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quarta-feira, 15 de junho de 2022

Home equity loans once more


The Guardian 09-06-2022, por Bob Kerslake

Right to Buy (Direito de Compra) é um instituto em vigor no Reino Unido (salvo Escócia desde 01-08- 2016 e País de Gales desde 26-01- 2019), que dá aos inquilinos das moradias do Estado e de algumas cooperativas habitacionais o direito de comprar, com grande desconto, os imóveis em que residem. Para os inquilinos de imóveis cooperativados construídos com subsídio público após 1997, existe também o Right to Acquire (Direito de Aquisição), com um desconto menor. De 1980 a 1997, mais de 1.700.000 moradias sociais foram vendidas no marco dessa política, tida como uma das principais causas da drástica redução da quantidade de moradia social no Reino Unido, que caiu de quase 6,5 milhões de unidades em 1979 para cerca de 2 milhões em 2017, e como o fator principal do aumento de 15% no índice de casa própria, que passou de 55% dos domicílios em 1979 para 71% em 2003 (63% em 2017 na Inglaterra). [1]

A privatização pulverizada dos estoques de habitação social do Reino Unido no âmbito das reformas econômicas thatcheristas foi um componente-chave da política de sustentação do nível de consumo à base de empréstimos pessoais lastreados na expectativa de valorização do solo nas grandes metrópoles.

Este é um aspecto central de O Mundo em Queda Livre (2009), livro de J Stiglitz, ex economista-chefe do Banco Mundial, sobre a debacle financeira de 2008. Nele se lê que a indústria do refinanciamento hipotecário foi uma forma de os estadunidenses "tomarem emprestado e consumir como se os seus rendimentos estivessem crescendo". [2]

O mesmo juízo reaparece, com uma análise mais ampla e historicamente situada, no livro Rethinking the Economics of Land and Housing, dos britânicos Ryan-Collins, Lloyd e Macfarlane [3]:

“(..) no Reino Unido e nos EUA, os empréstimos pessoais garantidos pelas residências (EGR) produziram um aumento do consumo: quanto maior o valor da garantia, maior o nível de consumo. (..) Desde a desregulamentação do crédito na década de 1970, a EGR contribuiu de forma importante para a demanda do consumidor no Reino Unido, ainda que somente nos períodos de alta dos preços da moradia (..). Tanto Margaret Thatcher (1979-92) quanto Tony Blair (1997-2007) desfrutaram, em seus mandatos, grandes booms de consumo parcialmente impulsionados pelo EGR, que contribuíram significativamente para o crescimento do PIB. A década anterior à crise financeira registrou níveis sem precedentes de EGR, com proprietários valendo-se do aumento dos preços das residências para tomar mais empréstimos e consumir mais. O sociólogo Colin Crouch (2009) descreveu o fenômeno como uma espécie de 'keynesianismo privatizado': ao passo que no período 1950-70 a demanda foi sustentada pelo Estado pela via da expansão fiscal, no período 1980-2007,  de declínio dos salários médios, ela foi alimentada pela dívida hipotecária”. [4]
 
Não surpreende que, como explica Muellbauer no prefácio da obra, "no longo prazo, as famílias altamente endividadas [tenham ficado] vulneráveis ​​à queda dos preços imobiliários". [5] Nos EUA, o colapso financeiro de 2008 significou que "pelo menos 10 milhões de pessoas perderam suas casas, quase 9 milhões perderam seus empregos e, quatro anos depois, 46,5 milhões viviam na pobreza [6].

____

[1] WIKIPEDIA: "Right to Buy".
https://en.wikipedia.org/wiki/Right_to_Buy

[2] STIGLITZ J, O Mundo em Queda LivreOs Estados Unidos, o mercado livre e o naufrágio da economia mundial. Trad. José Viegas Filho. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. Cap. 1: A formação da crise

[3] RYAN-COLLINS, LLOYD e MACFARLANE, Rethinking the Economics of Land and Housing. Zed Books 2017, edição do Kindle, p. 146.

[4] “(..) in the UK and the US, the home-equity withdrawal [HEW] channel boosts consumption as existing homeowners are able to finance higher consumption on the back of higher collateral values. (..) Since the credit deregulation of the 1970s HEW has made important contributions to consumer demand in the UK but only in certain periods when house prices have been rising (..). Both Margaret Thatcher (1979–92) and Tony Blair (1997–2007) enjoyed major consumption booms partially driven by HEW, with equity withdrawal contributing significantly to GDP (..) in both their tenures. The decade before the financial crisis saw unprecedented levels of home equity withdrawal as homeowners used rising house prices to increase their borrowing to fund consumption. The sociologist Colin Crouch (2009) has described this as a form of ‘privatised Keynesianism’, with the large injections of mortgage debt via equity withdrawal propping up consumer demand in the face of declining median wages, in contrast to the state supporting demand via fiscal expansion as in the 1950–70 period.”

[5] MUELLBAUER J, "Foreword", em RYAN-COLLINS, LLOYD e MACFARLANE op. cit.
 
[6] “The financial crisis hit 10 years ago. For some, it feels like yesterday”. Los Angeles Times 15-09-2018, por Colleen Shalby

2022-06-15

quarta-feira, 8 de junho de 2022

Associação da Moradia Social: urgente!


O Globo 07-06-2022
https://oglobo.globo.com/economia/noticia/2022/06/projeto-que-permite-um-imovel-como-garantia-de-varias-dividas-pode-virar-pesadelo-para-familias-pobres.ghtml

A moradia é, por motivos óbvios, “financeirizada” desde que começou a ser produzida para o mercado.

Ocorre, porém, que a faculdade que tem o solo urbano em geral, e muito especialmente o das grandes metrópoles planetárias do século XXI, de se valorizar continuamente mesmo em períodos recessivos, tornou a moradia objeto prioritário de desejo de gestores de capital de investimento, de mega-imobiliárias que operam na compra-venda e no aluguel, de bancos que emprestam a juros variáveis tendo o imóvel como garantia e de mercadores de títulos de dívidas imobiliárias. Todos operando num ambiente de negócios intrinsecamente especulativo e cada vez mais desregulamentado e internacionalizado.

A “financeirização da moradia” é, portanto, um aspecto ineludível da economia de mercado contemporânea. Creio ser impossível cogitar o seu fim à margem de um programa econômico e político de transição para uma economia planetária social e ambientalmente sustentável, essencialmente planejada.

Mas medidas defensivas imediatas são possíveis, e cada vez mais urgentes. Tudo considerado, a criação de uma Associação Internacional da Moradia Social, com seções em todos os países, seria um fato para lá de auspicioso.

2022-06-08


segunda-feira, 21 de setembro de 2020

Avaliação compensatória?

Deu na Bloomberg online
21-09-2020, por Brentin Mock
A Neighborhood’s Race Affects Home Values More Now Than in 1980

Montagem: À beira do urbanismo
"(..) In other words, if an appraiser is calculating the value of a home in a Black neighborhood by comparing it to houses recently sold around it, then chances are she is com
paring it to other Black-owned houses that, because of the legacy of segregation, have handicapped values in the market compared to similar homes in white communities appraised at higher prices. The unfairly valued prices of homes in Black neighborhoods before the 1970s thus serves as the baseline for how homes are appraised and priced today. While the Fair Housing Act and Community Reinvestment Act forbade practices like redlining and denying mortgage loans based on ra
ce, they did nothing to readjust housing prices in segregated neighborhoods after they were passed.

“Since no steps were taken to rectify the historic inequities, this approach has enabled such inequalities to persist,” reads the study. (..)"

* 
Apesar de não familiarizado com o Fair Housing Act e o Community Reinvestment Act, eu arrisco dizer que subjaz à reivindicação do autor a relação entre o valor dos imóveis e o limite de refinanciamento das hipotecas, que há tempos embute, nos Estados Unidos, um excedente destinado ao consumo (home equity). 

Como explicou Stiglitz em O Mundo em Queda Livre, publicado pouco depois da debacle de 2008, isso permitia que os estadunidenses continuassem gastando como se seus rendimentos estivessem subindo quando na verdade estavam declinando. 

Em Rethinking the Economics of Land and Housing, de 2018, Ryan-Colins et alii explicam que também no Reino Unido o consumo foi incentivado, durante décadas, mediante o uso da propriedade imobiliária como garantia financeira de empréstimos. Ou seja, o valor de avaliação das residências tem relação direta com as expectativas de ascensão social entre os trabalhadores qualificados do mundo anglo-saxão desenvolvido.

Não creio que a melhor maneira de as comunidades não-brancas dos EUA reivindicarem vantagens compensatórias no mercado de hipotecas seja pela via de uma “nova ciência das avaliações”. Salvo situações excepcionais, não há como avaliar-se uma casa por 1200 se as casas similares das vizinhanças vêm sendo transacionadas por preços entre 800 e 1000.

Reivindicar juros mais baixos e prazos mais alongados que compensem os diferenciais de localização, fundamento da segregação espacial pela via do mercado, parece-me um caminho mais razoável e promissor, inclusive como política pública. 

A obrigatoriedade do laudo de um avaliador afro-americano pode ajudar, naturalmente. Diminuiriam as chances de subjetivismo branco e aumentariam as de subjetivismo não-branco, dentro de margens tecnicamente aceitáveis. E promoveria o emprego de não-brancos nesse mercado de trabalho. Avaliações racistas e discriminatórias existem com certeza, como demonstra a postagem anterior, mas constituem crime e como tal devem ser denunciadas, principalmente quando acobertadas pelas corporações profissionais e pelo Estado.

2020-09-21

domingo, 6 de setembro de 2020

O nome do jogo

Portal VGV 27-08-2020, por Ana Carolina Diniz 
https://www.portalvgv.com.br/emprestimo-com-imovel-como-garantia-tem-alta-de-45
 
Empréstimo com imóvel como garantia tem alta de 45%

Home equity é o nome do jogo. Em O Mundo em Queda Livre, lançado por pouco depois da debacle financeira de 2008, Stiglitz explicou em termos bastante claros o papel desse mecanismo, que permitia aos estadunidenses "consumir como se seus rendimentos estivessem aumentando", quando na verdade já vinham em consistente declínio. Segundo ele, "o mercado de imóveis residenciais manteve a economia fora da recessão durante os anos turbulentos dessa década". Quase dez anos depois, Ryan-Colins et alii explicaram, em Rethinking the Economics of Land and Housing, que também no Reino Unido o consumo foi incentivado, durante décadas, mediante o uso da propriedade imobiliária como garantia financeira, deixando famílias altamente endividadas à mercê dos solavancos do mercado imobiliário e sua prole excluída desse mesmo mercado.

A ascensão, por essa e outras vias, de milhões de trabalhadores qualificados, em todo o mundo desenvolvido e mais além, à classe social dos pequenos proprietários de terras, capitais e todo tipo de direitos pecuniários tem um papel crucial na construção e manutenção da estabilidade política do II pós-guerra; e, por isso mesmo, também na crise social e política planetária que passamos a viver com o declínio, a partir dos anos 1980, e a derrocada, em 2007-8, das bases materiais do Estado do bem-estar. Resumindo: a renda da terra tem um papel capital nas glórias e nas tragédias do século XXI. 

2020-09-04


sexta-feira, 12 de junho de 2020

Covid acelera o capitalismo de rendas

Informe ADEMI Rio 09-06-2020

Imagem: Washington Post 2020-06-10 
Santander reforça linha de ‘home equity’ na crise
Diante de uma reformulação da área de negócios imobiliários, o Santander colocou entre as prioridades avançar na oferta do “home equity”, o crédito com garantia em imóveis, tendo em vista o contexto de crise econômica e a necessidade de liquidez de pessoas físicas e jurídicas. (..)

Em meio à crise causada pela pandemia de covid-19, o Santander reduziu a burocracia do produto chamado Use Casa, tornou o processo mais digital, para evitar o deslocamento do cliente, e está fazendo ofertas on-line e pelo aplicativo. (..) 

2020-06-12


terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

Parasita doméstico

Informe Diário ADEMI 27-01-2020

Home equity em alta
A fintech Bcredi viu a oferta de crédito pessoal com garantia de imóvel, o famoso home equity no jargão do mercado, dar um pulo de mais de seis vezes em dezembro último frente um ano antes. O motor vem, principalmente, dos juros menores no País e o maior conhecimento dos brasileiros em torno do produto, que mira aqueles com imóveis quitados. 

Com o salto no home equity, a novata viu sua carteira de empréstimos quase dobrar em 2019, encostando nos R$ 700 milhões, ante R$ 400 milhões em 2018. As razões para o desempenho foram parcerias com empresas como Loft, Stone, Nexoos, FinanZero, além da presença em meios digitais. (..)



Para uma análise da financeirização da moradia na Inglaterra e do papel da renda do solo na economia contemporânea, examine a ilustração abaixo e leia Ryan-Collins, Lloyd & Macfarlane,  Rethinking the Economics of Land and Housing, 2017, Zed Books.
The house price-credit feedback cycle
Ryan-Collins, Josh. Rethinking the Economics of Land and Housing (p. 122). Zed Books. Edição do Kindle.
Clique na imagem para ampliar

2020-02-11


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