domingo, 12 de fevereiro de 2012

Habitação, Emprego e Mobilidade: subsídios para o debate sobre a localização da HIS[1] na cidade do Rio de Janeiro

Antônio Augusto Veríssimo
Arquiteto Urbanista, Coordenador da Coordenadoria de Planejamento e Projetos da Secretaria Municipal de Habitação da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.

O presente artigo foi escrito no início de 2010 como uma reação ao movimento de certos setores empresariais que reivindicavam, junto aos executivo e legislativo municipal, mudanças na legislação com o objetivo de integrar ao perímetro urbano áreas de ocupação restrita por se situarem em  regiões inadequadamente servidas por infraestrutura ou  utilizadas por atividades agrícola na Região Administrativa de Santa Cruz.

Na defesa de seus interesses, estes agentes argumentavam que a liberação dessas áreas para a produção de conjuntos habitacionais, a serem financiados pelo Programa Minha Casa Minha Vida,  viria suprir a necessidade de produção de milhares de unidades necessária para atender o défict habitacional existente  e aquela demanda adicional que seria criada pela atração de novos moradores provocada pela implantação de novas unidades industrias no polo de Santa Cruz.

Os dados coletados e as análises efetuadas neste estudo tiveram por objetivo demonstrar: (i) que já havia um extremo desequilíbrio na distribuição das oportunidades de emprego  e moradia na cidade, com profundos e perniciosos impactos sobre a mobilidade da população; (ii) que a região da AP 5, zona oeste do Rio, onde está inserido o bairro de Santa Cruz, já era uma “região dormitório” fornecedora de mão de obra para outras regiões da cidade e que incentivar a produção habitacional de interesse social nessa região, para além de uma certa medida, somente aprofundaria a segregação sócio espacial da cidade e a formação de mais guetos de pobreza; (iii) que o desafio efetivo a ser superado era o de aproximar as oportunidades para moradia dos trabalhadores das suas oportunidades de emprego, portanto, incentivar a produção habitacional, prioritariamente, na área central (AP 1),  zona norte e nos bairros do subúrbio imediato (AP3).

Cabe reconhecer, no entanto, que no decorrer deste tempo a administração municipal se deu conta dessa tendência de concentração e passou a estabelecer maiores restrições para a localização dos conjuntos  bem como buscar alternativas de melhor localização dos empreendimentos por meio da aquisição direta de terrenos bem localizados para a promoção dessa produção.
  

Introdução

O presente trabalho visa contribuir com o debate sobre a definição dos critérios para orientação da localização de empreendimentos habitacionais de baixa renda do município produzidas pelo Programa Minha Casa Minha Vida no Rio de Janeiro e também colaborar com a formulação do Plano Municipal de Habitação de Interesse Social.

Neste estudo pretendemos abordar de forma articulada três fatores, dentre outros, que devem ser levados em consideração na formulação de políticas, planos e programas que visem a produção de unidades habitacionais de interesse social no município.

Os três fatores em análise são: o déficit habitacional, a oferta de empregos e as condições de mobilidade da população.

Sobre o déficit habitacional

Para efeito da análise deste primeiro fator, definimos o conceito de déficit habitacional efetivo que é aquele que, para ser eliminado, depende da produção de uma nova unidade habitacional cuja realocação dos moradores não resulta na liberação de uma unidade vazia disponível para nova ocupação.

Tomamos como indicadores deste défict habitacional efetivo os componentes “habitações precárias” e “coabitação familiar”, constantes da tabela a seguir:

Tabela 1
Déficit Habitacional por suas componentes – Município do Rio de Janeiro – 2000/2006-2007.



Fontes (IPP) 2000-Fundação João Pinheiro e Ministério das Cidades. Aplicativo “Déficit Habitacional no Brasil”, com base em IBGE. Censo 2000.
2006 e 2007 Cálculos do IPP/DIC com base em IBGE – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2006 e 2007.
Notas: A metodologia de cálculo, em cada ano, segue as definições da Fundação João Pinheiro. Em função da limitação das informações disponíveis, para 2000 foi calculado apenas o déficit habitacional básico, composto pelas habitações precárias e coabitação familiar.

Habitações precárias: soma de domicílios particulares permanentes (DPP) rústicos e domicílios particulares improvisados.
Coabitação familiar: para 2000 e 2006 é o resultado da soma dos DPP do tipo cômodos e famílias secundárias conviventes; para 2007 é o resultado da soma dos DPP do tipo cômodos e famílias secundárias conviventes que pretendem se mudar.
Ônus excessivo com aluguel: famílias que ganham até três salários mínimos e comprometem mais de 30% de sua renda com aluguel.
Adensamento excessivo: mais de três pessoas por dormitórios em DPP alugados.
.... Dado numérico não disponível.

Justificativa para a escolha desses componentes:

a)      No caso das habitações precárias, considera-se que a sua desocupação implica na sua demolição sem retorno da unidade ao mercado imobiliário, ou seja, a produção de uma nova unidade viria a substituir aquela inadequada, não importando, portanto, no aumento do estoque residencial na região.

b)     No caso da coabitação familiar, há um aumento do estoque imobiliário, mais a saída de uma família do imóvel não implica na liberação para comercialização de uma nova unidade, não implicando na vinda de novos moradores para a região.

Não foram considerados os componentes “ônus excessivo com aluguel” e “adensamento excessivo” pelos seguintes motivos:

a)     No caso do ônus excessivo, com a mudança dos moradores estaria liberada uma unidade que poderia ser colocada no mercado e ocupada por moradores com maior poder aquisitivo que não se qualificariam com déficit. Por outro lado, espera-se que, com o aumento da oferta de imóveis na região pelo PMCMV, tenha-se como efeito uma redução dos valores dos alugueis reduzindo, portando, o peso deste componente no cálculo do déficit habitacional.

b)     No caso do adensamento excessivo, dá-se o mesmo, pois a mudança dos moradores implica a liberação para o mercado de uma unidade que poderá ser ocupada por uma família menor que não configure uma situação déficit habitacional.

Complementarmente, incluímos no cálculo do déficit habitacional efetivo também as unidades habitacionais dos assentamentos identificados pela Prefeitura com não urbanizáveis, pois, também nesses casos, a considera-se que a sua desocupação implica na sua demolição sem retorno da unidade ao mercado imobiliário, ou seja, a produção de uma nova unidade viria a substituir aquela inadequada, não importando, portanto, no aumento do estoque residencial na região.   Cabe destacar, no entanto, que esta decisão implica em assumir uma super estimativa deste déficit, pois, possivelmente, uma parte desses imóveis já consta como unidades computadas no componente habitação precária. Não obstante, assumimos tal risco, pois preferimos esta hipótese a trabalhar com dados subestimados.

Infelizmente os dados disponíveis sobre o déficit habitacional do município não estão regionalizados, não se contando, portanto, com informações exatas por RAs ou mesmo por AP.

Para realizar uma estimativa do déficit habitacional nas áreas em estudo, partimos dos percentuais de moradores em cada uma das APs, estimados pelo IPP para o ano de 2008, admitindo-se, hipoteticamente, que estes se distribuem na mesma proporção da população de cada AP no território do município.


Tabela 2
Estimativa do déficit habitacional efetivo para o Rio de Janeiro (2007)




Os dados apresentados na tabela anterior nos fornecem estimativas para uma análise da população que habita áreas de risco, moradias precárias, ou em coabitação em cada uma das APs, nos orientando o processo de definição dos critérios de elegibilidade.

A coluna “Déficit de novas UH” estima a quantidade mínima e distribuição percentual das unidades habitacionais que deveriam ser produzidas pelo PMCMV no, âmbito de cada AP, caso nosso interesse fosse unicamente o atendimento dos seus respectivos déficits habitacionais efetivos. Ocorre que outros fatores também devem ser levados em consideração quando se trata do planejamento da localização de empreendimentos habitacionais de interesse social, sendo um dos mais importantes da proximidade da oferta de empregos.


Oferta de empregos

Postos de trabalho formais
Para melhor compreender a distribuição dos postos formais de trabalho vis a vis o local de moradia dos trabalhadores no município do Rio de Janeiro, segue abaixo a tabela 3 elaborada pelo Instituto Pereira Passos:
2008.

Tabela 3 ( em mil pessoas)


Fontes: População total MRJ: Projeção IBGE- 2008; População das AP’s: proporção do ensaio de Kaizô et allii. (Hipótese 1, 2008)
PEA – População Economicamente Ativa: IBGE – PME – julho de 2008.
Empregos formais – assemelhados a postos de trabalho: Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) – RAIS – 2008.
Nota: a diferença entre PEA e empregos formais se deve aos autônomos sem empregados + informais + não ocupados.
Tabulação dos dados: IPP.


Para melhor visualização dos dados constantes da Tabela 3 foi também elaborado o gráfico a seguir.

Gráfico  1



Conforme demonstra o gráfico acima, as APs 3 e 5 possuem um expressivo déficit de empregos formais em relação a sua População Economicamente Ativa (PEA), o que indica que a maior parte de suas respectivas PEAs deve buscar postos de trabalho em outras APs ou municípios, ou no mercado informal, seja na própria AP ou externamente.

Oferta de trabalho em geral
Considerando que os dados acima somente explicitam o desequilíbrio entre moradia e postos de trabalho formal, optamos também por examinar dados da  Matriz de Viagens por Motivo de Residência – Trabalho, da Pesquisa de Origem e Destino (POD) do Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (PDTU-RMRJ), divulgado em 2005, que abrangem todo o deslocamento para residência-trabalho, independentemente de seu grau de formalidade.

O gráfico  a seguir indica os destinos das viagens motivados pelo deslocamento Residência – Trabalho considerando apenas as intra-municipais.

Viagens intra-municipais motivadas pelo deslocamento Residência-Trabalho

Gráfico  2

Fonte: Matriz de Viagens por Motivo Residência-Trabalho. Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Relatório 9 – Concepção das Matrizes. Governo do Estado do Rio de Janeiro, Secretaria Estadual de Transporte. Versão 1, Março de 2005.
Como pode ser observado no gráfico anterior, se mantém o desequilíbrio verificado anteriormente entre o local de moradia da PEA e seus locais de trabalho independentemente condição do posto de trabalho, formal ou informal. Aqui também se verifica para as APs 3 e 5 uma diferença muito acentuada entre o número de viagens realizadas por motivo de trabalho intra APs e as que tem como destino outras APs, o que indica que a maioria da PEA dessas áreas trabalha em outras APs.

O desequilíbrio entre oferta de trabalho e moradia

Como pode ser observado na tabela e gráficos  acima, existe na AP1 uma super-oferta de postos de trabalho e um sub-oferta de trabalhadores. Em todas as demais AP’s esta relação é negativa, havendo maior oferta de mão de obra do que postos formais de trabalho. Esta situação se mostra de forma mais aguda nas AP’s 3 e 5.

Sobre trabalho e mobilidade 

A tabela 7 é resultado da compilação de dados retirados da “Matriz de  deslocamentos por motivo de residência – trabalho” do POD do PDTU e reúne informações que permitem uma análise da dinâmica dos deslocamentos  de trabalhadores inter e intra APs no município.

Na coluna número 1 (exportação) temos, para cada uma das APs, a quantidade de trabalhadores que diariamente se deslocam das suas residência para trabalhar em  outras APs  do município.

Na coluna  2 (importação) temos  para cada AP o número de trabalhadores que são recebidos oriundos de outras APs do município.

Na coluna  3 (Saldo) temos a diferença entre entrada e saída de trabalhadores em cada um das APs. Com base nesses dados construímos o gráfico abaixo que ilustra o desequilíbrio observado entre as APs com elação à distribuição dos deslocamentos residência-trabalho no município.

Gráfico  3



O gráfico acima nos indica que nas áreas de planejamentos 2 e 4 existe um certo equilíbrio entre o número de trabalhadores que entra e sai diariamente das APs. Já nas APs 3 e 5 é flagrante o desequilíbrio, o que as caracteriza como grandes exportadoras de mão de obra para outras APs. A AP1 destaca-se como a grande importadora de mão de obra.

Deslocamentos intra APs.

Na coluna 4 podemos conferir o número de trabalhadores que se desloca diariamente por motivo residência-trabalho no interior de cada AP. Quando comparados com o total da População Econômicamente Ativa residente em cada AP estes dados nos fornecer excelentes informações sobre a dinâmica interna econômica de cada uma das APs.
No caso da AP1, o número de deslocamentos diários residência-trabalho chega a superar a PEA residente naquela AP (1,13)[3]. As APs 2 e 5, com índice superiores a 0,50, demonstram a sua dinâmica econômica; as APs  3 e 5, com 0,24 e 0,32  respectivamente, demonstram sua baixa dinâmica econômica relativa.

Mobilidade

A coluna 7 nos indica os índices de mobilidade dos moradores  de cada AP. Aqui podemos observar que os moradores das APs 2 e 4 e 1, respectivamente,  são os que possuem maior mobilidade geral (considerando aí todos os meios de transportes) com mais de 2 deslocamentos por pessoa dia, superior portanto à média do município que é de 1,86. Nas piores condições de mobilidade estão, respectivamente, os moradores das AP 3 e 5, com índices inferiores  à média do município.

Disponibilidade de meios de transporte coletivo (proxy).

As colunas 9, 10 e 11 reúnem os dados que nos permitem ter uma idéia (proxy) da disponibilidade de meios de transporte coletivos em cada uma das APs em relação à população residente. Conforme pode ser observado na coluna 11, a AP1 é a que oferece maior índice de mobilidade por transportes coletivos, seguida das AP2 e 4. As APs 3 e 5 são as que oferecem respectivamente as piores condições de mobilidade para sua população residente.
Conforme pode ser constatado pela comparação dos dados relativos à mobilidade e a disponibilidade de meios de transporte, embora necessária, a oferta de meios de transporte não é suficiente para garantir uma alta mobilidade da população residente, pois esta também é fortemente condicionada pela renda dos moradores, segundo informação da tabela a seguir.

Tabela 4
  


Fonte: Relatório 9-Concepção das Matrizes. Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Março de 2005.

Uma grande concentração de população de baixa renda em uma região que não oferece empregos e serviços adequados aos seus moradores torna-se, como visto, uma grande região dormitório, produzindo deslocamentos pendulares que mobilizam meios de transporte em apenas determinados horários (picos da manha e da tarde). Não oferecendo condições de sustentabilidade para as empresas de transporte que ali atuam, pois são regiões que, a despeito do número elevado de moradores, possuem baixos índices de mobilidade[4].
 Os caminhos lógicos.
Considerando o demonstrado, parece razoável imaginar dois caminhos lógicos a percorrer não apenas em termos de uma Plano Habitacional mas, genericamente, em termos de uma política de gestão do território municipal:

a) Fomentar a criação de empregos formais e sustentáveis prioritariamente nas AP3 e 5;
b) Priorizar o fomento habitacional de interesse social na AP1.

Um terceiro caminho seria o fomento habitacional também na AP3, tendo em vista ser esta AP uma das mais bem dotada de infra-estrutura e contar com a maior malha rodo-ferroviária do município, além de boa acessibilidade à AP1, a maior ofertadora de postos de trabalho formal. Esta ação, no entanto, deveria estar associada a investimentos na melhoria do sistema ferroviário existente, dando qualidade de metrô ao mesmo.

O caminho inverso da produção oficial (MCMV)

A despeito das condições aqui expostas, o que se verifica quando se analisam os dados relativos ao licenciamento e liberação de financiamentos dos empreendimentos do Programa Minha Casa Minha Vida é um caminho inverso ao aqui apontado, com a maioria dos empreendimentos financiados pelo Programa sendo localizados na Zona Oeste (AP 5) do Rio de Janeiro . Exatamente naquelas áreas que apresentam os piores indicadores de oferta infra-estrutura, serviços, mobilidade e disponibilidade de postos de trabalho.
A tabela 6 a seguir apresenta, para julho de 2011, o total de unidades habitacionais que dos empreendimentos a serem financiados com recurso do PMCMV, em fase de licenciamento pelos órgãos competentes da Prefeitura do Rio.

Tabela 5
Programa Minha Casa Minha Vida – UHs licenciadas até 07/07/2011



Fonte: Secretaria Municipal de Habitação – julho de 2011.

Como pode ser observado, do total de unidades licenciadas,  67,23 % se destinam à bairros da AP5, área de planejamento para onde se projetam também 80,31 % de todos os empreendimentos destinados à faixa de renda de 0 a 3 salários mínimos.

Distribuição do déficit e das U.Hs do PMCMV, totais e O a 3 por AP.

Gráfico  4



O gráfico 4 acima nos auxilia a visualizar a extrema concentração de UH do PMCMV projetas para a Área de Planejamento 5.

O mapa abaixo ilustra a distribuição dos empreendimentos MCMV por AP no município.



Fonte: Secretaria Municipal de Habitação 1

Sobre a necessidade de se rever as estratégias adotadas

O desequilíbrio que se observa na tabela 3 e gráficos 1 e 2, quanto a distribuição dos empregos em relação ao número de moradores em cada uma das AP’s, representa um conjunto enorme de problemas para a cidade, sendo o maior deles as deseconomias provocadas pelo excessivo tempo e recursos gastos nos deslocamentos residência- trabalho[5].

Esta situação deve ser enfrentada por meio de ações oriundas do poder público municipal que visem: i) o estabelecimento de uma situação de maior equilíbrio entre a oferta de moradia e postos de trabalho e, ii) no curto prazo, que se redirecione os recursos do PMCMV para a produção de habitação na Zona Central, região fortemente polarizadora de emprego, mas que nas últimas nove décadas vem perdendo população de modo acelerado, conforme pode ser observado na tabela 1.

Tabela 6
Fontes: 1920,1940,1950 – Maurício Abreu.  1970,1980,1991 e 2000, 2010 – IPP.


Como pode ser observado na tabela acima, existe na AP1 a possibilidade da ampliação do parque habitacional sem a necessidade, salvo melhor juízo, de grandes investimentos para a produção de novas infra-estruturas, já que a região perdeu nos últimos noventa anos cerca de 150 mil habitantes.

Espera-se que a oportunidade que se anuncia de discussão e elaboração do Plano Municipal de Habitação de Interesse Social – PMHIS pela Prefeitura do Rio  seja uma oportunidade efetiva de reavaliação das metas atuais, com a adoção de novas estratégias que favoreçam uma melhor e mais sustentável política de localização dos empreendimentos habitacionais de interesse social no território municipal, evitando-se a amplificação dos desequilíbrios e disfuncionalidades aqui detectados.


Deslocamentos intra APs

Tabela 7


Fonte: Relatório 9-Concepção das Matrizes. Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Março de 2005.

Coluna 1: número de trabalhadores que saem da AP por motivo de trabalho para outras APs do município.
Coluna 2: número de trabalhadores que ingressam na AP por motivo de trabalho oriundos de outras APs do município.
Coluna3: diferença entre o número de trabalhadores que saem e ingressam nas APs por motivo de trabalho.
Coluna4: número de deslocamentos intra APs por motivo de trabalho.
Coluna5: População Economicamente Ativa residente em cada AP.
Coluna6: relação entre o número de deslocamentos intra APs por motivo de trabalho e sua População Economicamente Ativa.
Coluna7: Índice Médio de Mobilidade dos moradores de cada AP.
Coluna8: População estimada para 2008 para cada uma das APs.
Coluna9: Densidade residencial para cada AP em m.² residenciais construídos por hectare. (Armazém de Dados, Indicadores Urbanos, tabela 9.1.1)
Coluna10: Número de viagens no modo coletivo geral gerados por viagens intra e inter municipais (RMRJ)
Coluna 11: Indice de oferta de meios de transporte coletivo por morador na AP (proxy).


Fontes e referências bibliográficas:

Abreu, Maurício de A. Evolução Urbana do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: IPLANRIO, 1997.
Armazém de Dados. Instituto Pereira Passos. Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.
Governo do Estado do Rio de Janeiro. Secretaria de Estado e Transporte. Plano Diretor de Transporte da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Relatório 9 – Concepções das Matrizes. Versão 1. Março de 2005.
Governo do Estado do Rio de Janeiro. Secretaria de Estado e Transporte. Plano Diretor de Transporte da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Resultado da Pesquisa Origem / Destino.
Instituto de Desenvolvimento e Informação em Transporte - ITRANS. Mobilidade e Pobreza: Região Metropolitana do Rio de Janeiro- Relatório Final. Abril de 2004.




[1] Habitação de Interesse Social
[3] Tal situação pode ser gerada pelo fato de alguns trabalhadores habitarem no Centro durante a semana, em hotéis ou moradias temporárias, mas não terem aí o seu domicílio permanente.
[4] Sobre este tema conhecer a recente crise dos transportes na AP5 que resultou na falência de empresas de ônibus na região.
[5] Sobre este tema ver: Mobilidade e Pobreza na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Instituto de Desenvolvimento e Informações em Transporte - Itrans. Novembro de 2003.


terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A braços com as peculiaridades da mercadoria terra urbana

 

A terra – como o ar, a água e o fogo – é um bem essencial à vida. Nem os Jetsons nem os guerreiros Jedi nem os caçadores de androides podem dela prescindir, mesmo passando boa parte de sua vida no ar ou no cosmo. 

Contudo, se o ar é (ainda) livre e a água e a energia (assim, assim) serviços públicos de acesso geral mediante pagamento de tarifas, a terra urbana dotada de serviços é um bem privado pleno, que se negocia no mercado como se fossem automóveis, ou alfinetes, a preços sujeitos às condições e flutuações da oferta e da demanda. 

Isto não seria um grande problema se o preço desse bem essencial fosse, ao final, acessível, senão a todos pelo menos à grande maioria; digamos, para imaginar, por uma tarifa que pagasse os custos públicos de urbanização e fosse inversa e garantidamente proporcional aos gastos com transporte; ou fazendo parte da cesta  básica. Sabemos, porém, que não é assim.

Uma boa maneira de nos aproximarmos do vasto e espinhoso tema do mercado e preços do solo urbano  - que para o urbanista, ufa!, tem sempre uma próxima oportunidade - é tatear as peculiaridades da terra como mercadoria. 

Embora negociada como mercadoria comum, a terra tem características que a distinguem radicalmente da maioria dos produtos industriais, geralmente não essenciais, substituíveis, móveis (cada vez mais), perecíveis (a curto ou longo prazo), destrutíveis (desaparecem no consumo) e, por definição, reprodutíveis pelo trabalho humano.

A terra, ao contrário, é um bem natural, essencial, insubstituível, inamovível, imperecível, indestrutível (no sentido de que não desaparece no consumo econômico), infinitamente divisível no plano jurídico, mas não reprodutível pelo trabalho humano.

A provisão de solo natural com serviços públicos e equipamentos de uso coletivo é condição essencial de seu uso para fins urbanos. O solo só atende às necessidades da demanda quando adequadamente urbanizado e bem localizado em relação à oferta de equipamentos e serviços públicos, serviços privados e amenidades naturais. 

Além de “matéria-prima” dos bens de uso comum do público (ruas, avenidas, praças públicas), o solo é o insumo sine qua non, insubstituível, da indústria da construção civil, constituindo um tipo de demanda que dizemos “derivada” da demanda "primária" por produtos imobiliários prontos para uso – residências, escritórios, lojas, fábricas etc.

A demanda de solo não deixa de ser derivada pelo fato de grandes grupos em situação precária o tomarem para se instalar e construir, por fora dos mecanismos do mercado formal e ao arrepio das normas urbanísticas, as suas próprias moradias; tampouco pelo fato de, em ambientes onde predomina a autoconstrução, o único mercado visível ser o da própria terra. Ao contrário, tais fenômenos só fazem destacar a natureza especial da mercadoria solo urbano, cujo preço não cessa de subir mesmo com todos os preços industriais declinantes – implicando que o contigente populacional com renda abaixo do “limiar de endividamento bancário” só possa ter acesso à moradia "de mercado" com amplos subsídios do governo, dos quais uma parte considerável se converte, como se pode deduzir, em subsídios aos proprietários de terrenos.

De forma análoga, a demanda de solo não deixa de ser derivada pelo fato de algumas poucas famílias e empresas comprarem grandes extensões de terra barata na periferia ou interstícios urbanos para fins de “engorda”. Também isso faz destacar a peculiaridade da mercadoria solo: sendo imperecível, ela pode permanecer décadas a fio num patrimônio ou carteira imobiliária, sem qualquer uso, à espera de que a exasperação da concorrência entre os demandantes – que não cessam de se multiplicar – permita que ela seja negociada na oportunidade da máxima valorização.

O solo natural não é escasso, ainda que pareça sê-lo quando nos deparamos, atônitos, com certos oceanos de pobreza urbana que transmitem a idéia de superpopulação planetária.


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Escasso é o solo adequadamente urbanizado e bem localizado; escassa é a mercadoria solo urbano, que se apresenta como uma coleção de parcelas dotadas de serviços básicos, mais ou menos adequadas aos usos que lhes pretendam dar seus demandantes em função de sua localização relativa ao estoque de bens e serviços já instalados no território

Para a vasta maioria dos habitantes das cidades, porém, não importa tanto o acesso ao solo em si mesmo (terra urbanizada) quanto a um produto pronto para uso na melhor localização que seu dinheiro possa comprar – procura cuja satisfação é o objeto da indústria da incorporação imobiliária. 

O solo é irreprodutível, mas o contrário vale para as construções, que, no entanto, só vicejam no solo fertilizado pela provisão de urbanização e  serviços públicos. Agregados no território urbanizado, as construções e seus distintos usos geram o fenômeno relacional e 100% social da localização, uma síndrome de vantagens que torna certos terrenos, grupos de terrenos e áreas urbanizadas da cidade mais procurados do que outros, aumentando o seu valor.

A vantagem de localização por excelência é a menor distância (ao local de trabalho, à escola, ao comércio, aos clientes e fornecedores etc.) medida em custo de transporte, tanto mais decisiva quanto mais modesto for o ganho do trabalhador e exígua a margem de lucro econômico da firma. A centralidade é o efeito generalizado do esforço permanente de todos os agentes econômicos para diminuir as distâncias. Mais precisamente, é a relação espacial que o custo da distância estabelece entre demandantes e ofertantes de produtos e serviços de uso ou consumo rotineiros, por força da concorrência das famílias e firmas pelas localizações reciprocamente mas vantajosas.

Os serviços urbanos, a construção em altura e o instituto jurídico da fração ideal de terreno se juntam para operar o moderno milagre da multiplicação dos pães: num pequeno pedaço de terra onde caberia um bem de uso para uma única família, ou empresa, a indústria da incorporação imobiliária pode não apenas levar ao mercado uma pilha de bens de uso similares, para 10, 20, 50 famílias, ou empresas, obtendo ganhos de escala, como vender a todas elas - o que pode ser sumamente lucrativo - a mesma vantagem de localização! “Venha para um endereço exclusivo”, “More pertinho de tudo”, “A segurança que sua família merece”, “Escritórios comunicados com o mundo” são alguns dos slogans preferidos para fazer aumentar, agora exponencialmente, o valor unitário da terra.

Com o indispensável apoio do instituto da fração ideal, o direito de propriedade do solo faculta ao titular de um terreno apurar, na venda de cada um dos novos bens de uso que nele vier a ser ancorado (mais comumente na forma de construção em altura) a parcela do valor extraído da competição entre os demandantes por aquela localização. 

Todo produto imobiliário é, pois, constituído de benfeitoria, que vale por suas qualidades intrínsecas, e terreno, ou fração ideal, que vale por suas qualidades extrínsecas - vale dizer, é um "produto-localização". A fração ideal, que ao contrário do terreno não tem nenhum valor de uso, desnuda a propriedade da terra urbana como puro direito exclusivo aos benefícios coletivamente construídos da urbanização e da localização. 

O valor econômico da terra privada é 100% criação coletiva, o que faz dela a candidata ideal a fonte de financiamento da urbanização e das infraestruturas por meio do IPTU, das contrapartidas ao direito de construir e das obrigações de urbanização – tema de alguma próxima postagem.

Mas se a divisibilidade jurídica do lote é infinita, não constituindo obstáculo à multiplicação dos produtos imobiliários nele ancorados, o mesmo não ocorre com o potencial de aproveitamento dos terrenos. Limitações técnicas, econômicas, culturais e biológicas exercem aqui o seu poder, o mesmo valendo para os padrões civilizacionais que se supõem refletidos na legislação edilícia, urbanística e ambiental. 

Além disso, a inamovibilidade e a longa durabilidade dos produtos imobiliários implicam que a construção de um edifício esgota a reprodutibilidade daquela localização específica, agora congelada em forma de estoque.

A tensão entre a não reprodutibilidade do solo, a limitada reprodutibilidade dos produtos-localização e a disputa dos demandantes pelas localizações mais vantajosas joga um papel decisivo na configuração física da cidade, na eficiência econômica de seus serviços básicos, na qualidade do meio ambiente e, finalmente, na geografia dos preços: tipicamente, os gradientes decrescentes de verticalização, adensamento e valor do solo a partir das localizações "centrais", quer sejam estas o centro econômico da cidade, subcentros ou quaisquer outros focos de interesse (praias, shoppings etc.).



Esse efeito está igualmente presente nas comunidades informais, onde a "liberdade urbanística" garante que as localizações mais acessíveis aos meios de transporte sejam as primeiras a se converter em comércios e se verticalizar.

A reprodutibilidade dos produtos-localização não nega a sua escassez constitutiva, meramente a “regula” na forma da distribuição espacial do adensamento: primeiro, porque é em si mesmo limitada; segundo, porque é prisioneira da radical irreprodutibilidade do solo; terceiro, porque é relativa à distribuição da capacidade de pagamento/endividamento dos diversos segmentos da demanda. 
 
A oferta de residências representada pelos impressionantes conjuntos de edifícios de apartamentos de Hong Kong pode ser, dependendo de sua localização, ínfima relativamente à demanda total. Copacabana constitui um imenso estoque de produtos imobiliários (a maioria semelhantes aos de muitos outros bairros menos “nobres” da cidade), praticamente inalterável por falta de terrenos e inacessível à imensa maioria dos habitantes do Rio de Janeiro: algumas dezenas de milhares de unidades localizadas à beira do oceano, a 5km do centro da cidade, será sempre uma oferta limitada numa metrópole de mais de 3 milhões de famílias. O mesmo vale para os escritórios de qualquer Avenida Central. O preço das localizações é a medida de sua crônica escassez relativa. 

Ao final, a ilimitada divisibilidade dos terrenos em frações ideais valorizadas pela urbanização e pela construção em altura é um milagre bastante - como se diz hoje em dia - assimétrico: satisfaz muito mais plenamente aos proprietários de terras - que são poucos e invocam-no para multiplicar as suas rendas - do que aos demandantes de valores de uso imobiliários - que são a imensa maioria e não podem morar, ou instalar seus negócios, onde querem, mas nos lugares urbanos que lhes “compete” segundo a sua capacidade de pagar aluguel ou endividar-se. 

A indestrutibilidade (salvo situações excepcionais) do solo também cumpre um importante papel em sua encarnação de mercadoria. O solo não desaparece no consumo econômico - seu “aproveitamento” -, apenas sai do mercado. Este fato, que pode não ser claro num dado momento e lugar, é muito importante na escala temporal das gerações. Como a cidade é um artefato multissecular em contínua construção, sempre haverá, em algum lugar, terrenos sujeitos a renovação edilícia. 

A derrubada das torres gêmeas de Nova York é um caso excepcional, mas sinistramente esclarecedor. Sepultados os mortos e retirado o entulho, o terreno reaparece, poucos anos depois de "consumido" numa imensa construção, como mercadoria nova, pronta para ser "reconsumida" em um novo empreendimento imobiliário de altíssima lucratividade.

Edifícios são duráveis, mas não são eternos. Se por um lado o aproveitamento do solo para um dado uso o retira do mercado e exclui todos os demais usos por uma longa temporada, a dinâmica urbana acaba, muitas vezes, por tornar rentável a demolição até de um bairro inteiro para o reaproveitamento da terra muito antes de encerrada a vida útil dos valores de uso que ela contém. Trata-se de um fenômeno cíclico, observável nas áreas mais valorizadas de qualquer média e grande cidade.

Em suma, o solo urbanizado e bem localizado é um bem irremediavelmente escasso, como também o são - em medida proporcional aos direitos de aproveitamento dos terrenos e ao tamanho da demanda - os produtos imobiliários (valor de uso + localização) que ele pode conter.



O significado essencial dessa conclusão é: aquele que detém a propriedade de um terreno, ou da fração ideal associada a um bem de uso sobre ele construído, está em condições de pôr esse terreno ou fração no mercado para ser arrematado pelo usuário (final ou intermediário-incorporador) que ofereça por ele a maior renda, na forma de preço de transação ou aluguel.
 
É por isso, leitor, que, quando você ouvir falar em desregulamentação do mercado imobiliário e flexibilização de normas urbanísticas para baixar o preço dos imóveis, desconfie! O mercado imobiliário é, em qualquer cenário, um grande leilão coletivo de bens escassos, um segmento da economia onde, a despeito do que possam dizer os incorporadores, a concorrência empresarial tem pouco ou nenhum efeito sobre o preço final do bem ao usuário ou comprador.

Tributo a Carlos Morales Schechinger
(Todos os conceitos e interpretações  aqui expostos são de inteira responsabilidade do autor do blog

2012-01-10

domingo, 1 de janeiro de 2012

Caio Martins, o escoteiro-padrão do Brasil, vai servir ao esporte ou só levar a tocha olímpica?

Faltam 4 anos e 6 meses para a Olimpíada do Rio de Janeiro.

Qual é o projeto dos próceres do esporte brasileiro para o Conjunto Desportivo Caio Martins?

Qual é o projeto dos próceres do esporte brasileiro para a formação esportiva dos escolares, secundaristas e universitários de Niterói? E para a cultura esportiva de seus trabalhadores, seus adultos e seus idosos?

Legado olímpico não é hotelaria nem transporte: é esporte! Para todos! 

2012-01-01