https://www.terra.com.br/noticias/dino/imoveis-do-minha-casa-minha-vida-se-tornam-a-bola-da-vez-no-mercado-imobiliario,f2538e5f0c9a0d5f6640cf79bff1deb16vtumv6r.html
Mais da metade do número de imóveis que foram vendidos no último trimestre de 2019 no Brasil estão enquadrados no Programa Minha Casa Minha Vida (MCMV) de acordo com a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), que divulgou os Indicadores Imobiliários Nacionais. Outro dado apontado é que cresceu de 45,9% para 56,9% a representatividade de imóveis do MCMV sobre o total de lançamentos em relação aos demais padrões imobiliários em relação ao último ano. No estudo Indicadores Imobiliários Nacionais foram analisados dados de 17 das maiores cidades brasileiras e as regiões metropolitanas de 10 capitais.Com todos os defeitos que lhe possamos imputar, o principal deles a reprodução em larga escala do velho esquema de assentamento de famílias de baixa renda em periferias distantes, escassamente urbanizadas e inapelavelmente mal servidas de transportes públicos, fato é que o programa Minha Casa Minha Vida representa hoje 50% da produção habitacional no país.
Não admira que as contínuas ameaças governamentais de cortar as fontes dos subsídios que o alimentam, ou dilapidá-las em políticas de incentivo ao consumo, venha causando um frenesi de maus augúrios na imprensa em geral e, muito especialmente, nos jornais de negócios; menos, é certo, pelos belos olhos das populações beneficiadas pelo Programa do que pelo olho gordo de incorporadores acostumados a um amplo mercado cativo para seus investimentos.
Espicaçado por aquele número impressionante, decidi - apesar de já ter dado por encerrada a minha contribuição ao tema da recuperação da renda da terra - resgatar e aperfeiçoar um gráfico, por mim mesmo esboçado há algum tempo, que utiliza o método residual dedutivo de avaliação de terrenos, 'espelho' da estrutura econômica dos empreendimentos imobiliários, para representar em um mesmo marco conceitual - o continuum de preços do m2 privativo - a relação entre preço, custo, lucro e renda do solo na produção habitacional de mercado e do MCMV.
Observações
O preço do m2 privativo de um imóvel novo equivale à soma
+ custo total de construção e comercialização+ remuneração do incorporador+ oferta de renda dos demandantes pela localização urbana (fração de terreno)
O eixo das coordenadas representa os rendimentos líquidos das famílias demandantes de produtos habitacionais (em escala não linear para benefício do grafismo); o eixo das abscissas é uma escala de valores monetários.
A curva azul representa o máximo preço que as famílias estariam aptas e dispostas a pagar pelo m2 privativo dos produtos-localização que a indústria da moradia é capaz de produzir, dividida em dois segmentos: o de mercado, com aspecto similar à dos preços de imóveis novos em qualquer grande cidade em um momento dado (ver figura); e o subsidiado (juros e/ou construção) pelo programa Minha Casa Minha Vida, variando linearmente entre zero e o preço mínimo de mercado.
Rio de Janeiro: unidades lançadas jan2005-nov2006 e preços médios m2 Pesquisa do autor com base em dados ADEMI-O Globo 15-12-2006 |
A curva marrom representa o custo total de construção e comercialização do m2 privativo, incluída a remuneração do capital de investimento, mas não o solo.
Embora apareça a cada construtor como um custo dado, independente do seu empreendimento, o preço do solo não é outra coisa que a parte dos proprietários, conforme o poder de negociação de cada um, no resíduo dos negócios imobiliários depois de descontados, do provável preço de venda do produto-localização, os custos de construção e a remuneração do capital incorporador. Também em prol do grafismo, tomo como estritamente linear a variação do custo total do m2 privativo dos empreendimentos segundo a qualidade do produto.
A variação dos preços dos produtos-localização muito mais que proporcional aos custos totais de produção é crítica para a indústria da incorporação. Ela é a fonte do sobrelucro, ou lucro excedente ao retorno exigido pelo capital investido no empreendimento, que, por não ter relação com a força de trabalho empregada na produção, mas com o direito à ocupação e uso do solo, chama-se 'renda da terra'. Em cidades onde vigora a Outorga Onerosa do Direito de Construir, este valor, que também é renda do solo e provém da 'obrigação de urbanizar', deve ser descontado do resíduo a ser repartido entre o proprietário e o incorporador. O preço de transação do terreno a ser incorporado é a parcela do resíduo (renda do solo) que cabe ao proprietário.
A 'linha de corte' da curva de preços corresponde ao valor de venda do m2 privativo abaixo do qual os incorporadores não vislumbram rentabilidade suficiente para investir - salvo se estimulados por um programa governamental de subsídios à oferta ou à demanda; é o valor de venda do m2 privativo mais barato disponível no mercado não subsidiado, capaz de cobrir os custos de construção, o retorno do capital com um mínimo prêmio de risco (TMA) e a mínima renda exigida pelo proprietário do solo. Segue-se que os produtos vendidos por esse preço não podem pagar Outorga Onerosa do Direito de Construir.
Para cada oferta de preço existe no mercado, em dado momento, uma certa quantidade de produto - a terceira dimensão de nosso gráfico para quem se disponha a imaginá-la.
Pressuponho uma relação razoavelmente padronizada entre o preço e o custo total de construção e comercialização dos bens representados no eixo das coordenadas.
O subsídio governamental aos juros do financiamento, agregado como valor presente à capacidade de pagamento das famílias, reparte-se entre o custo total de construção e a renda da terra onde se constrói o empreendimento. Nos empreendimentos destinados às famílias de menor rendimento, a terra é cedida pelas municipalidades e a construção contratada sem a interveniência do incorporador, razão pela qual o subsídio se aplica exclusivamente ao custo de construção, incluída a remuneração do construtor.
Para melhor entendimento do Programa MCMV, reproduzo abaixo a descrição das distintas faixas de rendimento familiar tal como apresentada no saite da Caixa Econômica Federal:
Faixa 1 – Famílias com renda bruta mensal de no máximo R$ 1800,00. Para esse grupo as mensalidades podem ser parceladas em 120 vezes e as prestações são definidas entre no mínimo R$ 80,00 e no máximo R$ 270,00. O imóvel financiado é usado como garantia do financiamento;
Faixa 1,5 – Essa faixa foi recentemente criada e agrupa famílias com renda bruta de até R$ 2600,00 mensais. Nesse perfil as taxas de juros são de 5% ao ano. O prazo para pagamento pode chegar a até 30 anos e o valor do subsídio é de até R$ 47.500,00;
Faixa 2 – Esta faixa reúne as famílias com renda mensal máxima de até R$ 4000,00. O valor do subsídio é de n máximo R$ 29.000,00;
Faixa 3 – Compreende as famílias com renda mensal bruta de no máximo R$ 7000,00. As taxas de juros são diferenciadas.
2019-12-28