntariamente ou não, as comunidades negras concentradas nas áreas alagáveis da várzea do Dilúvio, periferia imediata da cidade imperial - atuais bairros da Cidade Baixa, Farroupilha, Bom Fim, Santana e, muito especialmente, Rio Branco, onde existia na virada do século a Colônia Africana. Segundo Pesavento, elas formam um "cinturão negro" situado entre o centro e os demais distritos da cidade [31a]. Numa época em que ainda não se fala em grandes obras de drenagem e saneamento, esses assentamentos, sujeitos ao duplo opróbrio da etnia e da pobreza extrema, não parecem competir com a indústria dos loteamentos, que, salvo no que tange aos bairros operários da Zona Norte, busca as áreas mais elevadas e salubres potencialmente acessíveis pelo sistema de bondes em franca expansão.
O processo de absorção-extrusão, pela urbanização de mercado, desses dois componentes previamente alojados na periferia imediata do Centro Histórico fez surgir um espaço urbano de transição cujas peculiaridades serão estudadas na terceira postagem desta série.
As vias radiais e os serviços de bondes
“Os primeiros caminhos de Porto Alegre. CRUZ, Transparência de aula”, em RUSCHEL P. 25 Fonte: Internet |
A formação dos arraiais, em meados do século XIX, à beira de tais caminhos estabelece o esboço de uma expansão urbana radiada. Contudo, é o sistema de transportes que detalha a cronologia e a geografia dessa expansão. E ela mostra claramente que, a despeito da coincidência temporal, os bondes, inaugurados em 1873, não chegam à cidade casados com os loteamentos: prometidos seria uma metáfora mais adequada. Em 1888 eles ainda aparecem como melhoramento a serviço da cidade imperial e seus, àquela altura, principais aldeamentos periféricos: os arraiais de Navegantes e do Menino Deus, os mais antigos e populosos da região. A dinâmica que governa a rede em seus primeiros anos não é a da "indústria da urbanização", mas a da capital portuária e comercial que constrói um eixo de comunicação regional com as colônias agrícolas do Vale dos Sinos e além, e em cuja retaguarda semi-rural, ao sul, se forma um "arraial de chácaras e casas de fim de semana de famílias de alta renda" [32].
Porto Alegre 1888 e 1896, rede de transporte público Fonte: Internet |
“(..) caracterizava-se pela presença de casas bem arranjadas e hortas, ligadas a uma camada da população de maior poder aquisitivo, que desfilava por suas ruas em finas carruagens. Destacava-se como o mais movimentado de Porto Alegre, em função de suas festas paroquiais e pela instalação, em 1888, do hipódromo Rio-Grandense (..)”. [35]Embora tenha tido seu período áureo já na virada do século, quando, segundo Sanhudo, "começou a ser um bairro chique (..) [de] vistosos sobrados revestidos dos mais artísticos mosaicos da cerâmica de Maiorca, ressaltados por figuras representativas da mitologia grega em fina louça italiana e portuguesa", [36] o Menino Deus tampouco estabelece a margem sul do Guaíba como direção principal de expansão da urbanização de mercado: como mostra cristalinamente a rede de bondes de 1896, esta se espraia pelos antigos caminhos rurais e suas ramificações a partir das terras altas da Crista da Matriz.
Porto Alegre 1916 e 1928, rede de transporte público Fonte: Internet |
Logo os bondes passam a servir toda a “coroa de 180 graus de terra firme disponível para a expansão” ao redor da capital, alcançando não apenas os arraiais há muito existentes junto aos caminhos pioneiros - Moinhos de Vento, São Manoel, São Miguel - mas também os novos parcelamentos surgidos ao seu redor e mais além. O serviço do antigo Caminho da Azenha (João Pessoa) se ramifica, de um lado, na direção dos novos loteamentos de Medianeira, Glória e Teresópolis, de outro na de Santo Antônio e Partenon; o do antigo Caminho do Meio (Oswaldo Aranha / Protásio Alves) segue o rumo do Bom Fim, Rio Branco e Santana; o do antigo Caminho da Aldeia (Independência) se ramifica também, de um lado na direção dos novos loteamentos de Moinhos de Vento, Auxiliadora, Mont'Serrat e Higienópolis, de outro, na direção da Floresta e São João. Também o serviço de Navegantes, pelo antigo Caminho Novo (Voluntários da Pátria), se ramifica rumo aos loteamentos de São Geraldo e São João.
Mais do que expansão geográfica, a rede de bondes de 1916 mostra o adensamento da malha urbana resultante do preenchimento dos interstícios legados pela expansão suburbana.
A suburbanização de mercado aparece perfeitamente cristalizada em "cidade radiocêntrica" na rede de 1928, com o adensamento dos setores circulares e a formidável expansão, agora apoiada por serviços de ônibus, ao longo de todos os eixos radiais, atingindo os bairros de Bela Vista, Petrópolis e Bom Jesus na área de influência da Protásio Alves; São José na da Bento Gonçalves; Passo d'Areia e Cristo Redentor na da Assis Brasil.
Numa rara passagem de Espaço Intra-Urbano no Brasil explicitamente dedicada à gênese da moderna metrópole brasileira, Villaça observa que “a nova espacialização urbana” oriunda da “transição da sociedade patriarcal, escravocrata e colonial para capitalista” é "pouco notável" em Porto Alegre devido ao pequeno tamanho da cidade relativamente aos velhos centros coloniais – Salvador, Recife e, principalmente, Rio de Janeiro, “onde inclusive os transportes coletivos se difundiram bem antes que nas outras metrópoles.”[38]
Eu espero ter demonstrado, ou ao menos argumentado convincentemente, que, muito ao contrário, um conjunto de circunstâncias dentre as quais o aparecimento de "uma nova estratificação social, uma nascente burguesia e classe média urbanas”[39] fez surgir na periferia da Porto Alegre de fins do século XIX, de maneira talvez precoce para o tamanho da cidade, um próspero mercado de terras, moradias e serviços urbanos e seu corolário espacial – a cidade radiocêntrica, servida por bondes de tração elétrica não mais que dezesseis anos depois do Rio de Janeiro, onze depois de Salvador e seis antes de Recife.
Facilitada por fatores já apontados no primeiro artigo desta série e por isso antecipada à construção, típica da segunda metade do século XX, das redes de vias expressas e semi-expressas de acesso ao centro urbano, a clara configuração radiocêntrica da rede urbana de Porto Alegre já nas primeiras décadas do século XX é o que de mais notável poderia exibir a gênese de uma metrópole capitalista.
Ao invés, porém, da expansão gradativa por acréscimos adjacentes à fronteira urbana, característica da cidade colonial e, em boa medida, também da imperial, a formação da urbe radiocêntrica se dá, por assim dizer, de fora para dentro, saltando o perímetro da cidade para, desde a sua periferia semi-rural, a ela soldar-se pouco a pouco incorporando em sua marcha inexorável os antigos arraiais e expelindo, cedo ou tarde, por meio de remoções a cargo do Estado se necessário, famílias e assentamentos impossibilitados de competir economicamente pela localização que ocupam.
Refluindo sobre o núcleo colonial-imperial, a cidade radiocêntrica em contínua expansão e adensamento o revoluciona de acordo com as necessidades da economia de mercado e as exigências culturais e estéticas dos novos segmentos sociais econômica e politicamente dominantes, vale dizer pela renovação acelerada do estoque edificado, pela multiplicação de edifícios de escritórios e galerias comerciais, pela formação de um hipercentro financeiro, pela busca incessante de uma arquitetura própria dos arranha-céus, pela inserção da cidade no circuito das exposições agrícolas e industriais, pela elaboração de um Plano de Melhoramento e Embelezamento da Capital e por intervenções urbanas modernizadoras como a ampliação do porto, o ajardinamento do Campo da Redenção com base em projeto de Alfred Agache e, fechando com chave de ouro este primeiro ciclo, a abertura da Avenida Borges de Medeiros, a partir de 1925, para a ligação do núcleo urbano ao bairro do Menino Deus e daí a toda a margem sul do Guaíba, aí incluída a construção do Viaduto Otávio Rocha - provavelmente a obra urbana mais emblemática da história de Porto Alegre.
Porto Alegre 1933. Avenida Borges de Medeiros e Viaduto Otávio Rocha, projetado por Manoel e Duilio Bernardi, com esculturas de Alfred Adloff. Concluído em 1932 e tombado em 1988 |
Chego, aqui, a uma ideia bastante distinta da expressa por Villaça a respeito da renovação espacial das cidades coloniais brasileiras:
Quando, nos primeiros vinte anos deste século, o quadro imobiliário do centro de nossas cidades foi totalmente renovado com a demolição do colonial e a implantação do neoclássico e do ecletismo, não houve alteração na estrutura urbana, pois esses centros não perderam sua importância, sua posição, natureza nem localização. [41]
As duas primeiras décadas do século XX marcam, no Brasil, o nascimento das metrópoles capitalistas, que tem como um de seus traços distintivos, como vimos, o novo mercado de lotes suburbanos. Por não considerar o salto qualitativo realizado na transição da urbanização mercantil-escravista para a urbanização capitalista, Villaça perde de vista que é assim que nasce o “centro” no que até então era “a cidade”. Embora não perca a sua "localização, importância e posição", o velho núcleo colonial-imperial perde, sim, a sua “natureza”: sobre a cidade que comanda o campo ao seu redor, nasce o centro que comandará a metrópole. O novo centro da urbanização de mercado começará, então, a se estender na direção da migração dos abastados e a se desdobrar em subcentros em todas as direções. Em algum deles poderá se fixar, muito mais tarde, o novo polo financeiro da metrópole.
Não é, pois, a “cidade radiocêntrica” a expansão natural do “centro histórico” - termo ambíguo que carrega consigo uma patente contradição: a cidade colonial não era “centro” senão de seu espaço rural; ao contrário, é a cidade colonial-imperial revolucionada pelo mercado de bens e serviços urbanos e convertida em “centro” da urbe radiada que pode ser dita, com propriedade, “expansão natural da cidade radiocêntrica.”O nome "Cidade Nova" tem registros que remontam ao período do reinado de D João VI. Até o início do século XIX, a região era um alagadiço que servia de rota de passagem entre o Centro e as zonas rurais da Tijuca e São Cristóvão. [1]
Rio de Janeiro 1835
Chamou-me a atenção que o autor tenha descrito a Cidade Nova como um lugar situado "entre o Centro e as zonas rurais da Tijuca e São Cristóvão". A pergunta inevitável é: no início do século XIX, quando Tijuca e São Cristóvão eram 'zonas rurais', existia 'o Centro'?
“Naquela mesma tarde em que o deixamos na sua casa de Botafogo, terminado o jantar, mandou aprontar o tílburi e voltou à cidade. Seu aparecimento àquela hora na Rua do Ouvidor causou estranheza: um leão de raça, como ele, não passeia ao escurecer, sobretudo no centro do comércio, onde só ficam os que trabalham.” [2]
"Uma verdadeira patuscada esse passeio à cidade! (..) Ninguém tomou bonde; e por toda a viagem discutiram e altercaram em grande troça, comentando com gargalhadas e chalaças gordas o que iam encontrando, a chamar a atenção das ruas por onde desfilava a ruidosa farândola. [3]
“De manhã tinha o relógio parado. Chegando à cidade, desci a Rua do Ouvidor, até a da Quitanda (..)” [4]
As duas primeiras décadas do século XX marcam, no Brasil, o nascimento das metrópoles capitalistas, cujo traço distintivo é a urbanização de mercado: de um lado as empresas loteadoras, construtoras e prestadoras de serviços públicos urbanos, de outro uma classe média ascendente - comerciantes, militares, funcionários, especialistas, artesãos e trabalhadores qualificados - capaz de arcar com custos de transportes e financiamentos a longo prazo. (..)
É a indústria da urbanização, ou urbanização de mercado, que dá conteúdo e forma à urbe radiocêntrica. É ela que converte as chácaras semi-rurais em bairros residenciais, os antigos caminhos rurais em vetores radiais de expansão, os aldeamentos satélites estrategicamente situados em embriões de futuros subcentros e, finalmente, a própria “cidade” em “centro”! [5]
Não se trata de que inexistam tendências radiocêntricas na cidade colonial, isto é, de que sua organização sócio-espacial não manifeste a lei do menor custo-distância, mas de que aqui ela é uma força débil relativamente a outros determinantes - a pré-existência de um traçado fundacional, a pequena extensão dos percursos, o máximo aproveitamento das quadras e parcelas -, materializando-se via de regra como expansão linear ao longo da via principal do assentamento e, em menor medida, como reprodução mais ou menos regular da quadra padrão no sentido transversal. [6]
A forma tipicamente "cartesiana", ou ortogonal, da expansão urbana colonial brasileira corresponde às observações de Hurd em seu "vôo de pássaro" de 1903 sobre as "direções de expansão" das cidades comerciais. Ele observa que, nos assentamentos marítimos, fluviais e lacustres, o crescimento começa ao longo da costa, "seja porque as novas docas e os edifícios fronteiros formam um eixo de tráfego ou porque a própria margem constitui um caminho natural para os assentados". [7] Segue-se a formação de um feixe de ruas paralelas que, com o tempo, converte-se em malha reticulada mais ou menos regular 'centrada' no ponto de partida das transversais principais, tipicamente a 'praça do mercado'.
Essa mesma configuração está presente no relato alencariano do processo expansivo do Rio de Janeiro colonial (1659) contido nas crônicas ficcionais reunidas em Alfarrábios, de 1873. Trocando momentaneamente o chapéu de ficcionista pelo de historiador-geógrafo, diz Alencar:
"Com o incremento natural da população, foi a cidade descendo das encostas da colina e estendendo-se pelas várzeas que a rodeavam, sobretudo pela orla da praia que cinge o regaço mais abrigado da formosa baía, e corre em face à Ilha das Cobras. Aí, fronteiro ao ancoradouro dos navios, com o fomento do comércio, se ergueram as tercenas e os cais, onde não tardaram a agrupar-se em volta das casas das alfândegas e dos contos as lojas e armazéns dos mercadores. Após essas, embora já mais arredadas da beira-mar, vinham as outras classes trazidas pelo desejo de estarem mais próximas ao centro do povoado, onde é mais ativo o tráfego." [8] [destaques meus]
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“Ficou o Ivo como queria, vivendo à mangalaça pelas ruas de São Sebastião, e nos arrabaldes, que a pouco e pouco se foram transformando em bairros, e estão agora dentro da cidade.” [destaque meu]
Este mapa de 1907, aparentemente produzido e editado nos Estados Unidos, se intitula “Rio de Janeiro City – Commercial District”, expressão que naquele país precede em algumas décadas o contemporâneo CBD - Central Business District. Fonte: ImagineRio https://www.imaginerio.org/iconography/maps/2589147 |
Para além de seus aspectos estritamente urbanísticos, e da ideologia subjacente tantas vezes assinalada, o conjunto de obras modernizadoras executadas no Rio de Janeiro ao longo do século XX - abertura das avenidas Mem de Sá (1906), Beira-Mar (1906), Rodrigues Alves (1910), Presidente Vargas (1944), Av. Chile (1960) e Parque do Flamengo (1960) - são intervenções destinadas a consolidar a estrutura radiada de acesso ao Centro da metrópole.
Direções de expansão do Rio de Janeiro colonial e republicano, lançadas sobre mapa do ano 1935 |
Um importante marco da transição de uma a outra modalidade de expansão no Rio de Janeiro é a inauguração, em 1858, do primeiro trecho da Estrada de Ferro D. Pedro II, que "permitiu, a partir de 1861, a ocupação acelerada das freguesias suburbanas por ela atravessadas" - o que supõe o advento de um mercado de terras periféricas à 'cidade', uma nova classe média capaz de adquiri-los e uma estrutura empresarial capaz de financiá-los -, seguida, em 1868, da implantação das primeiras linhas de bondes de tração animal, que vieram a "facilitar a expansão da cidade em direção aos bairros das atuais zona sul e zona norte". [9]
A mudança da matriz espacial da expansão urbana, de ortogonal a radial, e a consequente transformação da 'cidade' em 'Centro', é, portanto, um problema tanto de forma quanto de conteúdo. Aqui vale a pena recuperar, do mesmo texto sobre Porto Alegre, a discussão sobre a ideia de 'centro' na transição da cidade colonial-imperial para metrópole capitalista tal como interpretada por Villaça. Ele nos diz:Quando, nos primeiros vinte anos deste século, o quadro imobiliário do centro de nossas cidades foi totalmente renovado com a demolição do colonial e a implantação do neoclássico e do ecletismo, não houve alteração na estrutura urbana, pois esses centros não perderam sua importância, sua posição, natureza nem localização. [10]
Porto Alegre: direções de expansão (1) expansão cartesiana: planta de 1772 (2) transição sobre planta de 1881 (3) expansão radiada: planta 1928 |
Esta passagem resume o que me parece uma importante lacuna teórica de Espaço Intra-Urbano no Brasil: a omissão da mudança qualitativa imposta ao processo urbanizador brasileiro, em fins do século XIX, pela urbanização de mercado. Implícito na afirmação de que “no final do século XIX havia [em Porto Alegre] uma coroa de 180 graus de terra firme disponível para a expansão urbana” [11], esse salto histórico é por outro lado negado – inadvertidamente, por certo – pela ideia de que “nos primeiros vinte anos deste século (..) não houve alteração na estrutura urbana, pois esses centros não perderam sua importância, sua posição, natureza nem localização”. [destaques meus]
Por não considerar o salto qualitativo contido na transição da urbanização mercantil-escravista para a urbanização capitalista, Villaça perde de vista que é assim que nasce o “centro” no que até então era a “cidade”. Embora não perca a sua "localização, importância e posição", o velho núcleo colonial-imperial perde, sim, a sua “natureza”: sobre a cidade que comanda o campo ao seu redor, nasce o centro que comandará a metrópole. O novo centro da urbanização de mercado começará, então, a se estender na direção da migração dos abastados e a se desdobrar em subcentros em todas as direções. Em algum deles poderá se fixar, muito mais tarde, o novo polo financeiro da metrópole. [12]
Refluindo sobre o núcleo colonial-imperial, a cidade radiocêntrica em contínua expansão e adensamento o revoluciona de acordo com as necessidades da economia de mercado e as exigências culturais e estéticas dos novos segmentos sociais econômica e politicamente dominantes, vale dizer pela renovação acelerada do estoque edificado, pela multiplicação de edifícios de escritórios e galerias comerciais, pela formação de um hipercentro financeiro, pela busca incessante de uma arquitetura própria dos arranha-céus, pela inserção da cidade no circuito das exposições agrícolas e industriais, pela elaboração de um Plano de Melhoramento e Embelezamento da Capital e por intervenções urbanas modernizadoras como a ampliação do porto, o ajardinamento do Campo da Redenção com base em projeto de Alfred Agache e, fechando com chave de ouro este primeiro ciclo, a abertura da Avenida Borges de Medeiros, a partir de 1925, para a ligação do núcleo urbano ao bairro do Menino Deus e daí a toda a margem sul do Guaíba, aí incluída a construção do Viaduto Otávio Rocha - provavelmente a obra urbana mais emblemática da história de Porto Alegre. [13]
Como sugerem as referências literárias acima citadas, em fins do século XIX a centralidade urbana ainda era identificada, no Brasil, não com a nascente forma histórica do “Centro” metropolitano, mas com um conjunto de entidades, ou funções, centrais - o palácio, o cais do porto, a praça do mercado, o comércio, a sé - simbolicamente representadas, na literatura como no jornalismo, e não por acaso, pelo “passeio comercial” frequentado pela burguesia em ascensão.
Nos termos do texto sobre Porto Alegre já citado, o nascimento do “Centro” metropolitano é
(..) uma mudança geográfica radical e meteórica na escala temporal da modernidade urbana, portadora de uma percepção coletiva do espaço inteiramente renovada ainda que pouco acessível aos hábitos mentais das antigas gerações: sua transposição para a linguagem corrente levaria ainda algumas décadas para se completar. Trata-se, mais exatamente, de uma revolução semântica fundada na mudança de percepção da estrutura do espaço em que se vive: não mais uma coleção de arraiais ao redor da cidade, mas uma única urbe expandida por justaposição de parcelamentos lindeiros a vias radiais servidas por transportes mecânicos, que tudo ligam ao que agora é “centro”. [15]
Ainda na minha infância, na Niterói na década de 1960, meus pais diziam “vamos à cidade”. O ônibus 30 era a linha Martins Torres-Cidade. [16]
Havia três acessos do núcleo colonial para o núcleo urbano já existente, que era chamado de “cidade” (..). A Sede [área verde da figura abaixo] (..) foi concebida com a finalidade de constituir um prolongamento da “Cidade” e, por este motivo, esses lotes eram denominados “urbanos”. [17] [Aspas dos autores]
Ao longo do século XX, toda a área do Núcleo Colonial Antônio Prado foi absorvida pela expansão urbana radiada de Ribeirão Preto - como ocorre, aliás, com a maioria, se não a totalidade, das cidades e urbanizações ditas planejadas. Como explica Capretz em outro texto, hoje a maior parte dos bairros oriundos da Colônia participa da “geografia social da cidade” como “território da pobreza”, por oposição ao vetor que parte do “quadrilátero central”, a antiga ‘cidade’, em direção ao sul, onde se concentram “valores imobiliários altos, habitações luxuosas, alto consumo e mais investimentos públicos”. [18] [Os termos entre aspas são da autora].
O crescimento recente da cidade e a expansão de suas atividades conduziram à modificação da fisionomia do centro, provocando o aparecimento de grandes edifícios, construídos nos espaços vazios, ou substituindo velhas casas. É a esse conjunto que os baianos chamam "A Cidade", quando se referem à parte alta, e "O Comércio", quando falam da parte baixa do centro de Salvador. É aí que a vida urbana e regional encontra o seu cérebro e o seu coração." [19]
Lima Barreto é, com toda certeza, uma valiosíssima testemunha da formação dos subúrbios do Rio de Janeiro e, provavelmente, dos subúrbios brasileiros em geral. Sua obra corresponde, muito precisamente, ao período apontado por mais de uma fonte - Queiroz Ribeiro para o Rio de Janeiro[1] e Strohaecker para Porto Alegre [2] - como sendo o da formação do mercado de terras periféricas às nossas capitais recém convertidas ao status de republicanas. Esse artigo é, portanto, absolutamente oportuno e relevante para leitores interessados na história urbana brasileira e, particularmente, na formação das metrópoles capitalistas em nosso país. Vale uma análise muito mais atenta e profunda do que trago nesses apontamentos.
(..) o desenvolvimento dos transportes coletivos por trens e bondes irá incorporar ao tecido urbano uma grande quantidade de terras, diminuindo fortemente o poder monopolista dos proprietários de cortiços, estalagens e casas-de-cômodos localizados na parte central da cidade. Num primeiro momento, porém, não há um deslocamento das camadas mais pobres para os subúrbios recém-urbanizados, em razão do elevado preço dos trens e bondes e da precariedade dos serviços. Para aquelas camadas sociais, o morar no centro é vital, pois seu sustento depende da “viração” diária e seu rendimento muito magro para cobrir os custos do deslocamento. (..) [QR p. 216]
Essa circunstância dará outro destino à maioria dos trabalhadores residentes nos cortiços e casas de cômodos das áreas centrais afetadas pelas grandes obras de modernização urbana da primeira década do século XX (Rua Mem de Sá, Avenidas Central e Rodrigues Alves):
A crise do sistema rentista de produção de moradias gera uma piora nas condições de vida das “classes pobres” da cidade. Deslocadas do centro, elas irão aumentar a densidade de ocupação das casas-de-cômodos nas zonas contíguas ao centro, especialmente na Gamboa, Sant’Anna, Santa Rita e São José. (..) [QR p. 217]
A proliferação de loteamentos suburbanos no Rio de Janeiro de Lima Barreto supunha, dentre outras coisas, a existência de uma camada social de adquirentes de imóveis com algum patrimônio e/ou capacidade de endividamento. Essa "demanda solvável" provinha dos estratos inferiores da nascente classe média, formados por pequenos comerciantes, barnabés, militares, artesãos e, em pequena medida, operários qualificados. [5] [6]
O surgimento de "camadas médias" na cidade também terá um importante papel na expansão da zona suburbana da Central do Brasil e da zona norte verificado nas últimas décadas do século XIX e nos primeiros anos deste século. [QR p. 230]
Ainda que extraordinariamente matizado, o ambiente em que se desenrola a trama de Clara dos Anjos é regido por personagens ciosos de suas conquistas materiais e expectativas de ascensão em uma sociedade até há pouco marcada pelo contraste primordial entre senhores (proprietários de terras, de casas de comércio e seus prepostos) e trabalhadores escravizados. O primeiro dentre esses personagens é o próprio Joaquim dos Anjos, pai de Clara:
"(..) Toda sua ambição se cifrou em obter um pequeno emprego público que lhe desse direito a aposentadoria e a montepio, para a família que ia fundar. Conseguira, ao fim de dois anos de trabalho, aquele de carteiro, havia bem quatro lustros, com o qual estava muito contente e satisfeito da vida, tanto mais que merecera sucessivas promoções. Casara meses depois de nomeado; e, tendo morrido sua mãe, em Diamantina, como filho único, herdara-lhe a casa e umas poucas terras em Inhaí, uma freguesia daquela cidade mineira. Vendeu a modesta herança e tratou de adquirir aquela casita nos subúrbios em que ainda morava e era dele. O seu preço fora módico, mas, mesmo assim, o dinheiro da herança não chegara, e pagou o resto em prestações." (..)" [LB p. 1035 ]
Assim também os pais de Cassi:
Ao melhorarem as suas condições financeiras, com uma promoção a propósito e a compra daquela casa, na estação do Rocha, com o produto de uma herança que tocara à mulher, Manuel de Azevedo veio encontrar, aos treze anos, o filho completamente viciado (..) [LB p.1062]
Propôs, dias depois, à sua esposa, que pusesse o rapazola a aprender um ofício, a fim de discipliná-lo. Dona Salustiana revoltou-se e esbravejou: — Meu filho aprender um ofício, ser operário! Qual! Ele é sobrinho de um doutor e neto de um homem que prestou muitos serviços ao país. [LB p. 1063]
O armazém em que Marramaque era empregado havia de tudo: ferragens, roupas feitas, isto é, camisas, calças, ceroulas grosseiras, para trabalhadores; armas, louças etc. etc. Comprava diretamente nos atacadistas da Corte; além disso, o seu proprietário era intermediário entre os pequenos lavradores e as grandes casas da Capital do Império, isto é, comprava as mercadorias àqueles, por conta destas, com o que ganhava comissão. [LB p. 1065]
Num dos subúrbios, na proximidade da casa de Cassi, veio a residir um casal. A mulher era moça, fruída de carnes, alta, louçã, grandes olhos negros, um tipo do Sul, ao que parece do Rio Grande. O marido, que era oficial de Marinha, maquinista, era amorenado, tirando a mulato, baixo, sempre triste, curvado e pensativo. (..) Tomavam comida fora e só tinham uma rapariguita preta, de uns dezesseis anos, para os serviços leves da casa. [LB p. 1071]
Não me parece razoável, portanto, qualificar-se o subúrbio de Lima Barreto como “lugar de segregação da classe proletária”,[7] atributo que no início do século XX pertencia, principalmente, aos cortiços, casas de cômodos e favelas do nascente centro metropolitano.
— Qual calúnia, qual nada! Este rapaz é um perverso, é sem-vergonha. Eu sei o nome das outras. Olhe: a Inês, aquela crioulinha que foi nossa copeira e criada por nós; a Luísa, que era empregada do doutor Camacho; a Santinha, que ajudava a mãe a costurar para fora e morava na rua Valentim; a Bernarda, que trabalhava no “Joie de Vivre”… [LB p. 1048]
Contudo, as vívidas imagens com que Lima Barreto descreve os assentamentos mais afastados da ferrovia deixam claro que eram as franjas do subúrbio, tipicamente as encostas e grotas das elevações ao longo do "eixo da Central do Brasil", os lugares onde se reproduziam, em alguma medida, os processos de segregação proletária já materializados nos cortiços e casas de cômodos da região central, e que mais tarde iriam generalizar-se por toda a cidade em forma de favelas mais ou menos vizinhas aos bairros de classe média que são a fonte principal do seu sustento.
Afastando-nos do eixo da zona suburbana, logo o aspecto das ruas muda. Não há mais gradis de ferros, nem casas com tendências: há o barracão, a choça e uma ou outra casa que tal. Tudo isto muito espaçado e separado; entretanto, encontram-se, por vezes, “correres” de pequenas casas, de duas janelas e porta ao centro, formando o que chamamos “avenida”.As ruas distantes da linha da Central vivem cheias de tabuleiros de grama e de capim, que são aproveitados pelas famílias para coradouro. De manhã até à noite, ficam povoadas de toda a espécie de pequenos animais domésticos: galinhas, patos, marrecos, cabritos, carneiros e porcos, sem esquecer os cães, que, com todos aqueles, fraternizam. [LB p. 1117]
Também significativa é a diferença social observada por Lima Barreto entre os bairros suburbanos de 1920 e a nascente periferia metropolitana:
Nessas horas, as estações se enchem, e os trens descem cheios. Mais cheios, porém, descem os que vêm do limite do Distrito com o estado do Rio. Esses são os expressos. (..)
Toda essa gente que vai morar para as bandas de Maxambomba e adjacências, só é levada a isso pela relativa modicidade do aluguel de casa. Aquela zona não lhes oferece outra vantagem. Tudo é tão caro como no subúrbio, propriamente. Não há água, ou, onde há, é ainda nos lugarejos do Distrito Federal, que o governo federal caridosamente supre em algumas bicas públicas; não há esgotos; não há médicos, não há farmácias. Ainda dentro do Rio de Janeiro, há algumas estradas construídas pela prefeitura, que se podem considerar como tal; mas, logo que se chega ao estado, tudo falta, nem nada há embrionário. [LB p. 1120]
O subúrbio é o refúgio dos infelizes. Os que perderam o emprego, as fortunas; os que faliram nos negócios, enfim, todos os que perderam a sua situação normal vão se aninhar lá; e todos os dias, bem cedo, lá descem à procura de amigos fiéis que os amparem, que lhes deem alguma coisa, para o sustento seu e dos filhos. [LB 1119-20]
*
Assim como Clara dos Anjos começou a ser escrito em 1904, foi publicado como conto em 1920, transformado em romance em 1922, publicado postumamente em folhetim em 1923-24 e como livro em 1948, [10] também esta pesquisa, de correção em correção, de acréscimo em acréscimo, será um dia publicada neste blog sob o título "O Subúrbio de Lima Barreto", com uma análise bastante mais minuciosa de seus textos, enriquecida com maior quantidade de referências acadêmicas e acrescida de uma introdução, que julgo pertinente, sobre o uso de material literário como fonte de investigação urbanística.
São Paulo, o nascimento da metrópole (1)
Publicado neste blog em 25-02-24
Essa primeira expansão periférica se faz acompanhar da expansão do próprio núcleo colonial-imperial para abrigar tanto os novos proletários que buscam os cortiços para fugir ao custo dos deslocamentos urbanos quanto os novos comércios, serviços e pequena indústria que, em muitos casos, substituem as residências dos comerciantes nos sobrados recém-valorizados.
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A inauguração do Viaduto do Chá em 1892 viabilizará a expansão do centro urbano nascente para o lado Oeste do Anhangabaú, às expensas da área residencial do Morro do Chá, seguindo a direção de preferência dos estratos sociais mais abastados. Na direção oposta, onde em 1881 já se delineia a ocupação residencial ao redor da estação ferroviária do Brás (1867), mais tarde surgirá o lado proletário da centralidade metropolitana paulistana.
Sintomático, talvez, dessa etapa formativa da centralidade capitalista, é o fato de que a planta de 1890, que segundo o pesquisador Eudes Campos** tinha por objetivo “orientar os forasteiros”, contendo por isso ruas de largura uniforme, indicação dos principais edifícios e pontos de parada dos bondes da Companhia Ferro Carril de São Paulo, não traz a inscrição “CENTRO” para indicar a área da cidade colonial-imperial, a essa altura já caracterizada como origem de uma expansão urbana nitidamente radiada, qualitativamente distinta, em forma e conteúdo, do crescimento vegetativo dos séculos precedentes.
2024-02-28
[3] Sehnem, M. e Campos, H. “Análise De Tipologias Arquitetônicas Ao Longo Da III Perimetral Em Porto Alegre (RS)”, Revista Jovem Pesquisador, Santa Cruz do Sul, v. 1, p. 120-127, 2010
[5] “Conheça a terminologia utilizada no PDDUA”
http://www2.portoalegre.rs.gov.br/spm/default.php?p_secao=14
[6] O termo “radiocêntrico” parece redundante. Toda estrutura radial é, por definição, cêntrica. RadioCONcêntricas são estruturas radiais que apresentam elementos dispostos em forma de anéis, ou coroas circulares, concêntricos. Dado o caráter heterogêneo e assimétrico da expansão radial urbana, a formação de círculos e anéis concêntricos de quaisquer natureza (uso do solo, tipologia edilícia, densidade, rendimento familiar) é altamente improvável – donde a crítica generalizada, mas muitas vezes injusta, ao que ficou conhecido na história do urbanismo como o “modelo de círculos concêntricos” de Burgess, que não ignorava o caráter irregular da expansão radial das cidades. No caso de Porto Alegre, o uso do termo “radiocêntrico” parece derivar da percepção de uma quase singularidade: um tecido urbano – vias, urbanizações, ocupações, usos, densidades – de disposição radioconcêntrica, patente ciclicidade e notável homogeneidade, sobre uma grande extensão do território municipal. De todo modo, neste artigo e em suas continuações usarei sempre o termo "radiocêntrico/a".
[7] “(..) denominação dada à Macrozona 3 do PDDUA [situada além da “cidade radiocêntrica”] e recebe este nome porque nela serão fortalecidas ligações viárias nos sentidos norte/sul e leste/oeste, que formam justamente uma trama viária xadrez. (..)” http://www2.portoalegre.rs.gov.br/spm/default.php?reg=3&p_secao=17
[8] A propósito, vale observar a descrição que faz José de Alencar da expansão do Rio de Janeiro colonial: "Com o incremento natural da população, foi a cidade descendo das encostas da colina e estendendo-se pelas várzeas que a rodeavam, sobretudo pela orla da praia que cinge o regaço mais abrigado da formosa baía, e corre em face à Ilha das Cobras. Aí, fronteiro ao ancoradouro dos navios, com o fomento do comércio, se ergueram as tercenas e os cais, onde não tardaram a agrupar-se em volta das casas das alfândegas e dos contos as lojas e armazéns dos mercadores. Após essas, embora já mais arredadas da beira-mar, vinham as outras classes trazidas pelo desejo de estarem mais próximas ao centro do povoado, onde é mais ativo o tráfego." (José de Alencar, Alfarrábios, 1873)
[10] “O plano reticular foi levado para o Oeste com os pioneiros, dado que era o método mais simples de dividir o território. Sua vantagem particular era que uma nova cidade podia ser planejada nos escritórios das imobiliárias do Leste e as terras vendidas sem que nem comprador nem vendedor tivessem nunca visto o lugar". (Britannica 1963 V 5 p 816, “City Planning”)
[11] "This chart represents an ideal construction of the tendencies of any town or city to expand radially from its central business district". BURGESS, E. “The Growth of the City: An Introduction to a Research Project", em BURGESS, E e PARK R E. The City:Suggestions for Investigation of Human Behavior in the Urban Environment, The University of Chicago Press, 1984: Chicago e Londres, p. 50
https://pt.wikipedia.org/wiki/Avenida_Independ%C3%AAncia_(Porto_Alegre)
[15] O autor do desenho que ilustra a abertura desta postagem compartilha, inadvertidamente com certeza, essa caracterização.
[2] PMPA, “Conheça a terminologia utilizada no PDDUA”
[3] Ver comentário sobre esse termo em JORGENSEN P, "Porto Alegre cidade radiocêntrica (1)", À beira do urbanismo (blog) 09-04-2019, Nota [6]
[5a] JORGENSEN P, "Porto Alegre Cidade Radiocêntrica (1)", À beira do urbanismo (blog) 09-04-2019
http://abeiradourbanismo.blogspot.com/2019/04/porto-alegre-cidade-radiocentrica-1.html
[5b] Id.
[6]“Em meados do século XIX várias ruas foram sendo abertas na região, a fim de dar acesso a pequenas propriedades e escoar sua produção de hortifrutigranjeiros até o Centro”. WIKIPEDIA, “Areal da Baronesa” (Cidade Baixa)
[8] PROCEMPA / SMC, História dos Bairros de Porto Alegre, "Cidade Baixa"” http://lproweb.procempa.com.br/pmpa/prefpoa/observatorio/usu_doc/historia_dos_bairros_de_porto_alegre.pdf
[8a] BROCKER L. “A Família Mostardeiro” e “A Chácara dos Mostardeiros”. Guascatur blog. Editado pelo autor em benefício da fluência do texto.
http://www.guascatur.com.br/2016/04/hidraulica-moinhos-de-vento-porto-alegre.html
[9] WIKIPEDIA, “Parque Farroupilha” ed. 17-02-2020
https://archive.org/details/urbanismo-gs
[10a] “Desde la idea de construir una nueva capital para la provincia hasta las primeras décadas de la fundación de La Plata [1882-1912], el país vivió épocas de bonanza y de fuerte desarrollo económico. (..) El ingreso rural se difundió en la ciudad, lo que multiplicó el empleo y generó a su vez nuevas necesidades de comercios, servicios y finalmente de industrias, pues las ciudades constituyeron un mercado atractivo del sector industrial, que alcanzó una dimensión significativa y ocupó a mucha gente.” LOSANO G, “La Plata: de la ciudad apreciada a la ciudad ignorada”. Geograficando año 2, no. 2, 2006, p. 201-223
[12] STROHAECKER T M e CABETTE A, “A dinâmica demográfica e a produção do espaço urbano em Porto Alegre, Brasil”. Cad. Metrop., São Paulo, v. 17, n. 34, pp. 481-501, nov 2015
https://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_de_Porto_Alegre
http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1296508898_ARQUIVO_art.Lena3.pdf
[19] SOUZA, C F. “Trajetórias do Urbanismo em Porto Alegre, 1900-1945”, em LEME, M C S (coord.). Urbanismo no Brasil -- 1895-1965. São Paulo: Studio Nobel/FAU-USP/FUPAM, 1999, pp 83-101.
https://archive.org/details/urbanismo-gs
[20] PROCEMPA / SMC, História dos Bairros de Porto Alegre
[21] “(..) após o falecimento desta proprietária, em 21 de dezembro de 1876, seu genro Ângelo Ignácio Barcellos torna-se inventariante de seus bens. Ele registra sua ação no 2° Cartório de Orphãos de Porto Alegre em Janeiro de 1877. Ângelo contrata um engenheiro para elaborar uma planta de loteamento das terras de sua sogra.” OLIVEIRA A e MATTAR L, “Os Loteamentos do Quarto Distrito de Porto Alegre”. X Salão de Iniciação Científica , p. 2161 – PUCRS, 2009
[22] STROHAECKER T M, “Atuação do Público e do Privado na Estruturação do Mercado de Terras de Porto Alegre (1890-1950)”. Scripta Nova - Revista Electrónica de Geografía Y Ciencias Sociales / Universidade de Barcelona, Vol. IX, núm. 194 (13), 1 de agosto de 2005.http://www.ub.edu/geocrit/sn/sn-194-13.htm
[23] WIKIPEDIA/POA, “História de Porto Alegre”, ed 07-04-2020.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_de_Porto_Alegre
[24] STROHAECKER T M, op. cit.
[26] Ib.
[27] Ib.
[28] Ib.
[29]Ib.
[30] O Menino Deus é considerado o mais antigo arraial de Porto Alegre, pois foi o primeiro território a ter sido reconhecido enquanto agrupamento semi-independente do Centro Histórico, com que mantinha relações comerciais e administrativas. Muitas de suas terras pertenceram a Sebastião Francisco Chaves, dono da estância São José.
[31] Em sua passagem por Porto Alegre entre por volta de 1920, o botânico e naturalista francês Augustin Saint-Hilaire observou as “inúmeras chácaras quase auto-suficientes que proliferavam ao redor da cidade” (VILLAÇA op. cit. p. 206)
[31a] SILVEIRA A B, De Colônia Africana a Bairro Rio Branco: desterritorialização e exílio social na terra do latifúndio - Porto Alegre, 1920 – 1950. Dissertação de Mestrado. PPG em História PUC RGS. Porto Alegre 2015, p. 31.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Rua_Volunt%C3%A1rios_da_P%C3%A1tria_(Porto_Alegre)
34] MELLO L e ROCHA A (Orient), “De Arraial a Bairro Industrial – O Que o Navegantes Ainda Tem?” Iluminuras, NUPECS/LAS/PPGAS/IFCH/UFRGS
https://seer.ufrgs.br/iluminuras/article/view/9220/5305
[35] POA 24hs. “Conheça a história do bairro Menino Deus
https://www.poa24horas.com.br/conheca-historia-do-bairro-menino-deus/
[37] WIKIPEDIA, “História do transporte urbano de Porto Alegre”
https://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_do_transporte_urbano_de_Porto_Alegre
[38] "Em meados do século XIX ocorre um período de transição na produção do espaço urbano carioca, que coincide com um período de transição na sociedade - de patriarcal, escravocrata e colonial, para capitalista, com uma nova estratificação social, uma nascente burguesia e classe média urbanas. Essa transição e a nova espacialização urbana foram mais claras e pioneiras apenas do Rio, onde inclusive os transportes coletivos se difundiram bem antes que nas outras metrópoles; foi marcante também nas outras duas grandes cidades brasileiras da primeira metade do século 19: Salvador e Recife. Em São Paulo e Porto Alegre, então muito pequenas, essa transição foi bem menos notável." VILLAÇA F, op. cit., p.160
[39] VILLAÇA F, id.
[40] A prolongada sobrevivência do termo “cidade” para designar o centro da urbe moderna está registrada em um sem-número de obras literárias brasileiras. Em “Maria Cora”, por exemplo, conto de Machado de Assis situado no Rio de Janeiro de 1893, o narrador-protagonista Correia, que reside numa casa de pensão no Catete, diz: “De manhã tinha o relógio parado. Chegando à cidade, desci a Rua do Ouvidor, até a da Quitanda (..)” Na Niterói na década de 1960, não eram apenas os meus pais, ambos cariocas, que diziam “vamos à cidade”: o ônibus 30 era a linha “Martins Torres-Cidade”. Bastante tardia relativamente aos fatos, a conversão da “cidade” em “centro” na língua falada parece supor uma percepção generacionalmente renovada da estrutura do espaço: não mais uma coleção de arraiais ao redor da cidade, mas uma única cidade constituída de bairros lindeiros a vias radiais servidas por transportes mecânicos, que tudo ligam ao que agora é “centro”.
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REFERÊNCIAS
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QUEIROZ RIBEIRO L C, Dos Cortiços aos Condomínios Fechados - As formas de produção da moradia na cidade do Rio de Janeiro, p. 32. Observatório das Metrópoles, 2015
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NOTAS
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[2] STROHAECKER T M, “Atuação do Público e do Privado na Estruturação do Mercado de Terras de Porto Alegre (1890-1950)”. Scripta Nova - Revista Electrónica de Geografía Y Ciencias Sociales / Universidade de Barcelona, Vol. IX, núm. 194 (13), 1 de agosto de 2005.
http://www.ub.edu/geocrit/sn/sn-194-13.htm
[2a] JORGENSEN P, “Porto Alegre cidade radiocêntrica (2)”, À beira do urbanismo (blog), 21-05-2020.
https://abeiradourbanismo.blogspot.com/2020/05/porto-alegre-cidade-radiocentrica-2_30.html
[3] "Como política urbana, a suburbanização é um modo de alienar os trabalhadores da vida citadina, resumindo o cotidiano do proletariado a grandes deslocamentos casa-trabalho-casa, afastando-o da verve da capital e do sentido da vida urbana". MEDEIROS & MEDEIROS p. 165.
[4] "(..) os subúrbios cariocas são resultado da estratégia de afastamento da classe proletária do centro urbano." MEDEIROS & MEDEIROS p. 160 / Resumo.
[5] "A consideração dos operários qualificados como "camada média" justifica-se se atentarmos para o fato de que desde 1870 forma-se um grande contingente de "pobres" na cidade, pessoas que vivem de trabalhos temporários e intermitentes (..). QUEIROZ RIBEIRO p. 231.
[6] "(..) operários das Oficinas do Engenho de Dentro, nos quais se incluíam os cargos de operários, guardas, feitores, serventes e jornaleiros. Esses, correspondiam a quase totalidade dos empregados da oficinas, que submetidos a 4ª Divisão da companhia, somavam em 1907 cerca de 1.217 funcionários, ao passo que as categorias superiores de chefes, mestres e ajudantes de mestre somavam 22 empregados na mesma data". SERFATY E R C, Pelo trem dos subúrbios: disputas e solidariedades na ocupação do Engenho de Dentro (1870-1906). Dissertação de Mestrado, PUC Rio de Janeiro 2017, p. 75.
https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/32190/32190.PDF
[7] "Para Fernandes, o conceito carioca de subúrbio representa um “rapto ideológico”, pois a corrupção do significado da palavra é um recurso da ideologia capitalista para legitimar a segregação da classe proletária. Assim, o sistema capitalista reinterpreta a noção de subúrbio para atender a sua ideologia: (..)" MEDEIROS & MEDEIROS p. 165.
[8] VELOSO C & GIL G, Haiti. 1993
[9] BARRETO, Lima. Lima Barreto Completo I: Sátiras e Romances Completos. Edição do Kindle p. 1038.
https://www.journals.ufrpe.br/index.php/encontrosdevista/article/download/4743/482484409
** CAMPOS Eudes, “São Paulo antigo: plantas da cidade”. Informativo Arquivo Histórico Municipal, 4 (20): set/out.2008
https://www.academia.edu/37066912/S%C3%A3o_Paulo_antigo_plantas_da_cidade