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Autor não identificado Fonte: https://www.facebook.com/groups/2142240399343434
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"A legislação que abre a possibilidade de concessão de um visto de residência aos estrangeiros que investirem uma determinada quantia no país virou nos últimos tempos um dos caminhos mais curtos para a imigração de brasileiros à Europa. (..)Bastante agressivo na aplicação dessa política, Portugal virou o destino óbvio de muitos brasileiros, pela proximidade cultural e o mesmo idioma (ou quase, vá lá…). Ocorre que o governo local deu um passo atrás nessa direção, descontinuando o chamado Golden Visa. Quase que imediatamente, muita gente disposta a pegar o primeiro avião para fugir do Brasil passou a avaliar outros destinos. (..) Do ponto de vista do aporte necessário para obter um Golden Visa, a Espanha está numa faixa intermediária, nem tão barata quanto a Grécia, nem tão cara quanto Malta.(..) Para se beneficiar do Golden Visa espanhol, que foi lançado em 2013 e se estende também aos familiares, é preciso fazer pelo menos 500 000 euros em investimentos imobiliários. Quem não quiser fazer esse aporte em tijolo ou terreno, tem a opção de transferir capital: 1 milhão de euros para Espanha ou investir esse mesmo valor em uma empresa local. (..)"
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Montagem: Àbeiradourbanismo |
(..) o desenvolvimento dos transportes coletivos por trens e bondes irá incorporar ao tecido urbano uma grande quantidade de terras, diminuindo fortemente o poder monopolista dos proprietários de cortiços, estalagens e casas-de-cômodos localizados na parte central da cidade. Num primeiro momento, porém, não há um deslocamento das camadas mais pobres para os subúrbios recém-urbanizados, em razão do elevado preço dos trens e bondes e da precariedade dos serviços. Para aquelas camadas sociais, o morar no centro é vital, pois seu sustento depende da “viração” diária e seu rendimento muito magro para cobrir os custos do deslocamento. (..) [QR p. 216]
Essa circunstância dará outro destino à maioria dos trabalhadores residentes nos cortiços e casas de cômodos das áreas centrais afetadas pelas grandes obras de modernização urbana da primeira década do século XX (Rua Mem de Sá, Avenidas Central e Rodrigues Alves):
A crise do sistema rentista de produção de moradias gera uma piora nas condições de vida das “classes pobres” da cidade. Deslocadas do centro, elas irão aumentar a densidade de ocupação das casas-de-cômodos nas zonas contíguas ao centro, especialmente na Gamboa, Sant’Anna, Santa Rita e São José. (..) [QR p. 217]
A proliferação de loteamentos suburbanos no Rio de Janeiro de Lima Barreto supunha, dentre outras coisas, a existência de uma camada social de adquirentes de imóveis com algum patrimônio e/ou capacidade de endividamento. Essa "demanda solvável" provinha dos estratos inferiores da nascente classe média, formados por pequenos comerciantes, barnabés, militares, artesãos e, em pequena medida, operários qualificados. [5] [6]
O surgimento de "camadas médias" na cidade também terá um importante papel na expansão da zona suburbana da Central do Brasil e da zona norte verificado nas últimas décadas do século XIX e nos primeiros anos deste século. [QR p. 230]
Ainda que extraordinariamente matizado, o ambiente em que se desenrola a trama de Clara dos Anjos é regido por personagens ciosos de suas conquistas materiais e expectativas de ascensão em uma sociedade até há pouco marcada pelo contraste primordial entre senhores (proprietários de terras, de casas de comércio e seus prepostos) e trabalhadores escravizados. O primeiro dentre esses personagens é o próprio Joaquim dos Anjos, pai de Clara:
"(..) Toda sua ambição se cifrou em obter um pequeno emprego público que lhe desse direito a aposentadoria e a montepio, para a família que ia fundar. Conseguira, ao fim de dois anos de trabalho, aquele de carteiro, havia bem quatro lustros, com o qual estava muito contente e satisfeito da vida, tanto mais que merecera sucessivas promoções. Casara meses depois de nomeado; e, tendo morrido sua mãe, em Diamantina, como filho único, herdara-lhe a casa e umas poucas terras em Inhaí, uma freguesia daquela cidade mineira. Vendeu a modesta herança e tratou de adquirir aquela casita nos subúrbios em que ainda morava e era dele. O seu preço fora módico, mas, mesmo assim, o dinheiro da herança não chegara, e pagou o resto em prestações." (..)" [LB p. 1035 ]
Assim também os pais de Cassi:
Ao melhorarem as suas condições financeiras, com uma promoção a propósito e a compra daquela casa, na estação do Rocha, com o produto de uma herança que tocara à mulher, Manuel de Azevedo veio encontrar, aos treze anos, o filho completamente viciado (..) [LB p.1062]
Propôs, dias depois, à sua esposa, que pusesse o rapazola a aprender um ofício, a fim de discipliná-lo. Dona Salustiana revoltou-se e esbravejou: — Meu filho aprender um ofício, ser operário! Qual! Ele é sobrinho de um doutor e neto de um homem que prestou muitos serviços ao país. [LB p. 1063]
O armazém em que Marramaque era empregado havia de tudo: ferragens, roupas feitas, isto é, camisas, calças, ceroulas grosseiras, para trabalhadores; armas, louças etc. etc. Comprava diretamente nos atacadistas da Corte; além disso, o seu proprietário era intermediário entre os pequenos lavradores e as grandes casas da Capital do Império, isto é, comprava as mercadorias àqueles, por conta destas, com o que ganhava comissão. [LB p. 1065]
Num dos subúrbios, na proximidade da casa de Cassi, veio a residir um casal. A mulher era moça, fruída de carnes, alta, louçã, grandes olhos negros, um tipo do Sul, ao que parece do Rio Grande. O marido, que era oficial de Marinha, maquinista, era amorenado, tirando a mulato, baixo, sempre triste, curvado e pensativo. (..) Tomavam comida fora e só tinham uma rapariguita preta, de uns dezesseis anos, para os serviços leves da casa. [LB p. 1071]
Não me parece razoável, portanto, qualificar-se o subúrbio de Lima Barreto como “lugar de segregação da classe proletária”,[7] atributo que no início do século XX pertencia, principalmente, aos cortiços, casas de cômodos e favelas do nascente centro metropolitano.
— Qual calúnia, qual nada! Este rapaz é um perverso, é sem-vergonha. Eu sei o nome das outras. Olhe: a Inês, aquela crioulinha que foi nossa copeira e criada por nós; a Luísa, que era empregada do doutor Camacho; a Santinha, que ajudava a mãe a costurar para fora e morava na rua Valentim; a Bernarda, que trabalhava no “Joie de Vivre”… [LB p. 1048]
Afastando-nos do eixo da zona suburbana, logo o aspecto das ruas muda. Não há mais gradis de ferros, nem casas com tendências: há o barracão, a choça e uma ou outra casa que tal. Tudo isto muito espaçado e separado; entretanto, encontram-se, por vezes, “correres” de pequenas casas, de duas janelas e porta ao centro, formando o que chamamos “avenida”.As ruas distantes da linha da Central vivem cheias de tabuleiros de grama e de capim, que são aproveitados pelas famílias para coradouro. De manhã até à noite, ficam povoadas de toda a espécie de pequenos animais domésticos: galinhas, patos, marrecos, cabritos, carneiros e porcos, sem esquecer os cães, que, com todos aqueles, fraternizam. [LB p. 1117]
Também significativa é a diferença social observada por Lima Barreto entre os bairros suburbanos de 1920 e a nascente periferia metropolitana:
Nessas horas, as estações se enchem, e os trens descem cheios. Mais cheios, porém, descem os que vêm do limite do Distrito com o estado do Rio. Esses são os expressos. (..)
Toda essa gente que vai morar para as bandas de Maxambomba e adjacências, só é levada a isso pela relativa modicidade do aluguel de casa. Aquela zona não lhes oferece outra vantagem. Tudo é tão caro como no subúrbio, propriamente. Não há água, ou, onde há, é ainda nos lugarejos do Distrito Federal, que o governo federal caridosamente supre em algumas bicas públicas; não há esgotos; não há médicos, não há farmácias. Ainda dentro do Rio de Janeiro, há algumas estradas construídas pela prefeitura, que se podem considerar como tal; mas, logo que se chega ao estado, tudo falta, nem nada há embrionário. [LB p. 1120]
O subúrbio é o refúgio dos infelizes. Os que perderam o emprego, as fortunas; os que faliram nos negócios, enfim, todos os que perderam a sua situação normal vão se aninhar lá; e todos os dias, bem cedo, lá descem à procura de amigos fiéis que os amparem, que lhes deem alguma coisa, para o sustento seu e dos filhos. [LB 1119-20]
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Assim como Clara dos Anjos começou a ser escrito em 1904, foi publicado como conto em 1920, transformado em romance em 1922, publicado postumamente em folhetim em 1923-24 e como livro em 1948, [10] também esta pesquisa, de correção em correção, de acréscimo em acréscimo, será um dia publicada neste blog sob o título "O Subúrbio de Lima Barreto", com uma análise bastante mais minuciosa de seus textos, enriquecida com maior quantidade de referências acadêmicas e acrescida de uma introdução, que julgo pertinente, sobre o uso de material literário como fonte de investigação urbanística.2023-10-11
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REFERÊNCIAS
BARRETO, Lima. Lima Barreto Completo I: Sátiras e Romances Completos. Edição do Kindle
MEDEIROS, Juliane P. C. e MEDEIROS, Ana Elisabete de A. “Os subúrbios cariocas no olhar de Lima Barreto”, Thésis, Rio de Janeiro, v. 7, n. 14, p. 160-173, dez. 2022.
https://thesis.anparq.org.br/revista.../article/view/303/314
QUEIROZ RIBEIRO L C, Dos Cortiços aos Condomínios Fechados - As formas de produção da moradia na cidade do Rio de Janeiro, p. 32. Observatório das Metrópoles, 2015
http://www.observatoriodasmetropoles.net/new/images/abook_file/dos_corticos_aos_condominios_fechados.pdf
NOTAS
[1] QUEIROZ RIBEIRO L C, Dos Cortiços aos Condomínios Fechados - As formas de produção da moradia na cidade do Rio de Janeiro, p. 32. Observatório das Metrópoles, 2015[4] "(..) os subúrbios cariocas são resultado da estratégia de afastamento da classe proletária do centro urbano." MEDEIROS & MEDEIROS p. 160 / Resumo.
[5] "A consideração dos operários qualificados como "camada média" justifica-se se atentarmos para o fato de que desde 1870 forma-se um grande contingente de "pobres" na cidade, pessoas que vivem de trabalhos temporários e intermitentes (..). QUEIROZ RIBEIRO p. 231.
[6] "(..) operários das Oficinas do Engenho de Dentro, nos quais se incluíam os cargos de operários, guardas, feitores, serventes e jornaleiros. Esses, correspondiam a quase totalidade dos empregados da oficinas, que submetidos a 4ª Divisão da companhia, somavam em 1907 cerca de 1.217 funcionários, ao passo que as categorias superiores de chefes, mestres e ajudantes de mestre somavam 22 empregados na mesma data". SERFATY E R C, Pelo trem dos subúrbios: disputas e solidariedades na ocupação do Engenho de Dentro (1870-1906). Dissertação de Mestrado, PUC Rio de Janeiro 2017, p. 75.
https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/32190/32190.PDF
[7] "Para Fernandes, o conceito carioca de subúrbio representa um “rapto ideológico”, pois a corrupção do significado da palavra é um recurso da ideologia capitalista para legitimar a segregação da classe proletária. Assim, o sistema capitalista reinterpreta a noção de subúrbio para atender a sua ideologia: (..)" MEDEIROS & MEDEIROS p. 165.
[8] VELOSO C & GIL G, Haiti. 1993
[9] BARRETO, Lima. Lima Barreto Completo I: Sátiras e Romances Completos. Edição do Kindle p. 1038.
[10] NASCIMENTO A S et al, “Clara dos Anjos, de Lima Barreto: o conto e o romance”. Encontros de Vista, Recife, 21 (1): 106-119, jan./jun. 2018
Constantine (Arabic: قسنطينة, romanized: Qusanṭīnah), also spelled Qacentina[4] or Kasantina, is the capital of Constantine Province in northeastern Algeria. During Roman times it was called Cirta and was renamed "Constantina" in honour of Emperor Constantine the Great. It was the capital of the French department of Constantine from 1848 until 1962. Located somewhat inland, Constantine is about 80 kilometres (50 miles) from the Mediterranean coast, on the banks of the Rhumel River.
Constantine is regarded as the capital of eastern Algeria and the commercial centre of its region and has a population of about 450,000 (938,475[5] with the agglomeration), making it the third largest city in the country after Algiers and Oran. There are several museums and historical sites located around the city. Constantine is often referred to as the "City of Bridges" because of the numerous picturesque bridges connecting the various hills, valleys, and ravines that the city is built on and around.
Constantine was named the Arab Capital of Culture in 2015.[6]
Este não é, propriamente, um texto clássico, mas me parece de algum interesse tanto para a história da ciência /disciplina /estudos da organização espacial urbana quanto para a reflexão sobre a abrangência técnico-científica do urbanismo contemporâneo.
No mesmo ano (1964) da publicação de sua obra paradigmática Location and Land Use, Willliam Alonso intervém no debate público sobre os planos de renovação (hoje diríamos gentrificação) de áreas centrais obsolescentes de Nova York alertando para os riscos da empreitada caso seus mentores se mantenham aferrados ao que chama de “teoria histórica” da ordem espacial urbana – baseada, segundo ele, nos “modelos” de Burgess (Círculos Concêntricos, 1925) e Hoyt (Setores de Círculo, 1937).
Em termos visivelmente diplomáticos, Alonso propõe que se leve também em conta os postulados da “teoria estrutural” da organização espacial urbana, vale dizer as leis do mercado de solo, àquela altura fortemente marcado pela preferência da ascendente classe média dos EUA pelas residências unifamiliares em amplos terrenos suburbanos.
Depois de observar a contradição entre a “convicção, própria dos planejadores, da necessidade de um plano geral” e o caráter espasmódico dos projetos de renovação urbana - “um atrás do outro sem qualquer visão de conjunto” -, Alonso afirma que a ausência da abordagem metropolitana impede que os defensores dos projetos de renovação urbana tenham uma visão clara da relação entre “os objetivos da comunidade e o entendimento de sua estrutura”.
Em linguagem mais direta, Alonso conclui dizendo que os projetos de renovação urbana das áreas centrais “só dizem respeito a um setor muito restrito e especializado do mercado” e “correm o risco de fracassar completamente devido à incompreensão do funcionamento do sistema urbano e a uma interpretação equivocada da estrutura da demanda.”
Desconheço - ainda - as consequências desse debate, mas creio que Alonso tinha razão quanto à factibilidade dos projetos de renovação urbana das áreas centrais na escala pretendida.
O mesmo não diria de sua concepção de “teoria histórica” e “teoria estrutural” da ordem espacial urbana - tema para alguma reflexão e, com certeza, um futuro comentário. E é por isso que concluo afirmando: mesmo não sendo um clássico, este artigo é notável pelo seu valor bibliográfico e epistemológico. Para estudiosos das estruturas espaciais urbanas e, particularmente, da urbanização nos Estados Unidos de meados do século XX, Alonso discutindo Burgess e Hoyt não é assunto de pouca monta.
"(..) El mismo día que Portugal se coronaba como mejor destino turístico de Europa, miles de portugueses salían a la calle para protestar contra los efectos perversos de ese éxito. La crisis de la vivienda en el país, que viene de lejos, se ha agudizado con las políticas públicas que han impulsado la expansión de pisos turísticos y la concesión de visados de oro a extranjeros por inversiones inmobiliarias. “Hola, ¿están disfrutando? Esto va con ustedes”, le decían en la tarde del sábado algunos manifestantes a los turistas que se asomaban a los balcones de Lisboa para ver la marcha.La protesta ha sido multitudinaria en Lisboa, pero también ha tenido réplicas en una veintena de ciudades, incluidas Oporto y Faro, donde la dificultad para acceder a viviendas dignas a un precio asequible es casi tan grave como en la capital. El impacto más extremo de la crisis podía verse en una de las avenidas por las que discurrió la marcha, con varias tiendas de campaña instaladas bajo soportales ocupadas por gente que no tiene techo. (..)"
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Montagem: Àbeiradourbanismo |
The interests at stake in decentralizing cities are sufficiently great to justify considerable effort to learn where, in a soundly-conceived economic plan, things "belong." The committee on the Regional Plan of New York decided to attack the problem in a realistic manner by making a series of studies of trends and tendencies in the location of the chief economic activities in the area.
Of two cities, otherwise alike, the better planned, from the economic point of view, is the one in which the costs of friction are less. This will mean that the aggregate site rents are less or that the transportation system is superior - or both. It may be suggested as an hypothesis that the layout of a metropolis - the assignment of activities to areas - tends to be determined by a principle which may be termed the minimizing of the costs of friction.
Assim, em condições de concorrência e com perfeito conhecimento, o mercado da terra urbana, ao que se supõe, opera de modo que o valor agregado dos aluguéis dos terrenos existentes e dos custos de transporte para a cidade com um todo, são mínimos.
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Kim Praise Magno Daniel/The Guardian |
Todo estudo que se debruce sobre uma cidade nova tem diante de si a oportunidade de observar alguns fenômenos em um contexto que evidencia de forma mais latente as contradições entre o projetado (desejado) e o realizado (materializado). Aqui, o objeto de análise é Palmas, capital do então recém-criado estado brasileiro do Tocantins, concebida por arquitetos e inaugurada no final do século 20 a toque de caixa em um movimento de ocupação da região norte do país.(..)Parte-se da hipótese de que o projeto de Palmas representa um interessante paradoxo, ao reforçar paradigmas da cidade modernista, embora no discurso do plano a negasse plenamente. Conforme descrito em seu memorial, buscava-se revogar atitudes radicais racionalizadoras, bem como setorizações e imposições contra a natureza. No entanto, o traçado, o arranjo das funções e as espacialidades construídas resultaram numa cidade de uma tediosa quadrícula cartesiana em que a falta de usos combinados, a monotonia da repetição, a negação da rua e da calçada e a total priorização do transporte motorizado individual terminaram por moldar o inverso do que se pretendia. (..)
2023-08-25“(..) hoje, ao invés de espaços de inclusão de pessoas de origens e culturas diversas, nossas cidades globalizadas estão expulsando as pessoas e a diversidade. Seus novos proprietários, muitas vezes habitantes de tempo parcial, são bastante internacionais - o que não significa que representam culturas e tradições diversas, mas sim a nova cultura global do sucesso. Eles são incrivelmente homogêneos, não importa quão diversos em termos de nacionalidade e idioma. Não são os cidadãos que nossas cidades grandes e diversificadas produziram historicamente. São, acima de tudo, cidadãos do “mundo corporativo” global.” (Sassen Saskia, “Who owns our cities - and why this urban takeover should concern us”. The Guardian online, 24-11-2015*)
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Montagem: Àbeiradourbanismo |
Muitos, nos dias de hoje, enquadrariam o objeto dessa matéria na categoria ‘financeirização da moradia’. Eu me pergunto se é o caso.
A moradia – assim entendo - é financeirizada desde que passou a ser produzida para o mercado, pela simples razão que são poucos os que podem comprá-la sem financiamento parcial de seu preço. Tradicionalmente, os contratos de hipoteca preveem que o próprio imóvel é a garantia do empréstimo para a sua aquisição.
A propósito vale recordar um instrutivo texto, do ano 1981, em que o economista Martim Smolka descreve a operação de compra-venda de um imóvel como transferência ao adquirente, por parte da imobiliária, a um dado preço, do ‘direito de especular’ no mercado de imóveis [1] - que traduzo como o direito de vender ou alugar por uma renda maior do que a sua dívida.
A financeirização da moradia deu um salto de qualidade quando, com a desregulamentação de fins do século passado, generalizou-se nos EUA e Inglaterra a prática dos empréstimos bancários garantidos pelo valor da residência para a compra de bens de consumo, viagens, universidade etc. Famílias com rendimentos estagnados, e até decrescentes, passaram a consumir… o valor futuro de suas casas! [2] [3]
Uma vez re-hipotecado o imóvel em troca de liquidez a curto prazo, o título da dívida podia ser vendido pelo banco para credores de que o devedor nunca ouvira falar, nos mais diversos países – a pirâmide financeira que desmoronou em 2007, levando milhões de pequenos investidores, boa parte deles trabalhadores cooptados para a mítica “república dos pequenos proprietários’, à perda de seu capital, isto é, de suas próprias moradias que, afinal, eram o lastro de tudo!
Aqui o que ocorre é algo diferente: a concentração da propriedade imobiliária nas mãos de um pequeno número de firmas de capital de investimento em alugueis. O senhorio deixa de ser o dono da padaria e passa a ser, digamos, George Soros. Este fenômeno parece ter-se acelerado na última década com a recessão e a baixa generalizada das taxas de juros, na Europa e EUA, subsequentes à debacle de 2007. Em tempos de investimentos produtivos de rentabilidade duvidosa, o aluguel residencial em grande escala pode ser um ótimo negócio. [4]
Poder-se-ia argumentar, é certo, que George Soros é, ele próprio, um financista. Mas isto significa que, sob o ângulo do capital proprietário, a ‘financeirização’ não é privilégio exclusivo da moradia, tampouco do parque imobiliário como um todo: é a forma ‘pura’ do capital que controla todas as grandes cadeias de negócios na economia planetária - indústria, comércio e serviços.
“Desfinanceirizar a moradia” é uma causa que tem o meu apreço; mas seria interessante, nesse caso, que começássemos a discutir do que exatamente estamos falando e, é claro, como fazê-lo.
2023-08-16
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[1] “(..) al comercializar um inmueble, la inmobiliaria no sólo vende um activo
fijo, sino que, además, negocia el derecho que capacita al muevo propietario a
especular (..)” [SMOLKA M, “Precio de la tierra y valorización inmobiliaria
urbana: esbozo para una conceptualización del problema”. Revista
Interamericana de Planificación Vol XV, No 60, Dez 1981, p. 78
[2] A
indústria do refinanciamento hipotecário foi uma forma de os estadunidenses
"tomarem emprestado e consumir como se os seus rendimentos estivessem
crescendo". STIGLITZ J, O Mundo em Queda Livre – Os Estados
Unidos, o mercado livre e o naufrágio da economia mundial. Trad. José
Viegas Filho. São Paulo: Companhia das Letras, 2010. Cap. 1: A formação da
crise
[3] “(..) no Reino Unido e nos EUA, os empréstimos pessoais garantidos pelas residências (EGR) produziram um aumento do consumo: quanto maior o valor da garantia, maior o nível de consumo. (..) Desde a desregulamentação do crédito na década de 1970, a EGR contribuiu de forma importante para a demanda do consumidor no Reino Unido, ainda que somente nos períodos de alta dos preços da moradia (..) A década anterior à crise financeira registrou níveis sem precedentes de EGR, com proprietários valendo-se do aumento dos preços das residências para tomar mais empréstimos e consumir mais. O sociólogo Colin Crouch (2009) descreveu o fenômeno como uma espécie de 'keynesianismo privatizado': ao passo que no período 1950-70 a demanda foi sustentada pelo Estado pela via da expansão fiscal, no período 1980-2007, de declínio dos salários médios, ela foi alimentada pela dívida hipotecária”. RYAN-COLLINS, LLOYD e MACFARLANE, Rethinking the Economics of Land and Housing. Zed Books 2017, edição do Kindle, p. 146.
[4] “(..) Residential demand shifts mainly with demography and is less
buffeted by the business cycle. People will still need somewhere to sleep, says
Lawrence Bowles of Savills, a property firm: “You can’t digitalise a bed.” And
in an era of low interest rates, steady rental income becomes more attractive.
(..)” THE ECONOMIST 28-08-2021 “Big British companies are
entering the rental market”
https://www.economist.com/britain/2021/08/28/big-british-companies-are-entering-the-rental-market
Grammichele (Sicilian: Grammicheli,
Greek: Echetle (meaning "plowshare"); Latin: Echetla, Ochula;
Medieval: Occhiolà) is a town and comune in
the Metropolitan City of Catania in Sicily,
southern Italy.
It is located at the feet of the Hyblaean Mountains, some 13 kilometres
(8 mi) from Caltagirone.
The town was built in 1693, after the old
town of Occhiolà, located to the north of the modern Grammichele, was destroyed
by an earthquake. Occhiolà, on account of the
similarity of name, is generally identified with Echetla, a
frontier city between Syracusan and Carthaginian territory
in the time of Hiero II, which appears to have been
originally a Sicel city
in which Greek civilization prevailed from the 5th
century onwards.[3]
The devastation of the old town was so
severe that the feudal landlord of the town, Carlo Maria Carafa Branciforte,
Prince of Butari, commissioned construction of a new town, with plans aided by
Michele da Ferla. Supposedly the Prince himself sketched out the initial
hexagonal layout. In the center of the hexagon is the Piazza Carlo Maria
Carafa, faced by the Chiesa Madre (Mother Church), San Michele Arcangelo, and the
Palazzo Communale (City Hall). The town of Avola, destroyed by
the same earthquake, was also relocated and rebuilt along a hexagonal layout.
O maior feito do urbanismo dos anos 1990/2000 foi desconstruir o suporte material da expansão urbana dos 50 anos anteriores - para revalorizar as áreas centrais!
Pois não se passaram nem 25 e já tememos que as novas áreas centrais estejam entrando em um novo ciclo de declínio causado pela mudança dos paradigmas da economia urbana.
A exemplo de Nova York, poderemos ver imobiliárias de Boston, que gastou 22 bilhões de dólares (atualizados) para construir o Big Dig e revitalizar o Centro, sugerindo subsídios públicos para converter endereços comerciais em edifícios residenciais.
Talvez nem precisemos ir tão longe: o Rio de Janeiro já está subsidiando a construção e o retrofit habitacionais no Centro da cidade em troca de m2 de construção adicional na Zona Sul - um método mais de acordo com as nossas tradições.
As grandes metrópoles, asseguram-nos as agências internacionais de desenvolvimento, respondem pela criação da imensa maior parte da riqueza planetária. O problema é que essa riqueza, que se concentra a níveis nunca vistos, cresce junto com deseconomias megalopolitanas nunca contabilizadas, mas invariavelmente alocadas na rubrica dos custos públicos.
Mais do que um novo paradigma, precisamos é de mudar de fase.
2023-08-09